segunda-feira, 28 de maio de 2012

A paciência na educação

Lembro-me de um acontecimento da infância que me ficou bem marcado na memória. Por solicitação da professora de ciências, realizamos um trabalho escolar, que consistia em plantar uma semente de feijão num pedaço de algodão umedecido. Alguns dos meus colegas atenderam ao pedido com maior prontidão, ao passo que eu o fiz depois de alguns dias. É claro que o pé de feijão deles nasceu primeiro e, após alguns dias, estavam maiores que o meu. Talvez desejando compensar o tempo perdido – ou por inveja mesmo – dispus-me a tentar esticar o caule do meu experimento. Ao cabo de duas ou três tentativas, a plantinha se rompeu. Com isso, a perda de tempo foi ainda maior, pois tive de começar a experiência novamente.
Hoje parece absurda aquela ação. No entanto, talvez seja o que muitas vezes os educadores tentam fazer com os seus filhos ou alunos: propõem melhoras ou metas a serem atingidas e esperam que todos correspondam num piscar de olhos. É preciso considerar, porém, que o desenvolvimento das pessoas, sobretudo das virtudes humanas, precisam de um tempo. E esse tempo não é uniforme em todos os seres humanos. Ou seja, cada um tem o seu ritmo.
Por vezes lhes expomos comportamentos que esperamos deles, como manter em ordem o quarto e o material escolar, ou estudar e realizar as lições com ordem e constância. No entanto, quando vemos que não correspondem imediatamente nos impacientamos, talvez com críticas azedas do tipo “eu já falei mil vezes para...”.
Uma qualidade necessária no bom lavrador é a paciência. É certo que necessita do zelo para escolher bem a semente. Depois é necessária a laboriosidade para semear, adubar e cuidar da frágil plantinha que brota da terra. É preciso, também, estar atento para as possíveis pragas que matam a lavoura para aplicar o remédio necessário e no tempo certo. Mas é fundamental saber esperar. A colheita virá no tempo certo. O sucesso depende do trabalho, mas há inúmeros outros fatores em relação aos quais não se tem total controle.
Algo de semelhante ocorre na educação. Ou seja, os pais e professores podem semear boa semente, com palavras e principalmente com o exemplo. Podem – e devem – cuidar para que cresçam com saúde e com sólida formação nos valores. Também hão de estar atentos às possíveis más influências das companhias (das drogas) que podem por tudo a perder. Com isso, criam condições propícias para que também produzam bons frutos. Mas não está ao alcance dos pais e dos educadores em geral a certeza do sucesso nesse empreendimento, pois também aqui agem inúmeros outros fatores em relação aos quais não se tem controle.
Toda analogia é imperfeita. Com os avanços da tecnologia no chamado agronegócio os riscos do insucesso na colheita reduziram enormemente. Na formação dos nossos filhos, porém, nunca haverá “técnicas” infalíveis que nos assegurem o êxito. E isso porque todo ser humano nasce com um atributo que lhe é indissociável: a liberdade.
No entanto, paciência não é sinônimo de omissão. De fato, não está em nossas mãos o sucesso nesse empreendimento maravilhoso que é a educação dos nossos filhos e alunos. Com muita frequência escutamos pais mais experientes dizerem aos novatos: “Isso é apenas uma fase, logo passa”. De fato, há alguns momentos mais difíceis na vida dos nossos filhos, como ocorre na adolescência. E essas fases passam. Porém, se empreendemos ações educativas oportunas e no tempo certo proporcionamos os meios para que possam crescer e adquirir virtudes e não simplesmente “passar de fase”, quiçá arraigando ainda mais os defeitos.

Temos de considerar, também, que há sempre um risco na educação. E isso não é motivo para medo e aflição, mas para formarmos em nós a fortaleza, a confiança e ..., a paciência. A propósito: “Devemos dar o melhor de nós na educação, mas devemos estar convictos que não fabricados a personalidade dos nossos filhos, apenas influenciamos. Quem não quer correr riscos está inapto para educar” (CURY, Augusto. MARIA, A MAIOR EDUCADORA DA HISTÓRIA. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2007. P. 16).

