segunda-feira, 30 de abril de 2012

O trabalho hoje

Amanhã comemoraremos o dia do trabalho. Há quem comente, com certa ironia, que é uma incoerência não trabalharmos precisamente nessa data. Não creio que seja justa essa crítica. Quando nos afastamos da nossa tarefa profissional, isso pode ser uma boa ocasião para meditarmos sobre ela, buscando o seu verdadeiro sentido em nossas vidas. Além disso, é possível fazer propósitos pequenos, mas concretos, que nos movam a exercê-la de uma maneira mais edificante. E isso por certo trará benefícios para nós mesmos, para as pessoas com quem convivemos e a todos os que dependem do nosso ofício ou profissão.
Nesse intento, talvez um ponto de partida seja nos indagarmos sobre o sentido que tem o trabalho para nós. Será um mal necessário? Talvez um simples meio de ganhar a vida? Será um tempo em que simplesmente suportamos o exercício de uma atividade penosa para obter os recursos de que necessitamos, sempre à espera de alguns minutos de diversão, quando somente então verdadeiramente “viveremos”?
Passamos parte considerável de nossas vidas trabalhando. Também por isso, encarar o trabalho como algo que simplesmente se há de suportar seria, no mínimo, condenar uma grande parte dos nossos dias a ser vividos sem um sentido autêntico, que verdadeiramente valha a pena. A nossa felicidade depende, em não pequena medida, da nossa realização profissional. Bem por isso precisamos construí-la sobre bases sólidas.
É inegável que necessitamos trabalhar para obtermos os recursos econômicos para mantermos a família, educarmos os nossos filhos etc. Porém, além de ganhar dinheiro, pode haver um sentido bem mais profundo: quando nos esforçamos por trabalhar bem tornamos mais digna a nossa própria profissão ou ofício. O operário que se esmera cada dia em exercer melhor a sua função, de certo modo, faz crescer em dignidade o próprio trabalho.
Além disso, o esforço renovado por trabalhar bem constitui um meio para desenvolvemos a nossa própria personalidade. Quem já procurou desempenhar cada dia melhor a mesma atividade sabe, por experiência, que isso nem sempre é fácil. São inúmeros os desafios que encontra, todos os dias, para fazer com uma melhor qualidade técnica, num tempo menor e com mais eficiência. No entanto, quando sabermos superar com valentia e perseverança esses obstáculos, crescemos enquanto pessoas.
E não é apenas a qualidade técnica, a eficiência ou o lucro que importam. Todo trabalho visa, direta ou indiretamente, proporcionar bens ou serviços aos demais. Nesse sentido, importa saber enxergar cada dia mais e melhor que há pessoas que dependem do nosso trabalho. São homens e mulheres a quem nos cabe, por vocação profissional, servir e ser úteis. E é precisamente nesse esforço que conseguiremos forjar em nós uma personalidade madura e equilibrada.
O trabalho é, muito especialmente, um meio para construirmos um mundo melhor. Através do nosso trabalho podemos contribuir para que as pessoas que estão a nossa volta encontrem um sentido para as suas vidas e, por consequência, a própria felicidade.
As nossas boas ou más ações nunca se encerram em nós mesmos. Um profissional negligente e desleixado, ainda que cause um grande dano a si próprio, também o faz em relação àqueles com quem convive e que dependem do seu trabalho.
De igual modo, talvez já tivemos a experiência de conviver com um bom colega: cumpre com responsabilidade suas obrigações, é cordial e educado, esforça-se por ouvir e ajudar. Enfim, contagia positivamente com a sua alegria e o seu espírito de serviço. É bom trabalhar com pessoas assim. Parece que, com o tempo, vai se construindo um bom ambiente de trabalho. Mais ainda, a qualidade técnica cresce na mesma medida das relações humanas que se estabelecem.

