Um dia desses nosso Presidente foi indagado por um
repórter acerca do seu bom humor, ao que lhe respondeu: “É claro, depois do
Brasil ter ganho por 4 a 0, ou melhor, 5 a 0, você quer o quê?”.
Coloquei-me então a pensar a causa do nosso bom ou mau
humor, quando então que me lembrei do drama vivido por meu amigo Inácio.
Numa sexta-feira ensolarada, o Inácio acordou com
aquele insuportável bom humor. Lembrou-se de que sairia em viagem à tarde, o
que fez aumentar ainda mais sua euforia. Porém, no elevador, deu de cara com a
síndica, com quem havia travado séria desavença na última reunião do
condomínio. Na garagem, o vizinho o fez esperar por não mais que trinta minutos
até descer as compras. Afobado, agora no trânsito, teve de ouvir um desaforo de
uma senhora: “Tá com pressa, saísse antes.”
Parece que o humor do Inácio resistiu a isso tudo. Afinal
de contas, era sexta-feira, e a viagem compensaria tudo. Ao chegar ao
escritório, no entanto, o colega de trabalho estava tão carrancudo que, se
medisse, daria uns quarenta centímetros entre a testa e o queixo enrijecido
para baixo. “Tudo bem, é sexta-feira”. Mas, quando chegou a secretária
inundando o ambiente com aquele perfume horroroso, aí ele não resistiu: “Droga,
quem foi que deu à Síndica, àquela louca do trânsito e aos colegas de trabalho
o direito de estragar meu dia, meu fim de semana e ..., droga! Meu bom
humor...?
O Inácio resolveu comentar isso com um velho e bom
amigo seu, a quem costuma confidenciar seus maiores problemas, sonhos e
frustrações. Após ouvir-lhe atentamente, com aquele seu ar sereno e sábio, indagou-lhe
o amigo: “Inácio, o que você está fazendo neste mundo?”. E, antes que o Inácio
pudesse esboçar a resposta, laçou-lhe outra pergunta ainda mais desconcertante:
“Qual é o sentido que os acontecimentos têm na sua vida?”
Na verdade, essas dúvidas já se lhe haviam
apresentado anteriormente, mas Inácio sempre as abafava quando as coisas não
corriam segundo seu agrado: “Logo chegará o final de semana” ou “está próxima
aquela viagem”. Agora, entretanto, o amigo não lhe deu escapatória, colocou-o
de frente com o problema.
“Sabe, Inácio”, continuou o amigo com toda a
serenidade do mundo, “há essencialmente duas formas de passarmos nessa vida,
servindo a nós próprios ou aos demais. Podemos trabalhar para ter dinheiro
suficiente para a viagem, ou trabalhar pensando no bem das pessoas que dependem
do nosso trabalho, ainda que com isso busquemos também o dinheiro que é
essencial para sustentarmos a família. Podemos ansiar por chegar em casa ao final
do dia para derramarmo-nos na poltrona, ou voltarmos preparados para um novo
turno de trabalho, de serviço alegre e abnegado à esposa e aos filhos. Aliás,
quer uma receita para ficar mal humorado?” – prosseguiu o conselheiro agora
mudando o tom da voz, “fique quinze minutos em seu quarto pensando apenas em
si: os meus problemas, as minhas coisas, os meus desejos, eu, eu, eu...”
E depois concluiu: “o bom humor verdadeiro brota de
dentro para fora. Não depende da vitória do Brasil, das condições do tempo, da
cara dos colegas de trabalho, da nota do filho na escola, de nada disso. Até
porque, duas pessoas podem observar um mesmo copo com água até a metade, ao que
o pessimista dirá que está quase vazio e o otimista, quase cheio. Em suma, o
nosso bom humor, constante, sereno, sem euforia, mas duradouro, depende de uma
convicção interior de esquecimento de si próprio e de serviço aos demais. As
condições externas são fogo de palha, que não duram mais que um instante.”
O Inácio saiu de lá com aquela sensação de leveza de
espírito de quem ouviu algo que lhe tocou a alma, e repetia: “fogo de palha”.
Mas concluiu, com certo ar de teimosia...: “tá tudo certo, mas a classificação
do Guarani não seria tão fogo de palha assim, duraria pelo menos 2006 inteiro!”
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