Recentemente o Governo Federal anunciou a construção
de milhares de moradias populares como parte do programa de aceleração do
crescimento. Penso que essa notícia é motivo de comemoração, mas também ocasião
para estarmos atentos com relação à forma com que será implementado o projeto e
quanto aos reais objetivos de seus idealizadores.
São muito bem-vindos e deve nos motivar projetos que
visem dar moradia digna a todos. Já faz alguns anos que foi consagrada na
Constituição Federal (artigo 6º) a moradia como um direito social, sem que
fossem tomadas medidas eficazes para que isso se tornasse realidade. A casa, o
lar é imprescindível para que qualquer ser humano desenvolva com dignidade a
sua personalidade. É primordialmente nela que marido e mulher podem manter um
relacionamento saudável e feliz. E é também num lar assim construído que o
casal pode, com total liberdade, gerar filhos e educá-los com responsabilidade.
Assim, o Estado, que consagra a família com base da sociedade (artigo 226 da
Constituição Federal) deve se empenhar de verdade para dar moradia digna a quem
não a tem.
Mas a mesma notícia é motivo para estarmos alertas. É
que temos amarga lembrança em nossa história da construção de casas populares
com material e técnicas de péssima qualidade e com dimensões que mais parecem
confinar que abrigar pessoas. Argumenta-se que retirar as pessoas das favelas e
de outros locais inóspitos para colocá-las nesses imóveis já é um grande
avanço. De fato, é um avanço, porém, não raras vezes o preço que se paga por
esses cubículos são tão elevados que, se melhor empregados, poderiam edificar
casas dignas de serem ocupadas por seres livres. E a diferença entre o que se
paga e o que custam essas obras serve para enriquecer empresários inescrupulosos
e... – não sejamos ingênuos – financiar propagandas eleitorais. Convém não
esquecer que 2.010 é ano de eleições gerais.
Nesse assunto, penso que devemos fazer eco mais uma
vez da Campanha da Fraternidade deste ano: A Paz é fruto da Justiça. Justiça é,
essencialmente, dar a cada um o que lhe é devido. E a todo ser humano é devido,
por direito natural, uma moradia digna. Mas também a um povo honrado e
trabalhador são devidos governantes honestos e competentes.
O mundo está imerso numa crise econômica. Acima de nós
vemos uma grande nação na qual toda a população tem acesso a muitos bens e que
desenvolveu elevadíssimos níveis de consumo. Porém, experimenta agora os
amargos frutos da redução desse exagerado consumismo como fonte de desemprego,
com os problemas sociais disso decorrentes. Em nosso País , ao
contrário, grande parcela da população está à margem do consumo de bens
imprescindíveis para terem uma vida digna. Pode parecer utópico, mas acredito
que é o momento ideal para empregarmos recursos e trabalho para produzir bens
necessários a quem não os tem.
Mas isso deve ser feito com honestidade,
responsabilidade e, principalmente, com iniciativas que gerem empregos para os
nossos pobres. É que, com trabalhos dignos, poderão adquirir honradamente o que
necessitam, e não simplesmente sobreviverem de doações que apenas fomentam o
ócio dos cidadãos e a popularidade de governantes falsamente generosos. Essa
postura assistencialista de governos de “cestas básicas”, no final das contas,
atenta contra a própria dignidade do ser humano. É que não há honra maior ao
homem e à mulher que proverem a si próprios e aqueles a quem amam com o suor de
seus trabalhos.
Para atingirmos esse nível de justiça social não é preciso,
perdoem-me a rudeza do adjetivo, uma imbecil luta de classes. É necessária uma
guerra mais intensa contra nós mesmos, bem no fundo de nosso ser. É lá que
podemos forjar a virtude da justiça e, com ela, empenharmo-nos, cada um no
lugar que ocupamos na sociedade, para dar a cada um o que é seu e, com isso, reduzirmos
a ridícula desigualdade social que tanto nos envergonha.
Ontem celebrávamos a Páscoa. A fantástica passagem
daquele Carpinteiro da morte para a vida. Ao ressurgir para uma vida nova,
ressurgiu também nos corações dos muitos amigos seus. Alguns deles muito
pobres, como os pescadores que o cercavam. Outros ricos, como Nicodemos e José
de Arimatéia, que lhe deu a sepultura. Mas a todos abriu imensos horizontes de
amor ao próximo em seus corações. E é esse mesmo Amor que deve nos impulsionar
a que saibamos construir em nossas casas, lares luminosos e alegres, dignos e
sóbrios, pequenos ou grandes, mas que tenham tom e sabor de acolhida, de paz,
de vida...
A todos uma Feliz Páscoa!
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