Talvez seja esse o grande desafio que podemos nos propor nesse dia do trabalho: fazermos com que a nossa profissão seja exercida cada vez com mais qualidade e eficiência, sem nos esquecermos, porém, que na origem e no fim de qualquer atividade nobre, há sempre seres humanos, ávidos de um sentido para suas vidas, o que não alcançarão em propósitos mesquinhos e egoístas. Bem ao contrário, o encontraremos quando nos decidiremos de verdade a trabalhar seriamente pela construção de um mundo melhor, a começar pelo nosso próprio local de trabalho.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

O que falar e como falar?

Certa vez um amigo me relatou os problemas com um antigo sócio num escritório de advocacia. Dizia ele que o colega o irritava profundamente quando, ao final do expediente, saía apressadamente para a academia e deixava por conta dele os assuntos pendentes, inclusive a tarefa de fechar o escritório. Com isso, ao aproximar-se o fim do dia era uma tortura imaginar o amigo se espreguiçando na poltrona enquanto dizia: “bem, agora vou pra ginástica”. Depois de muito tempo, num dia em que as coisas não haviam transcorrido muito bem, ao notar que o colega se preparava para sair, não se conteve e explodiu, dando causa a uma discussão que redundou numa inimizade difícil de ser resolvida.
Inúmeros exemplos semelhantes a esse poderíamos encontrar no relacionamento em família. Isso nos chama a atenção para um dado relevante na comunicação: precisamos dizer as coisas, porém, devemos fazê-lo no momento certo e da maneira adequada.
Por vezes, há defeitos reais na esposa, no marido ou nos filhos que causam incômodos. No entanto, não se fala oportunamente e, com isso, vai se avolumando certo rancor até que, em determinado momento, explode-se. E, quando isso acontece, na discussão, muitas vezes se dizem palavras injustas, exageradas ou ditadas pela imaginação, que não têm nenhuma eficácia no sentido de motivar o outro a vencer o defeito. Ao contrário, no calor da discussão, frequentemente dizem-se palavras que não se queria e não se deveria dizer, que magoam, deixando feridas difíceis de serem curadas.
Conheço um casal que desenvolveu o hábito de, nos momentos de descontração, talvez quando saem para jantar a sós, fazer com sinceridade a seguinte pergunta: “Nos últimos dias, algo que eu tenha feito que lhe desagrada?”. É necessária muita humildade para ouvir a resposta. Mas é apenas questão de treino. Com o tempo, vai-se adquirindo o hábito de dizer as coisas com naturalidade, num tom ameno e positivo.
É muito importante dar um sentido positivo ao que se fala, sobretudo com os filhos. Frequentemente nos surpreendemos com frases do tipo: “eu já lhe falei mil vezes...”, “não aguento mais essa bagunça...”, “você sempre faz isso”, “você nunca se preocupa comigo”. Penso que as palavras “sempre” e “nunca” jamais deveriam ser utilizadas ao se apontar um defeito no comportamento do outro. É que elas não estimulam a melhorar e, além disso, quase sempre são injustas. Por exemplo, se a esposa se atrasa a nove dos dez compromissos que tiveram já seria injusto dizer que ela sempre chega atrasada. Talvez fosse o caso de se dizer, depois, com os ânimos serenos: “o que posso fazer para lhe ajudar a chegarmos no horário?”.
Um grande desafio é saber se colocar no lugar do outro. É que há defeitos que não temos e, quando os vemos na esposa, no marido ou nos filhos, isso no incomoda e até se chega a pensar que se faz de propósito. Por exemplo, uma esposa que é naturalmente ordenada com a casa costuma se aborrecer quando o marido deixa os objetos jogados. Após dizer uma vez e outra, ela chega a pensar que ele faz de propósito: “não é possível! Só pode ser pra me irritar que você deixar a sua carteira jogada!”. Devemos considerar, porém, que as pessoas são diferentes. Algo que nos é fácil realizar talvez seja difícil para os demais. Isso nos deve fomentar a compreensão. Não se trata de ignorar os defeitos, nem que não se deva corrigi-los, conforme o caso, mas sem asperezas, com a suavidade de quem busca, acima de tudo, o bem do próximo.

