segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Educar na verdade

Há um episódio engraçado em minha infância que me ficou muito marcado. Estava na casa de um amigo, que ao pai anunciou que certa pessoa o chamava ao telefone. Ao saber de quem se tratava, o pai, fazendo uma enorme careta de insatisfação, disse ao filho: “Xii, diga que eu não estou ...”. O menino imediatamente e sem rodeios disse: “Meu pai mandou dizer que não está”. Em seguida, desligou o telefone e, com a maior naturalidade do mundo, voltou a brincar. O pai ficou desconcertado e deu uma enorme bronca no filho.
Contemplando agora recentes acontecimentos envolvendo pessoas ocupantes de altos cargos públicos, vem-me à memória esse acontecimento. É verdadeiramente enojante ver alguém dizer que a Ministra pediu que fossem feitas investigações. Ainda, ela, por sua vez, nega que o tenha dito e, no palco armado para apurar as supostas irregularidades, cada bloco político tenta construir a “sua verdade”. A palavra ética é utilizada como mero instrumento de se obter proveito político da situação. Nesse imenso lamaçal, aqueles que relutam no seu compromisso com a verdade correm o risco de desanimar. De fato, podemos nos perguntar: o que podemos fazer para corrigir essa podridão?
Estou certo de que a corrupção que atinge o Poder Público é reflexo da degradação de valores que foi se forjando no seio da sociedade, ou, antes ainda, no interior das pessoas que a compõem. O mau exemplo daquele pai que, para não ter de suportar o inconveniente de um telefonema indesejado, contou uma mentira, aparentemente sem importância, vai aos poucos destruindo na criança o valor da verdade.
A mentira é um câncer que corrói a estrutura social. É que toda relação humana, para que seja suficientemente forte e contribua para o bem das pessoas, deve estar pautada na confiança mútua. Ao passar por um semáforo verde tenho de ter a segurança de que aquele para quem está vermelho, irá parar. Ao assinar um contrato, é preciso que cada um esteja disposto a honrar o compromisso que assumiu. Ao se contrair um matrimônio e fazer a promessa de respeito e fidelidade, cada qual age na confiança de que o outro irá honrar a palavra dada. E quando se quebram essas legítimas expectativas, surge uma verdadeira doença no seio da sociedade que está estruturada exatamente numa relação de confiança.
A mentira é sempre um mal. Não há “mentirinha inocente”. Há quem diga ao chefe que vai ao dentista para conseguir sair um pouco mais cedo do trabalho. E, ao fazê-lo, pensará consigo mesmo “o que é que tem? Uma mentirinha de nada não faz mal a ninguém”. O problema é que simplesmente não existe mentira sem importância. Quando menos faz um mal terrível ao próprio mentiroso.
De certa, forma até bem intencionados juristas ousam sustentar que a mentira é um direito do réu. Penso que isso se trata de um terrível engano. A Constituição Federal assegura ao réu o direito de permanecer calado diante de uma acusação, e não mentir. E calar não é consentir, e mentir não é uma forma aprimorada de exercer o direito ao silêncio.
Apesar de todo esse panorama desolador, não é motivo para desanimarmos. Apesar de muitos maus exemplos, nossos jovens e crianças trazem em seus corações um anseio irreprimível pela verdade. Trata-se, portanto, de fomentarmos neles essa virtude. Para isso, é necessário que sejam estimulados. Certa vez vi uma mãe extremamente irritada, com um chinelo na mão a berrar: “quem quebrou esse vaso?”. Acredito que não é a forma mais adequada para ensinar um filho a reconhecer o erro.
Conheço uma família que tem por regra que o filho que admitir o erro, por pior que seja, sofrerá um castigo bem mais brando, já que disse a verdade. Essa família tem como lema que o pior erro é a mentira. Isso porque os outros erros, por piores que sejam, sempre têm remédio quando são admitidos, quando se diz a verdade.

Tomara que os futuros homens públicos, e as pessoas em geral, sejam formados em famílias que assim educam seus filhos.

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