Ganhou repercussão a polêmica que surgiu a partir das
duras críticas que o Presidente da República fez em relação a um pronunciamento
do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Para ser sincero, não sei
exatamente o que disse o Ministro, nem tampouco pretendo criticar o Presidente
ou defender a posição de um ou de outro. Contudo, a partir do incidente, poderíamos
fazer algumas considerações sobre a função do juiz, mais especificamente, sobre
a postura que deve ele assumir em sua vida pública e privada.
Penso que o juiz não deve buscar um isolamento total.
Há quem sustente que ele não pode ter muitos amigos, deve evitar lugares
públicos ou outras situações que possa comprometer sua imparcialidade. Há uma
grande dose de exagero nisso. Como homem (ou mulher) que é, o juiz vive em
sociedade e nela legitimamente atua. E se coincidir de um amigo seu vier a ser
parte num processo que lhe esteja confiado, o próprio direito prevê a
possibilidade de passar o caso para outro juiz que não seja suspeito ou
impedido de julgar.
No entanto, há situações em que a sua condição de
magistrado impede mesmo que atue. Não pode, por exemplo, fazer críticas
pessoais a quem quer que seja, tanto menos a políticos e integrantes de outro
poder. Não pode se manifestar sobre processos que estejam ainda para ser
julgados por ele ou por qualquer outro juiz. Nada impede, por outro lado, que
preste esclarecimentos à população. Por exemplo, recentemente acendeu-se uma
discussão sobre a propaganda eleitoral antecipada. Nesse caso, penso que o juiz
pode expor publicamente o que a lei diz a respeito do assunto, qual é o seu
entendimento e interpretação que deve ser dado a um determinado artigo de lei.
Não pode e não deve, contudo, dizer, no caso concreto, se a conduta desse ou
daquele potencial candidato é ou não ilícita. É que isso implicaria a
antecipação do seu julgamento e a perda da necessária isenção que deve ter ao
julgar.
O juiz deve se esforçar constantemente por dar um
tratamento igualitário a todas as pessoas em conflito. Talvez
uma situação especialmente difícil para que se mantenha imparcial ocorre quando
uma das partes (ou seus advogados) faz alguma crítica mais severa quanto a uma
decisão proferida. Nesse caso, pode surgir uma propensão a revidar a ofensa.
Trata-se de um sentimento interior mais ou menos do tipo “Ah é!? Já que ele
disse isso da minha decisão, aguarde para ver o que farei com ele na
sentença!”. Trata-se de uma postura pouco nobre e simplesmente inaceitável, que
denota falta de maturidade. Penso que o juiz deve estar preparado para “levar
pancadas sem revidar”. Se por personalidade é mais voltado ao combate e do tipo
“pavio curto” isso é sinal claro de que não está devidamente preparado para o
cargo.
O juiz tem de ter coragem. Muitas situações lhe
exigirão uma fortaleza heróica. Algumas vezes a sua decisão lhe renderá
aplausos. Noutras, porém, incompreensão e indignação. Contudo, não é o aplauso
que deve buscar, mas o fiel cumprimento da sua consciência. A ela, acima de
tudo, é que deve temer. Talvez mais que isso, o grande temor há de ser a
deformação de sua consciência, que então não mais lhe serviria como um norte
seguro a orientar uma atuação coerente em cada situação.
O magistrado deve ser discreto, comedido. Deve
guardar sigilo das informações que tem por motivo da profissão. Tive a grande
felicidade de trabalhar com um desembargador que, além de todas as qualidades de
um magistrado exemplar, era também habilmente discreto. Quando surgia algum
assunto que não era conveniente, com toda delicadeza e de forma que o
interlocutor nem percebia, mudava o assunto para outro mais ameno.
Mas apesar de todas essas considerações, e de muitas
outras que poderíamos fazer, ainda assim no nosso dia-a-dia nos deparamos com
muitas situações em que não sabemos de antemão o que convém e o que não convém
que o juiz faça. Nesses casos, confesso que me é de grande ajuda o conselho que
recebi de um grande sábio: De calar não
te arrependerás nunca; de falar, muitas vezes.
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