segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Família é só afeto?


Tem-se sustentado que o conceito de família deve ser reformulado. Segundo uma nova concepção, o fundamento dessa instituição passa a ser o afeto que se estabelece entre os seus membros, e não mais o matrimônio ou qualquer outra forma de compromisso.
Isso tem chegado aos Tribunais, com decisões que reconhecem esses novos modelos. É o caso, por exemplo, de um jovem que teve dois pais e uma mãe em seu registro, sob o argumento de que mantinha laços afetivos tanto com o pai biológico, como com o padrasto, com quem convivia. É o que aconteceu, também, com um recém-nascido que foi registrado com o nome das duas mães – que formam um casal homoafetivo – e do pai biológico, que é amigo das duas mulheres.
É inegável que as relações familiares são marcadas por uma intensa afetividade. No entanto, será o afeto o único fundamento que sustenta a família?
Por afeto se tem entendido uma atração ou, mais ainda, um sentimento que se estabelece espontaneamente entre pessoas. E ele é mesmo fundamental numa relação familiar. Tanto que serve como elemento diferenciador entre uma mera coabitação (como se dá num pensionato, por exemplo) e uma família, onde há de reinar uma convivência íntima e amorosa, que leva cada um a se preocupar com os demais.
Acontece que o afeto, como sentimento que é, se não for bem alimentado, pode ser algo que surge e desaparece com a mesma fugacidade da fragrância de um perfume de alguém que passa ao nosso lado.
A família e o matrimônio experimentaram uma notável transformação nos últimos séculos, sobretudo no ocidente. Houve uma fase histórica em que o casamento era considerado fundamentalmente como um compromisso, abstraindo-se quase por completo a afetividade, sequer como causa do pacto que seria selado entre os cônjuges. São desse tempo os casamentos forjados por interesses políticos, econômicos etc.
Dessa concepção se evoluiu – ao nosso ver muito bem – para o casamento decorrente da livre decisão do casal, fundada no mais das vezes no surgimento de uma intensa afetividade. Mas esse sentimento não excluiu nem dispensou, ao menos num primeiro momento, o compromisso (pacto conjugal).
Modernamente, porém, pretende-se simplesmente abolir o compromisso, de modo a fincar os laços familiares exclusivamente sobre a afetividade.
Acontece que os seres humanos possuem necessidades que precisam ser abrigadas sob vínculos mais sólidos. Um bebê recém-nascido, se comparado com os animais, inclusive mamíferos, é o mais dependente dos seus genitores. E essa dependência não é apenas material. A sua formação moral e intelectual irá demandar décadas – talvez toda uma vida – até que atinja a sua plenitude. E para isso, pai e mãe desempenham um inegável protagonismo.
Pois bem. Como conciliar essas duradouras necessidades de formação da prole com uma volúvel entidade familiar, apta a se fazer e desfazer, quebrar-se e recompor-se ao fugaz sabor de uma afetividade sempre espontânea?
E tais necessidades materiais, afetivas, psicológicas e intelectuais não se limitam aos filhos. Não é difícil imaginar que um idoso, inválido numa cama, talvez não desperte grandes sentimentos de atração. Quem daria, então, o indispensável carinho e atenção a tais pessoas num contexto familiar que se faz e desfaz a cada instante?
Diante disso, quando são propostos novos modelos de família, fundadas exclusivamente no afeto, penso que uma questão fundamental que precisa ser respondida é: como manter a alimentar esses laços afetivos?
Quando duas pessoas que se amam decidem se casar, no fundo, estão – ou deveriam estar – dando um passo a mais numa relação já fortemente marcada pela afetividade. Em sua essência, o pacto conjugal é o compromisso livremente assumido de querer amar o outro cada dia mais.

Portanto, a vontade e o compromisso não são incompatíveis com a afetividade. O desejo sincero de querer amar o outro cada dia mais fomenta e promove o sentimento. A felicidade na família será, nesse contexto, o resultado de uma vida de entrega, muitas vezes sacrificada, mas precisamente por isso edificadora de um amor forte e perene.

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