Recentemente recebi o relato de uma pedagoga, que merece ser
compartilhada com o leitor, pois ilustra a importância que as histórias que
contamos podem exercer nos nossos filhos:
Meu avô materno, Francisco Pereira
dos Santos, era lenhador. Exercia essa profissão antes da serra elétrica, antes
de defendermos tanto as florestas, antes, bem antes, de falarmos em letramento.
Como lenhador, meu avô passava a
semana inteira longe, dentro das matas; dormia, acordava, trabalhava e se
alimentava no meio da floresta (talvez, ele a respeitasse mais do que hoje
fazem alguns, apesar dos belos discursos). Entretanto, quando o meu “Vô Chico”
retornava para casa, toda a rotina dele concentrava-se na família: ele tinha o
seu lugar à mesa, tinha o seu espaço no sofá e tinha a neta para que ele lesse
histórias.
E era exatamente isso que meu avô
fazia após a sopa do jantar: pegava um livro e lia histórias para mim. A
estante da casa dos meus avós tinha alguns livros, embora isso não importasse,
porque o meu avô pegava sempre o mesmo livro para ler as histórias mais
fascinantes, misteriosas, imensamente instigantes e envolventes que uma criança
pode ouvir. Durante muito tempo esse era o nosso ritual, era como se eu
estivesse aos pés de uma fonte, cada dia ouvindo uma história diferente.
Quando tinha
mais ou menos onze anos, descobri, ao ver o RG do meu avô, que ele era
analfabeto e que aquele livro de capa verde clara, na verdade, era um volume de
enciclopédia. Tive a revelação de que as histórias que envolveram grande parte
da minha infância não foram somente contadas, foram criadas para mim e que a
leitura que meu avô fazia não era das letras, mas da vida (Daniela Cristina
de Carvalho).
O fascinante exemplo desse homem sábio, apesar de
analfabeto, chama a nossa atenção para a importância desse valiosíssimo recurso
na educação de nossos filhos.
Uma forma muito interessante de contar histórias, que
tenho aplicado com os meus filhos, é incluí-los como personagens. O conto se
torna extremamente empolgante quando eles mesmos participam. Ora se convertem
em guerreiros medievais; ora são construtores de inventos fantásticos, feitos
no quintal da casa e que os lançam numa aventura no espaço; ora são
surpreendidos ao cair num buraco que os levam a um mundo subterrâneo de
fantasia e diversão. Com isso, sutilmente, podem ser incrementados valores e
apresentadas virtudes que podem ser trabalhadas em cada um dos filhos, como a
sinceridade, a generosidade, a ordem, todas elas ornadas e fortalecidas pelo
amor ao próximo.
É interessante notar que uma história bem pensada e
bem contada, sobretudo em relação aos filhos menores, é muito mais eficaz que
milhares de sermões ou que horas de castigo. É que o conto faz com que as
crianças vivenciem algo que se torna concreto para elas. A partir daí tiram
suas próprias conclusões sobre as conseqüências das boas ou más ações que
praticam.
E a ninguém serve de desculpa a falta de tempo.
Conheço pais que fazem isso a caminho da escola, por exemplo. Iniciam uma
história na segunda e terminam na sexta-feira. Isso torna mais agradável e
afetuoso o convívio, educa de verdade e, sobretudo, forja homens e mulheres de
caráter, fortes o bastante para enfrentarem as agruras da vida.
E esse recurso pedagógico não é novo. É extremamente
antigo. Particularmente gosto muito de um excelente Contador de Histórias, que
viveu na Palestina há dois mil anos e que, por gostar muitíssimo de seus
amigos, contava a eles histórias muito simples, como a de um grão de mostarda
ou do Bom Samaritano. Outras vezes, a história era vivida por Ele mesmo, como
quando faltou vinho numa festa de casamento. Essas histórias são de Vida e não
cessam de dar vida à humanidade nesses dois milênios que se passaram. Com a
mesma simplicidade e também com o mesmo amor, podemos fazer o mesmo com os
nossos filhos.
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