Deveríamos considerar, com frequência, que o que sai da nossa boca, os nossos gestos, o nosso modo de olhar, o tom e a intensidade da nossa voz, enfim, a maneira como nos comunicamos pode ser um fardo que imobiliza e desestimula as pessoas com quem convivemos. Ou, bem ao contrário, pode ser um alento, algo que move os demais a serem melhores. Eis aqui um grande desafio da comunicação: por meio dela podemos ser verdadeiros semeadores de paz e alegria nos nossos lares, no nosso trabalho e em todos os ambientes em que nos movemos.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Carta Aberta aos Deputados e Senadores

Hoje peço licença ao leitor, que toda semana me acompanha nesta coluna, para fazer neste espaço um apelo ao Deputado Federal e ao Senador a quem conferi o poder de me representar no Congresso Nacional nas últimas eleições.
Faço-o para externar a minha profunda preocupação com recentes decisões do Supremo Tribunal Federal, que podem representar usurpação de competência legislativa, conferida pelo povo brasileiro exclusivamente aos senhores, que são os legítimos representantes eleitos pelo povo, na forma prevista em nossa Constituição Federal. Menciono dois exemplos disso.
A nossa Constituição Federal proclama, com uma clareza absoluta, no § 3º do artigo 226 que: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. Trata-se de uma regra que o legislador constituinte, investido de poderes para elaborar a Lei Maior desta Nação, legitimamente instituiu.
No entanto, essa questão foi apresentada perante o STF, a quem cabe precipuamente zelar pelo cumprimento da Lei Maior, e esse Tribunal que conseguiu ler naquela mesma norma que a entidade familiar também pode ser formada por pessoas do mesmo sexo! Senhor Deputado, Prezado Senador, quem deu a esse Tribunal, por mais excelso que seja, esse poder?
Convém lembrar que a nossa Constituição Federal prevê a forma de ser ela própria modificada: através de uma emenda constitucional e não pela via de decisão judicial. E isso quando a matéria é passível de emenda, pois há cláusulas pétreas, impossíveis de serem alteradas, como por exemplo, o direito à vida (artigo 60, § 4º, inciso IV da CF).
O segundo caso é mais recente. O nosso Código Penal pune o aborto, consagrando essa prática como um crime contra a vida. Em duas situações, o legislador dispôs que a conduta não é punível. São elas: I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante e; II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
Não está dito que o aborto de anencefálico não é crime. No entanto, acabam de legalizar esse crime! E, a propósito, chegou-se a sustentar que o legislador de 1940, quando foi elaborado o Código Penal, se tivesse conhecimento da anencefalia, teria incluído também essa causa de exclusão da punibilidade. Ora, ignoram que ainda temos um Poder Legislativo constituído capaz de modificar essa norma? Estão a sugerir que os senhores parlamentares estão dormindo? E estão?
Talvez os senhores estejam a se perguntar, caros Parlamentares, o que poderiam fazer para evitar que a função legislativa seja exercida por outro Poder que não o Legislativo. E a essa suposta indagação devo responder que, por primeiro, não lavar as mãos como o fez um mau juiz. Segundo, apresentando propostas legislativas ou de emenda constitucional que disponham sobre esses assuntos cuja competência foi usurpada de acordo com a vossa consciência e com os anseios dos eleitores que lhes confiaram o mandato. Terceiro, não se omitindo sobre as questões relevantes apresentadas para deliberação no Congresso Nacional, dentre elas, destaco o chamado Estatuto do Nascituro, que viria a disciplinar importantes aspectos da proteção do direito à vida.
Além disso, a nomeação de um ministro do Supremo Tribunal Federal depende da aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal. Penso que é chegado o momento de, nessa arguição, se obter o compromisso do candidato de respeitar as atribuições do Congresso Nacional.

