O
personagem Capitão Nascimento, do filme Tropa de Elite, assumiu o papel de
herói nacional. Com efeito, uma das maiores indignações do brasileiro é a
impunidade. Nesse cenário, um policial honesto e implacável com os criminosos
rapidamente se converte no baluarte da ética nos meios policiais. Semelhante
efeito causou a invasão pelas Forças Armadas do Morro do Alemão, no Rio de
Janeiro, fazendo ressurgir a esperança de uma nova ordem que proporcione mais
segurança para o cidadão de bem.
Mas
há um fato marcante no filme e na operação policial nas favelas no Rio de
Janeiro que também deveria despertar nossa atenção: muitos de nós vibramos
quando os bandidos eram sumariamente mortos pela ação dos policiais.
A
nossa Constituição Federal consagra como fundamento da nação brasileira a
dignidade da pessoa humana. Mas será esse princípio universal e absoluto, ou
depende dos méritos pessoais de cada indivíduo? O criminoso, o traficante ou o
assassino são pessoas que tiveram a sua dignidade diminuída ou mesmo aniquilada
como resultado de suas más ações, ou, apesar disso, a mantém intacta?
Penso
que não é possível dar uma resposta cabal sem analisarmos o que é, na essência,
o ser humano.
Não é
necessário ser especialista para constatar a maravilha do corpo humano. São
milhares de células que formam tecidos, que se organizam em órgãos. Temos os
sentidos que nos permitem compreender e nos relacionar com o mundo exterior e
muito mais. Além disso, o ser humano possui uma alma imortal, de modo que
sequer a morte o aniquilará por completo. E, como corolário disso tudo, traz
dentro de si uma incrível capacidade da amar, de se doar desinteressadamente
aos demais.
Essa
vocação para a transcendência, que o move a buscar o bem do próximo (esposa, marido,
filhos, amigos) é, de certo modo, o que mais acentuadamente caracteriza o ser
humano. É bem verdade que muitos não a desenvolvem e, com isso, desperdiçam a
vida ou parte dela em caminhos de frustração e infelicidade. Nem por isso,
porém, perdem a natureza humana que os fazem titulares de uma imensa e
inabalável dignidade.
Somente
se consegue construir uma sociedade mais justa e solidária, que é a base para a
tão almejada segurança pública, se soubermos ter esse olhar para todo ser
humano, seja para o embrião que cresce no seio materno (ou está congelado em
clínicas de fertilização), seja para a criança (ou adulto) que pede esmola num
semáforo, seja para um bandido que cometeu as piores atrocidades.
Isso
não justifica uma atuação relapsa do Estado no combate ao crime. Não é correto,
sob falsas desculpas de defesa dos direitos humanos, deixar que os malvados
destruam famílias, semeiem medo e divisões, fraudem o patrimônio público e
permaneçam impunes. Mas apesar disso, cabe a todos, em qualquer circunstância,
uma atitude incondicional respeito para com cada ser humano, por sua imensa
dignidade que lhe é inerente.
Um fato
relatado pelo Pe. Luiz Roberto Teixeira Di Lascio, reproduzido no texto base da
Campanha da Fraternidade de 1.997, retrata o heroísmo com que se pode viver o
respeito à dignidade da pessoa humana, fruto de um amor gratuito e fraterno por
cada criatura:
“Em
visita a um preso do Pavilhão 9 da Casa de Detenção do Carandiru – SP (...)
observei que entrou uma senhora de seus 60 anos, simples, cabelo grisalho,
rugas no rosto, andar calmo, meio curvada, semblante sereno, carregando uma
sacola. Dirigiu-se até o banco onde estava sentado um jovem de uns 25 anos. Ele
a acolheu com carinho, e ela, com seus gestos de amor materno. Fiquei admirado
como aquela mãe demonstrou o tempo todo carinho, acolhimento, alegria, como o
seu olhar para o rapaz era de ternura e como ele se sentia alegre. No abraço
que eles trocaram para se despedir, Deus estava presente. O preso que eu
visitava percebeu que eu estava admirando aquela cena, e disse: - Sabe, Pe.
Luís Roberto, aquela senhora não é a mãe dele, mas a mãe do rapaz que ele
matou. Ela prometeu, no dia do enterro, que ela o perdoava, e como sinal deste
perdão ela o acompanharia com muito amor e assistência enquanto ele estivesse
na prisão.”
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