Agora que terminou o longo período de greve dos policiais
civis de São Paulo, penso que devemos fazer duas ponderações sobre o assunto. A
primeira com relação às reivindicações dos policiais. E a segunda quanto à postura
que se espera agora ser assumida pelos membros da instituição em relação ao
cidadão.
Quanto ao primeiro aspecto, não pretendo (e nem
poderia) questionar o conteúdo da decisão do Supremo Tribunal Federal quanto à
existência ou não de direito de greve. Deve-se reconhecer que as reivindicações
dos policiais são justas. De fato, os salários recebidos estão extremamente
defasados, não condizentes com a importância da função desempenhada em
benefício da sociedade.
E, independentemente de haver ou não o direito de
greve desses servidores, penso que a luta por melhoras condições de trabalho e
salários é legítima. Aliás, confesso que vejo com extrema preocupação e
desconfiança quando noto que servidores públicos, em especial aqueles que detêm
algum tipo de poder (governantes, parlamentares, juízes, promotores, fiscais de
renda, policiais etc.), que não se interessam por seus vencimentos e, por
conseqüência, não lutam por melhores condições. É que, se não se interessam
pelos salários é porque têm outras fontes de renda, lícitas ou ilícitas. Sendo
assim, se queremos ter policiais honestos e engajados em cumprir a sua missão,
o primeiro que se há de fazer é pagar salários justos e dar condições de
trabalho.
Mas há um segundo aspecto da questão a ser ponderado.
Se por um lado as reivindicações dos policiais são justas, por outro, deve-se
considerar que somente terá êxito qualquer mobilização dessa natureza se ganhar
o apoio da sociedade.
Assim, é natural que, diante dessa situação, o
cidadão comece a se questionar acerca da qualidade dos serviços que lhes foram
prestados pelos policiais quando deles precisaram. Muitos se perguntarão: “como
fui atendido quando tive de fazer um boletim de ocorrência por furto de
veículo?”; “como foi o atendimento ao se levar a uma delegacia de polícia a
notícia de um roubo?; “como foi o atendimento no DETRAN para tratar do
licenciamento de veículo?”. E penso que, com relação ao cidadão, não vale como
desculpa algo do tipo “atendo mal porque ganho pouco”. É que o cidadão
responderia a isso, e com toda a razão, que, se o policial ganha mal isso não
lhe diz respeito, pois ele paga, e muito bem, muitos impostos.
Assim, é inegável que há o direito dos servidores em relação
ao Estado a uma digna remuneração, mas a obrigação correspondente a isso não
está disposta em favor do próprio Estado, mas sobretudo da coletividade, em
especial, das pessoas que dependem da atividade policial. E somente se obterá o
apoio indispensável do cidadão se houver uma preocupação constante (e não há
preocupação verdadeira sem ação concreta) pela melhora da qualidade dos serviços
prestados.
E nessa luta pela qualidade do serviço público, de
nada aproveitará as vazias reclamações: “se tivéssemos mais computadores...”,
“se tivéssemos mais espaço físico...”, “se tivéssemos menos inquéritos...”. De
fato, todas essas reclamações são legítimas e se referem a uma realidade
caótica. Mas ainda que seja essa a realidade, não é hora para murmuração. É
momento, por que não, de sonhar e realizar. Deve-se indagar, pois: nessa
situação caótica, o que se pode fazer para melhorar a qualidade do serviço prestado?
Penso que após grandes crises e embates
institucionais, como ocorreu nessa greve, o momento é propício para se tirar bons
propósitos. Delegados, investigadores, escrivães de polícia não trabalham para o
Delegado Geral de Polícia, nem para o Governador do Estado. Ainda que se deva tributar
o respeito aos superiores, o policial civil é um servidor do cidadão, a quem
assiste todo o direito de exigir um serviço público de qualidade. Afinal, só
assim a sociedade será a grande aliada da polícia em quaisquer reivindicações
que possa fazer.
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