segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

A esperança do Natal

Há poucos dias, li um triste comentário de um leitor acerca da situação da juventude atual. Dizia ele que há uma "doença" entre os jovens: a baixa auto-estima. Ela tem destruído suas vidas, os transformado em viciados, rebeldes, sem perspectiva de vida.
O que será que faz com que as vidas das pessoas perca o sabor? Amanhã é Natal. É tempo de festa, de confraternização, de alegria. Curiosamente, porém, é tempo também em que nos questionamos mais profundamente. Pensamos nos rumos que temos dado às nossas vidas. E, não raras vezes, sem o sabermos, procuramos explicações mais consistentes acerca de nós mesmos: De onde vim? Para onde vou? O que devo e o que não devo fazer?
Estamos de passagem neste mundo. Portanto, um ingrediente imprescindível nesta caminhada é a esperança.
Para entendermos a importância de termos esperança, podemos comparar nossa trajetória nesta vida como uma viagem que fazemos. Tomemos como exemplo dois passageiros que ocupam poltronas vizinhas em um avião. Ambos vão para um lugar que não conhecem, que nunca pisaram antes. O primeiro, muito otimista, sabe dar asas à imaginação. Enquanto viaja, pensa em como será o aeroporto do destino, imagina os lugares aprazíveis que o espera naquela cidade, pensa no passeio que poderá fazer ao pôr-do-sol. O outro, extremamente pessimista, pensa que sua vida se limita à viagem, e tenta distrair o pensamento, pois pensa que, ao final, a aeronave irá se chocar contra um rochedo, quando então tudo acabará tragicamente.
A viagem de ambos os passageiros é a mesma. Ambos terão os mesmos incômodos do assento, os mesmos cansaços, as mesmas dificuldades de dormir etc. Porém, aquele que pensa nas delícias do destino, ainda que desconhecido, viaja alegre, sereno, pois sabe que a aventura vale a pena. O outro, ao contrário, cuidará apenas de escolher o melhor prato a ser servido, pois afinal, em breve não poderá mais se deliciar com comidas. Não perderá tempo em escutar os problemas dos outros, afinal, os momentos existem, pensa ele, para serem curtidos para si. Ele se irritará facilmente com qualquer incômodo, pois a viagem é curta e, se ao final tudo acabará, então não tem tempo a perder com os problemas dos outros. Ambos, portanto, estão na mesma viagem, mas o primeiro segue muito melhor que o segundo. E o motivo é muito simples. É que o primeiro tem esperança.
Com palavras simples e profundas, é isso, dentre muitas outras verdades, o que o Papa Bento XVI expõe em sua última encíclica, Salvos pela Esperança. Partindo da carta de São Paulo aos Tessalonicenses, o Santo Padre aponta “(...) como elemento distintivo dos cristãos o facto de estes terem um futuro: não é que conheçam em detalhe o que os espera, mas sabem em termos gerais que a sua vida não acaba no vazio. Somente quando o futuro é certo como realidade positiva, é que se torna vivível também o presente”. E em seguida conclui que “o Evangelho não é apenas uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera fatos e muda a vida. A porta tenebrosa do tempo, do futuro, foi aberta de par em par. Quem tem esperança, vive diversamente; foi-lhe dada uma vida nova”.
Mas os mais céticos e incrédulos, para não dizer desesperançados, poderiam ainda questionar: que garantia temos de que a viagem não termina de fato num choque contra um rochedo, ou, como preferir, num tenebroso vazio?
A garantia que temos é o nascimento do Menino, que amanhã celebramos. O Seu nascimento fez com que os Magos viajassem muitos dias em busca da estrela que O apontava. Por certo a viagem foi penosa, mas eles a percorreram com alegria, afinal, buscavam ver a causa de sua alegria. Esse Menino sempre trouxe alegria. Já desde o ventre de Sua Mãe fez João Batista saltar de júbilo nas entranhas de Isabel. Já adulto, quando Ele já se despedia dos seus que ficariam neste mundo, disse-lhes com todas as letras: “Eu hei-de ver-vos de novo; e o vosso coração alegrar-se-á e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria”.

