Nesses
dias que antecedem à votação em segundo turno para as eleições presidenciais
tem sido recorrente o apelo a convicções religiosas na busca pelos votos dos
eleitores.
Buscando
evitar confusões ou mesmo esclarecer a população quanto a eventuais abusos
cometidos nesse intento, a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, no
último dia 8 de outubro, divulgou uma nota oficial na qual lamenta que “o nome
da CNBB - e da própria Igreja Católica – tenha sido usado indevidamente ao longo
da campanha, sendo objeto de manipulação”. No mesmo documento fica ressaltado
que a entidade não indica nenhum candidato, e recorda que a escolha é um ato
livre e consciente de cada cidadão.
Ao
final, os dirigentes da CNBB exortam os fiéis católicos a terem presentes os critérios
éticos, entre os quais se incluem especialmente o respeito incondicional à
vida, à família, à liberdade religiosa e à dignidade humana.
Em
que pese ressaltar que não se apoia qualquer candidato, seria correto que entidades
religiosas se posicionem sobre certos assuntos, como o aborto, por exemplo, e
aconselhem os seus fiéis a não votarem em candidatos que pretendam a sua
legalização? Não seria isso, também, uma violação à liberdade dos cidadãos que
professam essa fé?
Penso
que não. Independentemente de qualquer religião, todo ser humano nasce com uma
lei natural gravada no seu coração. A consciência de cada um se projeta diante
das inúmeras situações concreta, mas à luz dessa norma ética.
Assim,
quando uma entidade religiosa aconselha os seus fiéis a agirem conforme essa
lei natural em determinados assuntos concretos não se viola a liberdade de seus
seguidores. Ao contrário, orienta suas consciências para que ajam de modo a
promover a dignidade da pessoa humana. Aliás, contrariar essa norma ética
implica o maior fracasso que o homem e a mulher podem experimentar, pois,
agindo contrariamente à sua natureza, em última análise, não conseguem
encontrar a própria felicidade, simplesmente porque a procuram onde ela não
está.
Quando
se orienta a defender a vida e se exige coerência do cidadão na sua legítima
atuação na vida pública, a entidade religiosa busca, ao menos diretamente,
orientar a consciência de seu fiel, buscando o seu bem em si. O efeito geral
dessa atuação, como a aprovação de leis justas e promotoras da dignidade
humana, por exemplo, ainda que boas e também almejadas, é como que um efeito ou
uma consequência dessa atuação, mas não o fim primariamente buscado com essa
orientação.
Em
suma, o magistério que tais entidades exercem não pode ter como escopo alcançar
uma espécie de articulação política que faz de seus fiéis meros instrumentos
para que suas convicções prevaleçam no parlamento, no executivo, nas decisões
judiciais e no poder público em geral. Esses ensinamentos têm como
destinatários pessoas livres e visam orientá-las a buscar a plena realização,
ainda que essas, agindo na vida pública de forma coerente com as suas
convicções, aprovem leis, façam projetos e implementem ações que de fato
promovem a dignidade da pessoa humana.
Talvez
nos ajude a entender melhor o assunto se pensarmos na função de um guia de
alpinismo. Nenhum aprendiz ousará dizer que as suas instruções são inúteis ou
que as cordas a que se mantêm atados tolhem a liberdade. São elas que o mantém
vivo e são os ensinamentos que orientam a escalada. Sem isso, muito
provavelmente se acabaria tragicamente num precipício. Uma entidade religiosa
que pretenda ser autêntica promotora da dignidade humana tem muito que se
inspirar nisso. Não pode amordaçar os seus fiéis em questões que são opináveis
e sejam várias as soluções possíveis. Mas não pode, também, se omitir nos
assuntos em que esteja em jogo a vida de seus fiéis, a saúde moral da sociedade
em que estão inseridos e, em última análise, o bem da humanidade inteira.
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