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Lei Maria da Penha

O meu colega André Fernandes, em sua coluna da última semana, nos lançou um convite para pensar o direito. E, dentre os temas que merecem nossa atenção, está a chamada Lei Maria da Penha. Aceito o convite para a reflexão, quando menos para não me incluir no rol dos não pensantes, elegantemente criticados em seu artigo.
Penso que a Lei tem seus méritos. Por exemplo, constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, o juiz poderá determinar o afastamento do agressor do lar, proibir a sua aproximação da vítima etc. No entanto, trata-se de um mero instrumento para mitigar alguns efeitos do problema, sem atacar as suas causas. E se não for aplicada com bom senso e serenidade, pode fomentar uma situação de enfrentamento que agrava ainda mais o já conturbado convívio familiar.
Mas quais seriam, então, as causas desse câncer disseminado no seio de muitas famílias?
A questão é complexa. Há inúmeros fatores que acarretam essa agressividade no seio de muitos lares. Convém não desprezar o efeito do alcoolismo e do consumo de drogas. No entanto, o problema de fundo está na perda do respeito entre os cônjuges e, por consequência, deles em relação aos filhos e vice-versa.
O relacionamento conjugal tem suas fases próprias que convém serem seguidas e respeitadas, sob pena de se desvirtuar tão gravemente em sua essência, que não se pode prever ou evitar as consequências.
A primeira fase do amor conjugal é a mera atração. O homem pode contemplar uma mulher e ela a ele e sentirem que algo atrai. Essa pode ser passageira ou não. Se a ela se seguir um relacionamento, no qual surge o conhecimento mútuo, desse pode brotar algo um pouco mais profundo que é o sentimento, a afetividade. Essa é como que a segunda fase.
Mas o amor não é apenas sentimento. Há um momento em que surge um desejo de entrega, de compartilhar as suas vidas. E então, além da afetividade, que não precisa ser perdida ou superada, faz-se necessário o comprometimento da vontade. Do contrário, cada qual se colocaria diante da terrível situação de se doar a outra pessoa que, a qualquer momento, pode simplesmente rejeitá-la, talvez dizendo que “acabou o amor”. Precisamente por isso é necessário que se chegue à terceira fase, que é o compromisso selado publicamente. Por meio desse cada um se compromete a compartilhar a sua vida com o outro.
Lamentavelmente, porém, tem se perdido a noção do que é o amor conjugal em sua essência. E frequentemente as relações são mantidas por interesse. Com isso, busca-se o outro não pelo outro, mas apenas na medida em que possa proporcionar uma satisfação pessoal. E as reações são muito diversas quando não se encontra no cônjuge ou no companheiro essa disposição à satisfação das próprias necessidades.
Talvez possamos entender melhor a situação se a compararmos com um rio. Enquanto ele segue por entre suas margens, cumpre a sua função e chega ao seu destino. Porém, se o tirarmos do seu leito, é imprevisível o rumo que tomarão as suas águas. De modo semelhante, se tirarmos o amor conjugal do seu contexto natural é impossível prever quais serão as consequências. Pode ser que cresça o número de divórcios e separações. Pode ser que surjam filhos sem esperança, que não encontrem sentido para as suas vidas. E pode ainda surgir a violência, quando um se recusa a ser para o outro mero instrumento de satisfação egoísta... Enfim, não dá para prever.