Um feliz Natal a todos! Que seja esse o Natal da verdadeira esperança. E, com ela, que tenham também a alegria. A alegria perene que se edifica nos corações daqueles que sabem que são filhos de Deus.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

O “não” na educação

Quando e como se deve dizer “não” aos filhos? Trata-se de uma dúvida freqüente nos pais que se ocupam de verdade da educação de seus filhos.
Penso que não há uma regra geral, nem é possível traçar uma espécie de manual que possa ser lido pelos pais e nele encontrar a reposta para cada situação concreta. Apesar disso, há alguns parâmetros que podem ser úteis nessa árdua tarefa de educar.
Com relação às crianças bem pequenas, até aproximadamente os dois anos, dizer “não” é quase que inútil. É que, nessa fase, elas não conseguem se comportar da forma esperada. Por exemplo, a criança de um ano e pouco está trocadinha e com calçado novo para um passeio e, enquanto caminha, avista uma “deliciosa” poça d’água. Não há dúvida de que escolherá pisar na lama. Não adianta dizer “não pise aí!”, ou “filha, você está com sandálias novinhas”. No caso, a solução é, com muito carinho e afago, pegá-la no colo, distraindo-a com outras coisas.
Mas chega a idade em que impor limites é essencial, e então se terá de dizer mesmo que não se faça o que não convém. O segredo aqui será então dizer poucos “não”, mas sustentá-los até o fim, ainda que caia o mundo. Alguns pais têm certa tendência de dizer não a cada pedido do filho ou da filha, mas depois voltar atrás e consentir. Na verdade deveria ser o contrário. Deveriam ponderar antes de responder, negando o pedido somente quando objetivamente o que se pretende não é bom para a criança. Mas quando disserem um “não”, há de sustentá-lo, custe o que custar.
Imaginemos uma situação em que o filho faz um pedido e o pai (ou a mãe) o nega prontamente. Porém, após a décima quarta tentativa, o filho consegue o que queria. Nesse caso, a mensagem que se transmitiu ao filho é mais ou menos essa: insista, que vale a pena, pois ao final eu deixarei. Da próxima vez, o filho insistirá por quinze ou dezesseis vezes, pois sabe que ao final consegue. Pior ainda, esses pais transmitem a idéia de que não estão seguros acerca do que é e o que não é bom ao filho. Afinal, se o que pedia não era bom, por que consentiram após insistir quatorze vezes?
Nossos filhos têm direito a que lhes digamos o motivo por que se nega algum pedido. Afinal, boas razões, ditas com convicção, convencem, ainda que eles não admitam num primeiro momento. Penso que não deveríamos nunca dizer “não porque não”. A melhor forma de negar um pedido é expor por que o que o filho quer não é bom para ele. É que por vezes negamos algo porque nos incomoda, porque nos requer esforço, porque temos preguiça. E nesse caso é difícil mesmo, para não dizer impossível, explicar.
Mas há situações em que os reais motivos não podem ser ditos. Por exemplo, quando um filho adolescente quer ir a uma festa, e os pais têm fundada suspeita de que estarão presentes alguns colegas com comportamentos inadequados (drogas etc.). Não seria o caso de dizer isso ao filho, ou à filha, pois se corre o risco de cometer uma injustiça. No entanto, se a dúvida é razoável, seria temerário expor o filho ou a filha àquela situação. Nesse caso, há de se dizer que não vai à festa porque o pai e a mãe estão convencidos de que não é bom para o filho, e ponto final. Se isso for dito por amor e com convicção, amparados por bons exemplos dos pais, os filhos aceitarão, ainda que protestem num primeiro momento.
Soube do caso de uma adolescente que por vezes dizia às amigas que não iria a determinados lugares (festa, boate etc.) porque os pais não permitiam. Porém, isso não era verdade, pois os pais não a proibiam de fazer absolutamente nada. Em uma entrevista com um psicólogo, ele indagou à jovem o motivo da mentira. Ela não teve dúvida quanto à resposta: “é que os pais de minhas amigas frequentemente não permitem elas irem a certos lugares. Se eu disser que meus pais não me proíbem nunca, elas pensarão que meus pais não me amam, que não se importam comigo”.

