Um dia desses presenciei uma cena interessante. Um
amigo chegava à casa do trabalho e seus dois filhos o aguardavam na porta. Ao
entrar, as crianças iniciaram uma lista de reclamações contra a mãe. É que ela
os havia proibido de assistir ao jogo da seleção brasileira de futebol. Os
argumentos dos garotos me pareciam razoáveis, por isso fiquei curioso para ver
o que o pai faria. Após ouvi-los por uns instantes, como estavam exaltados,
disse-lhes em tom firme e sereno: “Esperem um pouco! Eu não sou um tribunal de
apelação das decisões da mamãe. Nós decidimos as coisas juntos. Se ela disse
que não assistirão mais TV hoje, deve haver um motivo razoável e eu não vou
mudar a decisão dela”. Episódios como esses são relativamente comuns nas
famílias. Porém, será que essa atitude sábia do pai é tão freqüente como
deveria ser?
Os filhos costumam descobrir desde muito cedo que
colocar o pai contra a mãe é uma estratégia eficaz para conseguir o que querem.
Com efeito, se sabem que o pai ou a mãe é mais condescendente, após sofrer um
castigo, ou mesmo receber um não a um pedido, sabem o jeitinho de fazer com que
o outro volte atrás da decisão. E se os pais são separados então a estratégia
costuma ser muitíssimo mais eficaz.
Paradoxalmente, porém, ainda que os filhos usem desse
expediente, no fundo eles esperam ardentemente que pai e mãe sejam coerentes e
ajam em sintonia em relação a eles. É que isso lhes dá segurança sobre o que é
certo ou errado, bom ou mau. No exemplo que citei acima, a primeira reação do
filho mais velho foi dizer com ar de derrota: “deixa pra lá, ele também não vai
deixar a gente assistir...”, e saiu cabisbaixo e se arrastando. Porém, poucos
minutos após, ambos estavam muito contentes. E, apesar do castigo, foram para a
cama alegres e serenos.
Penso que pai e mãe deveriam ter essa regra essencial
na educação, ainda que custe muito: jamais contrariar o outro diante dos
filhos. É muito mais prejudicial aos filhos o desentendimento dos pais sobre a
sua educação do que uma injustiça que eventualmente um venha a cometer. Além
disso, se o pai ou a mãe forem injustos em alguma situação, o próprio autor da
injustiça poderá retificar depois, inclusive pedindo perdão.
É evidente que pai e mãe não estarão sempre de acordo
em relação a todos os assuntos, nem mesmo os referentes aos filhos. Cada um
veio de uma família diferente, com costumes diferentes. Por vezes na família
dele se dá pouca importância para as datas, ao passo que na dele esquecer o
aniversário de namoro é uma falta gravíssima. Assim, é natural que haja
divergências. Porém, o casal há de se esforçar por decidir e, se necessário
brigar, mas longe dos filhos. Aliás, também é absolutamente normal e saudável
que haja desentendimentos e até pequenas brigas. Porém, após discutirem, um tem
de ceder, e é muito bom que não seja sempre o mesmo que cede. Mas depois de
tomada a decisão, deve ela ser comunicada aos filhos como sendo dos dois. E
aquele que soube ceder não pode assumir uma postura agourenta, que fica
esperando que dê errado para colocar o dedo no nariz do outro e dizer: “não
falei? Se tivesse me ouvido...”. Tomada a decisão, ela é do casal, aconteça o
que acontecer.
Certa vez ouvi um orientador familiar dizer que a
família pode ser comparada com uma carroça puxada por dois animais. É claro que
toda comparação é imperfeita, explicou ele, e pai e mãe não são na família
simples “burros de carga” a transportar os filhos comodamente numa charrete. Mas,
sob certo aspecto, a comparação pode ser útil. É que se ambos andarem
alinhados, lado a lado, a viagem será tranqüila e, no seu ritmo, chegarão ao
destino. Porém, se um se puser a querer puxar cada um em sentidos diferentes, é
provável que não saiam do lugar, ou botem tudo a perder. E se um abandonar o
seu posto, o outro terá de levar tudo sozinho. Ocorre que essa “carroça” foi
projetada para ser puxada a dois, de modo que somente a duras penas um a
consegue levá-la sozinho.
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