segunda-feira, 10 de março de 2008

A polêmica entre os Poderes

Ganhou repercussão a polêmica que surgiu a partir das duras críticas que o Presidente da República fez em relação a um pronunciamento do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Para ser sincero, não sei exatamente o que disse o Ministro, nem tampouco pretendo criticar o Presidente ou defender a posição de um ou de outro. Contudo, a partir do incidente, poderíamos fazer algumas considerações sobre a função do juiz, mais especificamente, sobre a postura que deve ele assumir em sua vida pública e privada.
Penso que o juiz não deve buscar um isolamento total. Há quem sustente que ele não pode ter muitos amigos, deve evitar lugares públicos ou outras situações que possa comprometer sua imparcialidade. Há uma grande dose de exagero nisso. Como homem (ou mulher) que é, o juiz vive em sociedade e nela legitimamente atua. E se coincidir de um amigo seu vier a ser parte num processo que lhe esteja confiado, o próprio direito prevê a possibilidade de passar o caso para outro juiz que não seja suspeito ou impedido de julgar.
No entanto, há situações em que a sua condição de magistrado impede mesmo que atue. Não pode, por exemplo, fazer críticas pessoais a quem quer que seja, tanto menos a políticos e integrantes de outro poder. Não pode se manifestar sobre processos que estejam ainda para ser julgados por ele ou por qualquer outro juiz. Nada impede, por outro lado, que preste esclarecimentos à população. Por exemplo, recentemente acendeu-se uma discussão sobre a propaganda eleitoral antecipada. Nesse caso, penso que o juiz pode expor publicamente o que a lei diz a respeito do assunto, qual é o seu entendimento e interpretação que deve ser dado a um determinado artigo de lei. Não pode e não deve, contudo, dizer, no caso concreto, se a conduta desse ou daquele potencial candidato é ou não ilícita. É que isso implicaria a antecipação do seu julgamento e a perda da necessária isenção que deve ter ao julgar.
O juiz deve se esforçar constantemente por dar um tratamento igualitário a todas as pessoas em conflito. Talvez uma situação especialmente difícil para que se mantenha imparcial ocorre quando uma das partes (ou seus advogados) faz alguma crítica mais severa quanto a uma decisão proferida. Nesse caso, pode surgir uma propensão a revidar a ofensa. Trata-se de um sentimento interior mais ou menos do tipo “Ah é!? Já que ele disse isso da minha decisão, aguarde para ver o que farei com ele na sentença!”. Trata-se de uma postura pouco nobre e simplesmente inaceitável, que denota falta de maturidade. Penso que o juiz deve estar preparado para “levar pancadas sem revidar”. Se por personalidade é mais voltado ao combate e do tipo “pavio curto” isso é sinal claro de que não está devidamente preparado para o cargo.
O juiz tem de ter coragem. Muitas situações lhe exigirão uma fortaleza heróica. Algumas vezes a sua decisão lhe renderá aplausos. Noutras, porém, incompreensão e indignação. Contudo, não é o aplauso que deve buscar, mas o fiel cumprimento da sua consciência. A ela, acima de tudo, é que deve temer. Talvez mais que isso, o grande temor há de ser a deformação de sua consciência, que então não mais lhe serviria como um norte seguro a orientar uma atuação coerente em cada situação.
O magistrado deve ser discreto, comedido. Deve guardar sigilo das informações que tem por motivo da profissão. Tive a grande felicidade de trabalhar com um desembargador que, além de todas as qualidades de um magistrado exemplar, era também habilmente discreto. Quando surgia algum assunto que não era conveniente, com toda delicadeza e de forma que o interlocutor nem percebia, mudava o assunto para outro mais ameno.

Mas apesar de todas essas considerações, e de muitas outras que poderíamos fazer, ainda assim no nosso dia-a-dia nos deparamos com muitas situações em que não sabemos de antemão o que convém e o que não convém que o juiz faça. Nesses casos, confesso que me é de grande ajuda o conselho que recebi de um grande sábio: De calar não te arrependerás nunca; de falar, muitas vezes.

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