Penso que essa jovem tem toda a razão: o “não”, se dito da forma adequada e no momento certo, é uma das maiores provas de amor.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Conciliar é o melhor caminho

Inicia-se hoje a Semana Nacional da Conciliação. Trata-se de uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça que visa conscientizar as pessoas de que a conciliação é o melhor caminho para a construção de uma convivência mais pacífica. De 3 a 8 de dezembro serão realizadas várias audiências de conciliação em diversas cidades do Estado e do País. O evento faz parte do projeto “Conciliar é legal”, que neste ano conta com o lema “Conciliar é o melhor caminho”.
Há alguns anos exercendo a função de juiz, posso atestar que, quando profiro uma sentença em audiência, o ambiente fica carregado. O vencido sai inconformado e revoltado. Curiosamente, sequer o vencedor sai muito aliviado, por vezes com ar de triunfo, mas no fundo insatisfeito, também pelo tempo que tem de aguardar para que seu direito seja efetivamente assegurado na execução da sentença. Ao contrário, quando as partes chegam a um acordo, o ambiente fica leve e sereno, as pessoas saem felizes, como se tivessem tirado um grande peso das costas. Não raras vezes, cumprimentam-se e reatam amizade que há tempos havia se perdido.
Não há dúvidas de que a conciliação é, de longe, a melhor forma de se resolver os litígios. Mas penso que poderíamos investigar um pouco mais a fundo sobre as causas dos conflitos, e assim entendermos por que às vezes é tão difícil a solução amigável.
A justiça, antes de ser um fenômeno social ou jurídico, é uma virtude, que pode ser definida como a disposição firme e constante de dar a cada um o que lhe é devido. Deve estar ela, portanto, no interior de cada ser humano. Nesse sentido, somente há justiça em uma sociedade se as pessoas que a compõem forem interiormente justas, vale dizer, que ajam de forma a respeitar os direitos dos demais.
Por exemplo, é justo o devedor que paga suas dívidas pontualmente, que não contrai obrigação que não sabe se terá como pagar. É justo o empregador que paga salários dignos, o empregado que trabalha com esmero, a mãe de família que é zelosa com os filhos e solícita ao esposo, o pai que se ocupa seriamente com a educação dos filhos, o esposo que é solícito à esposa. Quando se descumprem essas obrigações, surgem insatisfações com quem descumpriu tais direitos: credor, esposo, esposa, filho, empregador, trabalhador etc. Essas insatisfações podem dar ensejo a um processo judicial ou não, mas são sempre ruins, pois abalam as relações sociais e, pior ainda, fazem um grande mal a quem tem tais direitos lesados e ao próprio descumpridor desses direitos, que, em última análise, não encontrará jamais dentro de si a paz tão almejada por qualquer ser humano.
Uma vez lesado esse direito, os conflitos podem ser solucionados, basicamente, de três formas: pela lei do mais forte, fazendo-se justiça pelas próprias mãos; por meio de um terceiro, atualmente o Poder Judiciário; ou pela composição entre as próprias partes. De todas elas a melhor é a composição. É que as outras agem externamente, por exemplo, alguém devia certa quantia e não pagou, por ordem do juiz o oficial de justiça toma um bem seu, vende-se esse bem num leilão e, com isso, paga-se o credor. Nesse caso, interiormente, a virtude da justiça continuou sendo desrespeitada, embora, externamente e com base na força, tenha sido realizada, mas o mal social e pessoal subsistem.
Quando as pessoas sabem ceder, colocar-se na situação do outro, renunciar parte do que acreditam ter direito, se isso for possível, esforçando para se entenderem com o adversário, ao contrário, a paz interior e exterior se restabelece. Mais ainda, há litígios em que não há solução possível que não a feita pelas próprias partes. Por exemplo: Como dar uma sentença que imponha ao pai a obrigação de ser dedicado aos filhos? Como impor ao filho o respeito pelos pais?

