segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Uma Morte Anunciada

Faleceu no dia 1º de novembro a jovem americana de 29 anos, Brittany Maynard, que decidiu pôr fim
à própria vida, após ser diagnosticada com um câncer incurável. Ela cometeu o “suicídio assistido” precisamente no dia que havia programado: 1º de novembro.

Ao analisarmos esse caso dramático, talvez a primeira e principal reação nossa devesse ser a compaixão. A morte é sempre um momento terrível para qualquer ser humano. Mesmo para as mulheres e homens mais fortemente convencidos da imortalidade da alma, essa passagem muitas vezes se apresenta envolta em medo, quiçá saudável, dado o natural instinto de sobrevivência. E se o fim da existência terrena é sempre um acontecimento difícil, ele se apresenta ainda mais cruel e doloroso quando se sabe que faltam poucos dias e que esses serão fortemente marcados pela dor e pelo sofrimento.
Assim, também por esse motivo, não deveríamos jamais julgar a pessoa ou a vida dessa jovem. No entanto, penso que a sua opção em si deve ser analisada, meditada e, a partir dessa análise e ponderação, tirarmos bons propósitos.

Penso que o modo como encaramos a morte é, no mais das vezes, consequência direta daquilo que dá sentido à nossa vida. Cada ser humano já nasce como um ser único e inigualável. Além disso, as escolhas, as decisões e as circunstâncias de cada um irão influenciar diretamente no modo de ser de cada pessoa. Mas apesar dessas peculiaridades individuais, poderíamos traçar dois modos distintos de encarar essa existência, que irão nos ajudar a entender como cada qual enxerga o próprio fim.

Lembro-me de quando estava na Universidade, em meio a festas, diversões noturnas e ambientes badalados, por vezes poderia aflorar um certo remorso por se estar prejudicando a saúde com tanta bebedeira, noites mal dormidas etc. Então eis que alguém aplacava esse sentimento agourento com uma frase lapidar: “é melhor dez anos a mil do que mil anos a dez”. Com isso se pretendia dizer que é melhor viver menos, mas intensamente, do que ter longos anos de uma vida sonsa e sem graça.

Acontece que por detrás daquela frase, admitimos que deveras convincente, esconde-se uma opção de vida que se traduz no que hoje poderíamos chamar de “curtir a vida” o mais que se puder. Segundo essa concepção, o que dá sentido à existência é precisamente aproveitar as “boas” coisas do mundo: viagem, festas, hapy hour, sexo sem compromisso etc.

Quando se assenta nisso a razão mais profunda que dá sentido à existência, a morte será simplesmente e nada mais que uma terrível tragédia. Trata-se do acontecimento mais detestável e odioso que acabará impiedosamente com todas as “coisas boas da vida”. E quando o fim se apresenta próximo e, o que é pior, acompanhado de um sofrimento inevitável, o mais coerente e o melhor, para os que pensam assim, será simplesmente não viver. Com efeito, se nesses dias não mais se poderá desfrutar dos prazeres que tanto atraíam, que razão haverá para viver?

Mas há, como dizíamos, um outro modo bem distinto de encarar a vida. É o daqueles que veem a existência como uma oportunidade imperdível de semear paz e alegria ao seu redor. Não recusam, no mais das vezes, as coisas boas e prazerosas. No entanto, nada disso é para elas ou para eles um fim absoluto. O que verdadeiramente importa e as move é o bem que são chamados a semear na família, na sociedade e em todos os ambientes em que vivem.

Esses não verão a morte como uma tragédia. Também sabem viver “a mil por hora”, mas serenos, felizes. Até o último suspiro haverá uma semente benfazeja a ser semeada, de cujos frutos desfrutarão a humanidade, então um pouco melhor, mais iluminada por aquela luz que um dia brilhou e que o túmulo não consegue apagar. Ao contrário, brilhará em todos corações que um dia foram por ela tocados. E esses, se forem generosos, também encontrarão um motivo para o seu caminhar. E então seguirão alegres, como que a cantarolar: “é a vida, é bonita, é bonita e é bonita..!”.

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