Quando me atrevo a escrever essas palavras, meu caro
leitor, é sexta-feira, 1º de maio, pela manhã. Acabo de receber a notícia de
que faleceu um grande amigo que é para mim mais que um irmão, o Francesco
Langone.
Ele era titular de um currículo invejável: Professor
Livre Docente da Universidade de Campinas; livre-docente pela UNICAMP;
pós-doutorado pela Fidia Research
Laboratories; pós-doutorado pela Universita
Degli Studi Verona; doutorado pela Universidade de São Paulo, USP; mestrado
pela Universidade Estadual de Campinas,
UNICAMP. Seu currículo conta ainda com inúmeros trabalhos científicos
publicados, participações em bancas de doutorado e mestrado, de modo que seria
impossível citar, ainda que brevemente, neste espaço. Porém, ainda que seja
enorme o trabalho que desempenhou em sua vida pelo progresso da ciência, esse
não é o seu maior legado.
Não quero que essas palavras soem apenas como uma
homenagem póstuma, nem como um simples reconhecimento do que foi um grande
homem. Seria dizer muito pouco do querido Francesco simplesmente elogiar-lhe
nesses momentos de dor, até porque, em sua imensa humildade, ele por certo o
rejeitaria. Aliás, seria uma imensa bobagem querer proporcionar elogios aqui em
baixo para aquele que agora ouve doces palavras do Pai celeste a quem ele em
tudo buscou servir na sua vida.
Deixo que saiam, porém, essas palavras, ainda que soem
à homenagem, para que você, caro leitor, e eu também, possamos ter gravado,
enquanto durarem esse papel e essa tinta, o exemplo magnífico de um homem que
soube doar a vida pelos seus amigos.
Antes de enviar os artigos para esta coluna, eu
costumava enviá-los ao Francesco para que me aconselhasse. Por vezes o e-mail
voltava dizendo que estava bom. Em não raras ocasiões, porém, ele me sugeria
que desse um tom mais positivo e alegre, que animasse as pessoas já cansadas de
tantas mensagens negativas. Em outras, ainda, pedia-me que desse uma tonalidade
mais humana e menos “religiosa” aos textos. É que seriam lidos por pessoas de
diversas crenças, ou mesmo sem fé alguma, e todos mereciam um alento para
lutarem por serem melhores e darem um sentido novo as suas vidas.
Trabalhador incansável, alegre, sereno, disponível aos
amigos. Assim foi o Francesco. Sinal claro disso é a saudade que já dói poucos
momentos após a despedida.
É impressionante notar como os grandes homens se
despedem deste mundo com imensa dignidade. Foi muito querido entre os colegas
da UNICAMP. Os amigos, muitos, que os visitavam nos momentos de despedida, eram
contagiados por uma mistura de tristeza e serena alegria. Seriam esses
sentimentos contraditórios? Penso que não. A perda e a separação causam
tristeza, afinal, somos humanos. Porém, a certeza de que há um sentido para
nossas vidas, estampada num exemplo tão marcante, não deixa de nos imprimir
também uma profunda alegria. Essa alegria nasce do mais íntimo de nosso ser e,
aos poucos, vai irrompendo para as extremidades, deitando fora a própria
tristeza, substituída agora por uma serenidade.
Serenidade. Como a tens agora estampada em si e em
todas as faces que te velam, caro amigo! Talvez seja esse o seu maior legado.
Num mundo tão atribulado, em que se corre atonitamente dum lado a outro no
mesmo ritmo frenético das comunicações eletrônicas, há pessoas que, sem deixar
de viver neste mesmo mundo, sabem estar com os amigos, falar fitando-lhes nos olhos,
enquanto deixa que a conversa discorra naturalmente sobre diversos temas:
trabalho, família, futebol, Deus etc...
Despedimo-nos
dele numa sexta-feira, 1º de maio, dia dedicado ao trabalho. Que delicadeza de
Nosso Senhor chamá-lo para a Sua casa nesse dia! Quantas vezes em sua vida o
Francesco ensinou aos seus colegas e amigos a mensagem que deu sentido a sua
própria vida, e que ele viveu até o seu último minuto: o trabalho é caminho de
santidade, é ocasião de encontro com Deus.
Aceite, caro leitor, compartilhar um pouquinho da
minha angústia: o Francesco não lerá esse artigo antes de eu enviá-lo à
redação. Se lesse, por certo não permitiria que lhe fizesse esse elogio. Porém,
ainda assim o faço, não para desagradá-lo, é evidente, mas para que todos nós
aprendamos com o seu exemplo maravilhoso: vale a pena dar a vida pelos amigos!
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