O meu colega André Fernandes, em
sua coluna da última semana, nos lançou um convite para pensar o direito. E,
dentre os temas que merecem nossa atenção, está a chamada Lei Maria da Penha.
Aceito o convite para a reflexão, quando menos para não me incluir no rol dos
não pensantes, elegantemente criticados em seu artigo.
Penso que a Lei tem seus méritos.
Por exemplo, constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a
mulher, o juiz poderá determinar o afastamento do agressor do lar, proibir a
sua aproximação da vítima etc. No entanto, trata-se de um mero instrumento para
mitigar alguns efeitos do problema, sem atacar as suas causas. E se não for
aplicada com bom senso e serenidade, pode fomentar uma situação de
enfrentamento que agrava ainda mais o já conturbado convívio familiar.
Mas quais seriam, então, as
causas desse câncer disseminado no seio de muitas famílias?
A questão é complexa. Há inúmeros
fatores que acarretam essa agressividade no seio de muitos lares. Convém não desprezar
o efeito do alcoolismo e do consumo de drogas. No entanto, o problema de fundo
está na perda do respeito entre os cônjuges e, por consequência, deles em
relação aos filhos e vice-versa.
O relacionamento conjugal tem
suas fases próprias que convém serem seguidas e respeitadas, sob pena de se
desvirtuar tão gravemente em sua essência, que não se pode prever ou evitar as
consequências.
A primeira fase do amor conjugal
é a mera atração. O homem pode contemplar uma mulher e ela a ele e sentirem que
algo atrai. Essa pode ser passageira ou não. Se a ela se seguir um
relacionamento, no qual surge o conhecimento mútuo, desse pode brotar algo um
pouco mais profundo que é o sentimento, a afetividade. Essa é como que a
segunda fase.
Mas o amor não é apenas sentimento.
Há um momento em que surge um desejo de entrega, de compartilhar as suas vidas.
E então, além da afetividade, que não precisa ser perdida ou superada, faz-se
necessário o comprometimento da vontade. Do contrário, cada qual se colocaria
diante da terrível situação de se doar a outra pessoa que, a qualquer momento,
pode simplesmente rejeitá-la, talvez dizendo que “acabou o amor”. Precisamente
por isso é necessário que se chegue à terceira fase, que é o compromisso selado
publicamente. Por meio desse cada um se compromete a compartilhar a sua vida
com o outro.
Lamentavelmente, porém, tem se
perdido a noção do que é o amor conjugal em sua essência. E frequentemente as
relações são mantidas por interesse. Com isso, busca-se o outro não pelo outro,
mas apenas na medida em que possa proporcionar uma satisfação pessoal. E as
reações são muito diversas quando não se encontra no cônjuge ou no companheiro
essa disposição à satisfação das próprias necessidades.
Talvez possamos entender melhor a
situação se a compararmos com um rio. Enquanto ele segue por entre suas
margens, cumpre a sua função e chega ao seu destino. Porém, se o tirarmos do
seu leito, é imprevisível o rumo que tomarão as suas águas. De modo semelhante,
se tirarmos o amor conjugal do seu contexto natural é impossível prever quais
serão as consequências. Pode ser que cresça o número de divórcios e separações.
Pode ser que surjam filhos sem esperança, que não encontrem sentido para as
suas vidas. E pode ainda surgir a violência, quando um se recusa a ser para o
outro mero instrumento de satisfação egoísta... Enfim, não dá para prever.
Nesse cenário, muito mais
importante que editarmos leis que punam os agressores, não seria melhor colocar
o rio no seu leito? Isso não quer dizer retomar padrões familiares de outras
épocas, marcados pela submissão da mulher. O que se há de busca é acima de tudo
o respeito. Respeito à pessoa e ao sentimento do outro. Respeito aos
compromissos livremente assumidos, em especial aquele que seguiu uma fórmula
mais ou menos assim: “e te prometo ser fiel, na alegria e na tristeza, na saúde
e na doença, amando-te e te
respeitando...”
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