segunda-feira, 11 de maio de 2009

O artigo que você não lerá

Quando me atrevo a escrever essas palavras, meu caro leitor, é sexta-feira, 1º de maio, pela manhã. Acabo de receber a notícia de que faleceu um grande amigo que é para mim mais que um irmão, o Francesco Langone.
Ele era titular de um currículo invejável: Professor Livre Docente da Universidade de Campinas; livre-docente pela UNICAMP; pós-doutorado pela Fidia Research Laboratories; pós-doutorado pela Universita Degli Studi Verona; doutorado pela Universidade de São Paulo, USP; mestrado pela  Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP. Seu currículo conta ainda com inúmeros trabalhos científicos publicados, participações em bancas de doutorado e mestrado, de modo que seria impossível citar, ainda que brevemente, neste espaço. Porém, ainda que seja enorme o trabalho que desempenhou em sua vida pelo progresso da ciência, esse não é o seu maior legado.
Não quero que essas palavras soem apenas como uma homenagem póstuma, nem como um simples reconhecimento do que foi um grande homem. Seria dizer muito pouco do querido Francesco simplesmente elogiar-lhe nesses momentos de dor, até porque, em sua imensa humildade, ele por certo o rejeitaria. Aliás, seria uma imensa bobagem querer proporcionar elogios aqui em baixo para aquele que agora ouve doces palavras do Pai celeste a quem ele em tudo buscou servir na sua vida.
Deixo que saiam, porém, essas palavras, ainda que soem à homenagem, para que você, caro leitor, e eu também, possamos ter gravado, enquanto durarem esse papel e essa tinta, o exemplo magnífico de um homem que soube doar a vida pelos seus amigos.
Antes de enviar os artigos para esta coluna, eu costumava enviá-los ao Francesco para que me aconselhasse. Por vezes o e-mail voltava dizendo que estava bom. Em não raras ocasiões, porém, ele me sugeria que desse um tom mais positivo e alegre, que animasse as pessoas já cansadas de tantas mensagens negativas. Em outras, ainda, pedia-me que desse uma tonalidade mais humana e menos “religiosa” aos textos. É que seriam lidos por pessoas de diversas crenças, ou mesmo sem fé alguma, e todos mereciam um alento para lutarem por serem melhores e darem um sentido novo as suas vidas.
Trabalhador incansável, alegre, sereno, disponível aos amigos. Assim foi o Francesco. Sinal claro disso é a saudade que já dói poucos momentos após a despedida.
É impressionante notar como os grandes homens se despedem deste mundo com imensa dignidade. Foi muito querido entre os colegas da UNICAMP. Os amigos, muitos, que os visitavam nos momentos de despedida, eram contagiados por uma mistura de tristeza e serena alegria. Seriam esses sentimentos contraditórios? Penso que não. A perda e a separação causam tristeza, afinal, somos humanos. Porém, a certeza de que há um sentido para nossas vidas, estampada num exemplo tão marcante, não deixa de nos imprimir também uma profunda alegria. Essa alegria nasce do mais íntimo de nosso ser e, aos poucos, vai irrompendo para as extremidades, deitando fora a própria tristeza, substituída agora por uma serenidade.
Serenidade. Como a tens agora estampada em si e em todas as faces que te velam, caro amigo! Talvez seja esse o seu maior legado. Num mundo tão atribulado, em que se corre atonitamente dum lado a outro no mesmo ritmo frenético das comunicações eletrônicas, há pessoas que, sem deixar de viver neste mesmo mundo, sabem estar com os amigos, falar fitando-lhes nos olhos, enquanto deixa que a conversa discorra naturalmente sobre diversos temas: trabalho, família, futebol, Deus etc...
 Despedimo-nos dele numa sexta-feira, 1º de maio, dia dedicado ao trabalho. Que delicadeza de Nosso Senhor chamá-lo para a Sua casa nesse dia! Quantas vezes em sua vida o Francesco ensinou aos seus colegas e amigos a mensagem que deu sentido a sua própria vida, e que ele viveu até o seu último minuto: o trabalho é caminho de santidade, é ocasião de encontro com Deus.

Aceite, caro leitor, compartilhar um pouquinho da minha angústia: o Francesco não lerá esse artigo antes de eu enviá-lo à redação. Se lesse, por certo não permitiria que lhe fizesse esse elogio. Porém, ainda assim o faço, não para desagradá-lo, é evidente, mas para que todos nós aprendamos com o seu exemplo maravilhoso: vale a pena dar a vida pelos amigos!

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