Ocorreu-me recentemente que um conciliador, muito competente, iniciou uma audiência em que as partes estavam com tal animosidade que já no corredor quase se atracaram. Mas, com toda a paciência, lembrou-se ele de uma passagem do Santo Evangelho que diz: “quando estiverdes a caminho com teu inimigo, procura conciliar-se com ele”. Após algum tempo, notava-se no rosto daqueles que outrora foram litigantes a paz de espírito que dinheiro nenhum consegue comprar.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Novos modelos de família

Está em tramitação no Congresso Nacional o projeto de lei nº 2.285/07, que propõe a reforma no sistema jurídico brasileiro sobre a família. Antes de comentarmos o projeto em si, o que poderemos fazer em outra oportunidade, penso devemos repensar sobre o que é família. Para que serve a família? O que leva uma pessoa a constituir uma família?
A família é o melhor lugar para se viver e para se morrer. Nela reina (ou deveria reinar) um ambiente de afeto e de acolhida, no qual cada um é aceito e amado por ser quem é (pai, mãe, filho, irmão etc.), independentemente de seus atributos pessoais.
O que leva duas pessoas a unirem suas vidas é o bem dos cônjuges e a geração e educação dos filhos. Seja qual for o modo de vida e o modelo social adotado, de há muito se percebe que, ao menos para a maioria das pessoas, é melhor enfrentar as agruras da vida com um companheiro (ou companheira) com quem se une para formar uma comunhão plena de vida.
Essa união implica uma entrega mútua de tal intensidade que tende a se expandir, dela advindo os filhos, frutos desse amor. E o melhor ambiente para a formação dos filhos é aquele que se constrói num lar harmonioso e alegre.
Penso, portanto, que o modelo ideal de família seja aquele fundado no casamento. Os outros modelos possuem, quando muito, parte dos atributos que marcam a união que faz um homem e uma mulher com o propósito de constituir uma família.
A união estável, por exemplo, muito se assemelha ao casamento, posto que constituída por um homem e por uma mulher com o propósito de se constituir uma família. Tem, porém, a desvantagem de, ao menos em seu início, nascer sob vínculos frágeis, passível de dissolução a qualquer momento. Isso facilita a ruptura da vida em comum, no mais das vezes com graves prejuízos aos filhos e ao próprio casal. É bem verdade que há uniões estáveis que duram por toda uma vida e, ao contrário, casamentos que se desfazem após muito pouco tempo. Mas isso são distorções do casamento. O ideal seria que homem e mulher estivessem bem cientes da gravidade do compromisso que assumem perante o outro, perante os filhos e também perante a sociedade e se empenhassem de verdade em honrá-lo até o fim.
Penso que também não possa ser tido como modelo mais apropriado a família que se forma na chamada “produção independente”, como tal entendida a situação de pessoas que muito anseiam pela filiação, mas que não possuem um cônjuge ou companheiro. Toda criança tem direito de nascer e se desenvolver ao lado de uma mãe e de um pai que se amam e que a amam, e por amá-la, esforçam-se por educá-la juntos. Isso não tem nada que ver com as situações em que o pai ou a mãe vem a faltar. É que, nesse caso, a pessoa cresce com a dor de ter perdido o pai ou a mãe, mas com a segurança e o conforto de que, enquanto duraram os seus dias, dedicou-se à esposa (ou ao marido) e também aos filhos.
Não se trata de discriminar, nem muito menos de colocar numa situação de inferioridade os filhos e também os pais que passaram pela imensa dor da separação. Mas é preciso reconhecer que essa não é a melhor situação para os filhos, e nem para os próprios pais.
Há, por fim, as relações homoafetivas. Temos de ressaltar novamente o profundo respeito pelo homossexual, repudiando qualquer forma de discriminação. Apesar disso, penso que a verdadeira união conjugal se dá entre pessoas de sexos diferentes. Homem e mulher não são simplesmente “gêneros” diferentes, como eufemisticamente se tem tentado convencer. São naturalmente diferentes e a união conjugal pressupõe essas diferenças que se complementem.

É bem verdade que existem filhos que convivem com pais ou mães que mantêm relações homoafetivas, casamentos e uniões outrora estáveis e agora desfeitas, enfim, vários modelos familiares. E o direito não pode simplesmente ignorar esse fato. Disso não se pode concluir, porém, que todos esses modelos sejam igualmente bons. A família formada por um homem e uma mulher, que se uniram em matrimônio, e que se esforçam por construírem juntos lares luminosos e alegres, sempre foi, é e será o modelo ideal, do que as demais formas não passam de “imitações”. E isso o direito também não pode ignorar.