quarta-feira, 6 de setembro de 2006

Política e religião

Aproximam-se as eleições e, com ela, a caça aos votos dos eleitores. Muito se tem falado em ética na política, e isso é de fato um dos maiores anseios de nossa sociedade. Por outro lado, são freqüentes na mídia as alusões do tipo “a bancada evangélica do congresso” ou “os deputados católicos dizem isso ou aquilo”, ou seja, fala-se da religião dos políticos como se suas convicções religiosas fossem um meio de eles galgarem ao poder e, ao mesmo tempo, como se suas respectivas igrejas também estivessem interessadas apenas em aumentar a sua influência na política nacional.
Não pretendo embrenhar-me em constatar se isso é mesmo assim ou não. Ou seja, se os políticos que muito ressaltam suas convicções religiosas o fazem com uma intenção deturpada de angariar votos ou não, nem mesmo se as respectivas igrejas buscam vantagens com a eleição de seus membros, até porque isso implicaria em uma análise geral, distanciada de cada situação concreta, onde essas intenções pouco retas podem faltar ou não. Mas a questão que se coloca é qual é o limite ético disso? Ou melhor, até que ponto se podem mesclar religião e política sem que, cada qual não invada terreno que não lhe é próprio?
A religião, em especial o cristianismo, sejam católicos ou evangélicos, cuja fé representa a grande maioria dos eleitores nacional, tem como finalidade aproximar o homem de Deus. Em suma, anuncia a pessoa de Jesus Cristo, pregando-O como modelo a ser seguido, e que, seguindo-O, encontrem a felicidade já nesta vida e na outra que se acredita que há de vir.
Há de se notar, portanto, que os fins buscados pela religião não é puramente temporal, vale dizer, não está voltado exclusivamente para este mundo. Ao mesmo tempo, está eminentemente voltada para o interior do homem, pois é nele que se trava a sua relação com Deus. É bem verdade que a religião, nessa busca de aproximar o homem de Deus e, com isso, proporcionar-lhe a felicidade, apresenta preceitos a serem seguidas por seus membros.
Tomemos de novo como exemplo os cristãos. Para esses, os dez mandamentos são normas a serem seguidas nesse propósito que sua religião lhes apresenta. E isso irá influir em todos os aspectos da vida da pessoa, que procurará ser coerente com isso. Assim, ao votar uma lei no parlamento, ao escolher um candidato, ao tomar uma deliberação em uma assembléia de condôminos, o cristão age inexoravelmente influenciado por suas convicções religiosas. Até porque a fé não é algo que se pode dependurar no saguão de entrada, como antigamente se dependuravam os chapéus. Ou seja, ela influi em todo o agir do crente.
Mas a igreja a que ele pertence, porém, não pode jamais, sob pena de se desvirtuar de sua função, ter vínculo com partidos, selar conchavos com grupos políticos, nem muito menos impor aos seus fiéis votar nesse ou naquele candidato. E isso porque não é função dela imiscuir-se em questões temporais. A sua função é voltada exclusivamente ao interior de seus membros, vale reiterar, em mostrar-lhes o caminho que se acredita proporcionar-lhe um encontro com Deus. E nas questões de política, cada um de seus membros decide com a total liberdade em quem votar, ainda que, subjetivamente, procure candidatos que não tenham convicções contrárias às suas, mas sem qualquer coação, seja de que tipo for, por parte do líder da instituição religiosa a que aderiu.
Tão radicalmente penso ser assim, que ouso confessar que sou católico, mas se um sacerdote, um bispo de minha diocese, ou ainda que fosse o Papa, pedisse para que votasse algum candidato, ouso dizer que lhe responderia um rotundo NÃO. Votarei em quem a minha libérrima convicção me disser que devo fazê-lo. É que se quaisquer desses líderes fizessem tal sugestão estariam abusando do poder que possuem, que é exclusivamente de ser guias de almas. Aliás, são claríssimas as palavras de Cristo a Pilatos antes de ser condenado à morte: “o meu reino não é deste muito”. E ainda em outra passagem, vendo que os seus discípulos queriam conduzi-lo para fazê-lo rei, fugiu para outro local.

Por fim, também abusa da sua condição de membro de uma igreja o candidato que se apresenta como tal, seja em uma paróquia, seja em uma assembléia de evangélicos, apenas para angariar votos daqueles que professam a mesma fé. É que têm os fiéis em comum a fé, vale dizer, acreditam que devam seguir os mesmos caminhos para esse almejado encontro com Deus. Em tudo o mais, cada um pensa como quer, vive como quer e, em especial, vota como quer, com toda a liberdade que o próprio Criador lhes concedeu.

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