O casamento é, queiramos ou não,
uma entrega e uma doação que fazemos de nós mesmos ao outro. Diante dessa
radicalidade que marca a união conjugal é comum que os cônjuges receiem não ser
correspondidos, ou ao menos que essa correspondência do outro não se dê
conforme as próprias expectativas.
Quando se diz que o amor é
doação não se está a dizer que quem se doa não deseja também receber. A
auto-suficiência do marido ou da esposa, que tolhe qualquer possibilidade de
receber demonstrações de carinho, priva o outro do direito de manifestar o seu
sentimento. Por exemplo, há homens ou mulheres que não permitem que se lhes
prestem pequenos serviços, como trazer um remédio quando está doente. “Não
precisa, deixa que eu mesmo faço isso”, dirá em seu tom altivo e independente.
Acontece que sem o intercâmbio dessas demonstrações de afeto, ainda que se
tenha muita força de vontade de levar o relacionamento adiante, ele tende a
perder o sabor que brota da afetividade. Assim, quem ama de verdade deve também
estar disposto a receber amor, como e quando o outro o queira manifestar.
Marido e mulher trazem muitas
expectativas para a vida matrimonial. Em geral a mulher gostaria que ele se
importasse com ela tal como nos tempos de namoro; que se mantivesse atencioso e
carinhoso; enfim, que apreciasse estar com ela. O marido também espera que ela
se esforce por estar atraente para ele e não apenas quando se arruma para o
trabalho ou compromissos sociais; que o compreenda e valorize o seu esforço por
buscar melhores condições para a família. Mas é inevitável que muitas dessas
expectativas se frustrem. Porque são pessoas diferentes, porque o outro sequer
conhece de verdade as expectativas do cônjuge e porque muitas delas são mesmo
irreais, fruto da imaturidade e da imaginação. Diante dessa frustração,
costumam surgir duas posturas diametralmente opostas, mas ambas incompatíveis
com o verdadeiro amor: o ciúme e a indiferença.
No afã
de ver correspondida a entrega que se faz ao outro, há quem desenvolva uma
atitude possessiva, que faz exigir do outro manifestações de afeto do seu
próprio modo. A lógica do marido ou da mulher ciumento(a) é mais ou menos essa:
“já que faço isso e aquilo por você, quero ser o centro de todas as suas
atenções”. E então se vale da chantagem emocional para exigir a atenção e para
fazer que o outro demonstre o seu afeto do nosso próprio jeito.
A
atitude oposta é a indiferença. Quando alguém se depara com as frustrações, o
sofrimento é iminente. Com efeito, quanto mais radical for a entrega, maior é a
possibilidade do sofrimento quando notamos que a correspondência do outro não
se dá como havíamos idealizado. Assim, talvez inconscientemente, muitos cuidam
de reduzir o sentimento, pois assim se “sofre menos”.
No entanto, ainda que o amor não se limite ao
coração, mas se manifeste também na vontade de querer amar o outro, não se pode
amar sem o sentimento. E a indiferença é um distanciamento, por medo de sofrer,
que acaba por dar veneno ao verdadeiro amor conjugal.
Dizem
que a virtude está no meio. De nada adianta o ciúme possessivo ou a chantagem
emocional, pois não há verdadeiro amor sem liberdade, sobretudo a liberdade
interior para querer amar. Tampouco a indiferença é o resultado do bom uso da
liberdade, mas uma atitude covarde de não se querer dar por medo de sofrer.
Nesse grande dilema do amor conjugal o melhor é a doação desinteressada, que se
traduz em pequenos gestos todos os dias. Não se fica sempre a exigir do outro
uma “contraprestação”, mas se aceita de bom grado e se regozija nas
demonstrações de afeto do outro.
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