Termino externando aos senhores, caro Deputado, nobre Senador, que muitos brasileiros estão de luto diante do retrocesso que tivemos na luta pelo direito à vida. Com isso, só nos resta recorrer a nossos legítimos representantes, na esperança de que não se omitam na grave responsabilidade que assumiram de editar leis que assegurem e promovam a vida humana desde o seu início até o seu fim natural.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Páscoa em família

Ontem celebramos a Páscoa. Muitos de nós talvez nos perguntemos: qual é o sentido dessa festa? Será uma oportunidade para nos deliciarmos com ovos de chocolate? Ou, além disso, terá ela também um sentido cristão? Independentemente da religião, haverá algo que podemos aprender com essa celebração?
Penso que as celebrações são imprescindíveis para o ser humano. Nossa vida é um ciclo. Nela se alternam dias e noites, inverno e verão, outono e primavera, dias de sol e dias de chuva, momentos felizes e momentos tristes, dias normais e dias festivos. Um dia de festa, nesse sentido, quebra a rotina para celebrarmos algo. No fundo, o bom da celebração é a convivência com quem amamos e com quem compartilhamos nossos projetos, sonhos, enfim, a nossa própria vida.
Há muito que se pode fazer para fortalecer os vínculos familiares, tornando mais alegre e amável a vida em família. Nisso se insere muito especialmente o saber comemorar juntos. Lembro-me de uma festa de aniversário de um dos meus filhos. Naquela época passávamos por um aperto econômico e decidimos não fazer festa para os amigos. Apesar disso, minha esposa arrumou com imenso carinho o apartamento e preparou um bolo. Ao chegarmos a casa, foi para o aniversariante uma enorme e agradável surpresa. Somente os pais e os irmãos – que já não eram poucos – participaram da festa. Num dado momento, em que todos brincavam descontraidamente, ele me deu um caloroso abraço e me disse: “Papai, estou muito feliz!”.
Uma vez assistimos a um programa infantil, “Castelo Rá-Tim-Bum”. O episódio do dia se chamava Gincana de Páscoa. Os ovos ficavam escondidos e o Nino, personagem do seriado, teria de encontra-los num determinado tempo, pois do contrário os perderia. Seguimos a ideia e, desde então, toda Páscoa tem de ter a “gincana”. Parece uma bobagem, mas isso passa a fazer parte da vida das crianças e da história da família. Reforça os laços e fomenta um convívio saudável e amistoso. E, com o tempo, quantas boas lembranças...
Mas a vida em família não se resume a festas e comemorações. A grande maioria do nosso tempo se passa no ordinário, no comum de cada dia. Por isso é especialmente importante saber construir também nesses momentos uma saudável convivência. E o segredo para isso não está em realizar grandes façanhas, mas no cuidado nos pequenos detalhes. Trata-se, por exemplo, de se esforçar por trazer notícias agradáveis para comentar com a esposa, marido e filhos. Que a família tenha ao menos uma refeição do dia com todos juntos, com a TV e o computador desligados e, se possível, que os celulares também não desviem nossas atenções... Sei de alguns pais que fizeram a experiência de manter alguns minutos de descontraída conversa após o jantar. É fantástico notar como isso propicia a construção de um lar verdadeiramente feliz.
Compartilho com o leitor a grande alegria que o meu filho, de sete anos, nos proporcionou outro dia. Enquanto estávamos numa igreja, quis ele escrever uma dessas anotações de intenções que se depositam numa urna. E ele não se incomodou em mostrar o seu pedido: “Senhor, que o meu irmãozinho que acaba de nascer traga muitas alegrias para nossa família”. Penso que um grande segredo para aproveitarmos bem cada momento de nossas vidas é aprender a fazê-lo com a simplicidade das crianças.

Ontem, hoje e ainda por vários dias comemoramos a Páscoa. A origem da palavra vem de passagem, que também nos remete para um desejo de vida nova, libertando-nos de tudo o que nos aprisiona e nos impede de sermos felizes. E muitas vezes os grilhões que nos acorrentam são o nosso egoísmo, uma correria insana em busca de satisfação pessoal, de modo que talvez nos esqueçamos da esposa, do marido, dos filhos, dos pais, dos amigos e de todas as pessoas com quem convivemos. O gesto de abrir um ovo e, com isso, compartilhar doces alegrias, pode ser um símbolo do que deveríamos fazer, todos os dias, com o nosso coração: abri-lo por amor aos demais.