segunda-feira, 11 de junho de 2012

Eternos namorados

Era uma manhã chuvosa e fria de junho. Ana Maria deixou a filha na Universidade e aproveitou para passar no supermercado. Enquanto retornava à casa veio à memória o anúncio de um comercial que acabara de ler: “para os eternos namorados...” e seguia a frase que sugeria o consumo de um determinado produto. “Muitas vezes ouvi essa frase”, pensou ela consigo, “mas nunca parei para pensar no seu sentido. O que quer dizer ser namorada de alguém para sempre?”.
Subitamente veio a recordação dos tempos de seu namoro. Naquela época era impressionante o esforço que o José Carlos fazia para estar com ela. Embora fossem da mesma cidade, ele cursava engenharia numa cidade distante. Apesar disso, encontravam-se quase todos os finais de semana. E isso sem contar os longos telefonemas que tiravam seu pai do sério quando chegavam as contas...
Agora estão casados há trinta e cinco anos. O filho mais velho já se casou e aguarda ansioso o primeiro filho. Ela própria anda um pouco insegura sobre como exercer o papel de avó. O filho do meio arrumou um trabalho no exterior e partiu há seis meses. Resta apenas a Rita, a caçula, que se forma no final do ano, de modo que Ana Maria já é assolada pelo medo da síndrome do ninho vazio.
“Mas o que há no namoro que se perde no casamento a ponto de nos desejarem, com certa nostalgia, que sejamos eternamente namorados?”, voltou ela às suas considerações. “Será o casamento uma espécie de veneno que mata o amor a ponto de nos desejarem a todo instante que sejamos apenas ... namorados?”.
Vez por outra Ana Maria tinha esses “surtos filosóficos” que a move a buscar os porquês das coisas. Dessa vez o tema é mais intrigante, pois toca diretamente em suas escolhas e decisões. E eis que vem, então, aquela cruel indagação: “sou feliz no meu casamento?”.
“É claro que sou”, respondeu ela sem hesitar. E, com o sentido prático que lhe é peculiar, passou a ponderar as vantagens do namoro e do casamento. “De fato, na época do namoro ele era mais gentil, interessava-se mais por mim, esforçava-se por dizer coisas que me agradavam, reparava de verdade em mim e frequentemente me dizia que estava bonita”.
“Depois que nos casamos”, prosseguiu ela em suas comparações, “de certo modo entrou a rotina em nossas vidas. O nosso amor passou por muitas provas. Os nossos filhos nos uniram, mas também trouxeram dificuldades na educação, que por vezes acentuaram nossas divergências. Também tivemos os problemas profissionais, as dificuldades econômicas... Mas há, também, uma vantagem na minha vida de agora. Quando namorávamos, considerava que o nosso relacionamento poderia se romper a qualquer momento. Mas se há uma coisa que aprendi a admirar nele é que é um homem suficientemente honesto para honrar os compromissos que assume, de modo que nós nunca tivermos a menor dúvida de que uníamos nossas vidas para sempre”.
Como resultado dessas elucubrações matinais, Ana Maria pensa ter encontrado a causa do insucesso de muitos relacionamentos: “Por um lado, não se pensa em agradar o outro, mas apenas que o outro seja instrumento de prazer para si. E, por outro lado, perde-se o sentido de compromisso que é fundamental nessa relação. É verdadeiramente possível manter, após o casamento, a parte boa do namoro que é a alegria de compartilhar as vidas, o afã de se sacrificar pelo outro. Mas há que se acrescentar outro ingrediente que é o compromisso. Assim, não se trata de uma relação edificada na instabilidade de um sentimento, mas na fortaleza de uma vontade que sabe amar e querer amar cada dia mais e melhor”.

Mal terminava essas considerações, tocou a campainha da casa. Era um entregador que trazia um exuberante e belo buquê de rosas. Ainda que não fosse muito emotiva, não conseguiu conter as lágrimas ao ler o cartão: “EU, JOSÉ CARLOS, TE RECEBO ANA MARIA, COMO MINHA ESPOSA, E TE PROMETO SER FIEL, NA ALEGRIA E NA TRISTEZA, NA SAÚDE E NA DOENÇA, AMANDO-TE E TE RESPEITANDO POR TODOS OS DIAS DA MINHA VIDA. Eu te amo 350 vezes mais do que te amava há 35 anos, quando proferi essas palavras! Feliz dia dos namorados! José Carlos”.

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