Nesse cenário, muito mais importante que editarmos leis que punam os agressores, não seria melhor colocar o rio no seu leito? Isso não quer dizer retomar padrões familiares de outras épocas, marcados pela submissão da mulher. O que se há de busca é acima de tudo o respeito. Respeito à pessoa e ao sentimento do outro. Respeito aos compromissos livremente assumidos, em especial aquele que seguiu uma fórmula mais ou menos assim: “e te prometo ser fiel, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, amando-te e te respeitando...”

segunda-feira, 14 de maio de 2012

O dom de ser mãe

Ontem foi dia das mães. Talvez uma maneira interessante de prestarmos uma justa homenagem àquelas que receberam o imenso dom da maternidade seja fazermos uma análise do papel da mulher em sociedade e, principalmente, o que se espera delas nesse mundo em que vivemos.
No século passado e nesse início do atual as mulheres obtiveram enormes conquistas na luta pela igualdade jurídica em relação aos homens. O resultado é que exercem atualmente um papel relevantíssimo nos mais diversos segmentos do mundo do trabalho. São elas operárias, prestadoras dos mais variados serviços, executivas, empresárias, magistradas e até Presidenta da República.
Penso que esse fenômeno é irreversível e é muito bom que elas ocupem os mais diversos postos, pois em todos dão um tom feminino, imprescindível para tornar mais humanas as relações.
No entanto, a busca pelo sucesso profissional tem representado, não raras vezes, uma verdadeira guerra psicológica contra elas próprias. Com efeito, exige-se da mulher uma constante ascendência no trabalho, sob pena de vir a ser uma mera mãe de família ou, pior ainda, uma simples dona de casa. Isso seria, no pensar de muitos hoje em dia, o mais temível fracasso a que pode ser relegada. É como se essa profissão – se é que se pode chama-la assim – fosse o castigo que se impõe pela incompetência profissional.
E se as que optam por se dedicar inteiramente ao marido e aos filhos são vistas com esse cruel preconceito, por outro lado, as que exercem um trabalho fora do lar, com frequência têm de suportar uma carga maior de responsabilidade no cuidado da casa e educação dos filhos.
Em ambos os casos, portanto, há situações de injustiça. Se a sociedade, o Estado, as empresas e as instituições em geral se beneficiam com o trabalho da mulher, penso que os encargos disso haveriam de ser suportado igualmente por todos.
É triste notar como o sucesso profissional da mulher é frequentemente acompanhado pelo fracasso no lar. Por que seus casamentos não deram certo? Foram elas que priorizaram o trabalho em prejuízo do marido e dos filhos? Ou faltou a cooperação deles e condições especiais de trabalho que permitissem que elas conciliassem a missão de mãe e esposa com o trabalho profissional?
É fundamental uma participação mais ativa do homem na família. Não se trata apenas de “ajudar” a esposa na educação dos filhos e administração do lar. É necessário compartilhar igualmente as responsabilidades. E pai e mãe não encontrarão essa sintonia com uma simples acomodação de interesses contrapostos, como ocorre num contrato: “eu faço isso e você em troca me dá aquilo”. Não. Tem de haver uma cooperação de amor com unidade de propósitos: o bem do outro e dos filhos.
Mas se por um lado se há de assegurar à mulher condições favoráveis para obter o sucesso profissional sem prejuízo da sua missão no lar, por outro se há de respeitar aquelas que livremente optam por dedicar integralmente ao marido e aos filhos. É preciso gritar bem alto que não se trata de um trabalho de terceira categoria! Todos os trabalhos honestos são igualmente dignos. Não há uma função mais nobre que as outras. Mas se há uma que pode ser considerada mais sublime é aquela que exerce a mãe na família. É que somente a sua delicadeza e ternura podem forjar um ambiente propício para uma saudável formação dos filhos e convivência amistosa do casal.
O “feliz dia das mães!”, que talvez tenhamos pronunciado há pouco, somente poderá ser considerado um desejo sincero se nos comprometermos de verdade em buscar as condições para que elas sejam verdadeiramente mães. Para isso, não basta o simples reconhecimento e agradecimento dos filhos. É necessário um engajamento dos pais e da sociedade em geral para que a maternidade não represente jamais um fardo pesado para ela. Ao contrário, que seja um dom que a liberta de um egoísmo estéril, promovendo a vida em plenitude de novos seres, também chamados a viver uma imensa e inesgotável felicidade.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Abandono afetivo

Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu o direito à indenização de uma filha em relação ao seu pai por abandono afetivo. Trata-se de uma decisão histórica que merece especial atenção, especialmente pelos rumos que podem estar tomando as relações familiares em nossa sociedade.
Todo filho tem o direito natural de ser cuidado e educado por seus pais. Com efeito, a paternidade não se encerra no ato de gerar. Assim como o pai coopera no ato de dar a vida a um novo ser, incumbe-lhe, com absoluta prioridade, o dever de cuidar e educar a prole.
Além disso, todo ser humano foi concebido para nascer, desenvolver-se e morrer no seio de uma família. A família é como que o habitat natural do homem e da mulher. Nesse sentido, o cuidado e a educação dos filhos devem ser proporcionados no convívio diário, em grande parte no seio do próprio lar.
Quem já teve a fantástica experiência de exercer a paternidade sabe que todos os momentos e circunstâncias da vida familiar são oportunidades educativas. Os filhos aprendem muito mais com o exemplo do que com os que os pais os lhes dizem. Além disso, é na convivência diária que se pode desenvolver o espírito de observação de modo a orientar, aconselhar, corrigir e estimular os nossos filhos.
Atento a esses dados, que tocam na própria natureza do ser humano, convém agora nos debruçarmos sobre o alcance que poderá ter a recente decisão, como também de outras que a poderão suceder a partir desse precedente.
Justiça não é simplesmente o resultado que se espera de uma decisão judicial. De fato, convém que essas sejam, acima de tudo, justas. Porém, muito mais que isso, justiça é uma virtude humana, que nos move a dar a cada um o que lhe é devido. Nesse sentido, é justo o pai que se desdobra para cuidar e educar os filhos todos os dias. O pagamento de uma indenização por danos morais é, portanto, um paliativo, uma punição que se impõe aos pais negligentes no respeito aos direitos dos filhos, e não o cumprimento de um preceito de justiça.
Nesse momento, cabe-nos, portanto, indagar: será necessário, doravante, impor punições aos pais que negligenciam no cuidado e educação dos filhos?
Lembro-me de um bom professor que tive nos primeiros anos da Faculdade de Direito. Numa aula ele se empenhava em traçar as diferenças entre o direito e as meras regras de convivência social. E dizia que essas, por vezes, podem se converter em normas jurídicas. E deu o seguinte exemplo: antigamente, quando uma pessoa idosa adentrava no bonde, imediatamente alguém lhe cedia o lugar. Com o tempo, tornou-se necessário editar normas, reservando assentos para essas pessoas nos meios de transporte públicos, pois não mais era possível contar apenas com a cortesia dos mais jovens.
Há quem diga que a recente decisão do STJ permite traçar um paralelo com a situação do respeito ao idoso. Ou seja, que antigamente os pais zelavam para criação e educação dos filhos independentemente do risco de uma condenação judicial; no momento atual, porém, faz-se necessária a possibilidade da punição. Não creio que a comparação seja de todo justa. Afinal, sempre existiram pais negligentes.
Comparações a parte, penso que a decisão representa um avanço, na medida em que os genitores relapsos estarão sujeitos a uma punição eficaz. Afinal, o dever de indenizar toca numa parte muito sensível do ser humano: o bolso.

Chegado nesse ponto, confesso ao leitor estava dando voltas sobre o assunto, sem saber como concluir. Foi então tive de acudir ao choro de nosso filho recém-nascido, com as naturais cólicas da idade. Após um tempo de colo, já com a barriguinha aquecida, ele se acalmou se rendeu ao sono... Que fantástica a imagem daquele rostinho sereno completamente abandonado em nossos braços!.. Diante disso, ocorreu-me apenas deixar registrada uma terrível dúvida: haverá dinheiro no mundo que possa compensar a ausência desse momento?