Qual o segredo da audiência do Big Brother? Será que é um programa ruim, que deveríamos boicotar
em nossas casas?
Penso que, como tudo que se refere ao ser humano, ser
ou não ser bom, fazer ou não fazer depende de uma análise um pouco mais profunda,
que chega na raiz do problema, que busca as suas causas e motivações. No caso
do Big Brother, acredito que o
segredo do sucesso de audiência está em que explora de forma muito atraente
três grandes anseios de muitas pessoas: a fama, a riqueza e a curiosidade.
Comecemos pela curiosidade. É ela ruim? Por certo que
não. Não fosse ela a ciência não evoluiria, nem as pessoas adquiririam
conhecimentos. É muito importante que o professor desperte nos alunos uma sadia
curiosidade por aprender. Também os cientistas devem estar fortemente
empenhados em fazer novas descobertas, para a cura de doenças, por exemplo, que
trarão grandes benefícios à humanidade.
Mas temos de admitir que há uma curiosidade menos
nobre. É aquela que leva a querer bisbilhotar a vida alheia, invadindo
desnecessariamente a privacidade dos outros. Toda pessoa tem direito à
intimidade. Há aspectos da nossa vida que não queremos revelar, ou ao menos não
desejamos que seja conhecido fora do ambiente familiar. No entanto, ao mesmo
tempo em que desejamos manter a nossa intimidade, é comum o desejo de conhecer a intimidade dos
outros.
Em algumas situações é necessário adentrar na
intimidade das pessoas, como o fazem o médico e, em maior grau ainda, o
psicólogo. Mas o que deve imperar aqui é o propósito de ajudar, não o de
conhecer para satisfazer uma curiosidade deturpada.
No caso desse programa, porém, o que se proporciona
aos telespectadores é a possibilidade de dar rédea solta a essa curiosidade
pervertida. Com ela se busca conhecer aspectos íntimos de outras pessoas apenas
para satisfazer um mero anseio pessoal, sem que com isso se pense (e nem se
pode) em fazer nada de útil pelo outro.
Outro importante ingrediente é a riqueza. Penso que
ela não seja ruim. O Big Brother,
porém, tenta vender uma imagem falsa, qual seja, de que é possível o sucesso
sem qualquer esforço. O que fazem esses “heróis”? Aceitam ficar trancafiados
por um tempo, numa total ociosidade e,
ao final, por aceitarem ficar vários dias ocupados em nada fazer, um deles será
premiado com um milhão de reais!
Com isso, o triste é que muitos jovens compram a
idéia. Ao invés de lutarem por estudar, conseguir um trabalho honrado, que lhes
assegure uma justa remuneração, passam a viver da ilusão de um dia acordar rico
e famoso, como que num passe de mágica. E, por desgraça, têm eles um modelo, um
herói fabricado pela TV que conseguiu essa proeza.
O terceiro ingrediente é a fama. Essa fascina mais
que a riqueza. Quantos de nós nos surpreendemos dando asas à imaginação
pensando em como seria se fôssemos famosos. Há pessoas que, ao fazer qualquer
boa ação, passa a pensar que isso deveria ser matéria do Fantástico do próximo
domingo, quando então todos poderiam ver e admirar “como eu sou bom”.
E o Big Brother
sabe explorar muito bem essa fraqueza humana. Rapidamente tira alguém do
anonimato e o traz para a glória, holofotes, aplausos, flashs etc.
Nesse aspecto, todos nós devemos estar vigilantes,
pois é muito comum procurarmos no aplauso o único motivo para nossas ações.
Falo agora, como exemplo, de minha experiência profissional. É sempre uma
tentação para o juiz se esmerar mais nos casos em que terão repercussão, que
sairão na imprensa, e, por outro lado, deixar de lado, ou dar menos atenção, aos
casos mais simples, sem repercussões, esquecendo-se de que em todos há pessoas
que sofrem e anseiam por justiça. Portanto, quando nossas ações são motivadas
exclusivamente pela fama, facilmente as pervertemos e causamos grandes males e
injustiças. E isso acontece com todos, não apenas com aqueles que têm a função
de julgar.
Fama, honra, riqueza, poder, glória... Se vez por
outra nos ocupássemos em considerar o que seremos nós daqui a não muitos
(trinta? sessenta? oitenta?...) anos, veríamos que tudo isso tem uma
importância muito, muito relativa. Afinal, quantos ainda se lembram o nome do
vencedor do segundo Big Brother? Ou,
se preferirem, quem era o Presidente do Supremo Tribunal Federal em 1958?
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