domingo, 19 de fevereiro de 2017

A culpa é do vento

Outro dia presenciei uma conversa de uma mãe com a filha, de apenas 2 anos, que merece ser contada. A criança assistia a um filme num smartphone e, num dado momento, disse:
- Mãe, bugô!

“Onde ela já aprendeu essa gíria?” pensou a mãe. Não conteve o riso e logo colocou o filme novamente. A criança, porém, segurava o equipamento toda desajeitada e, de quando em quando, tocava na tela, o que fazia o vídeo parar. Depois de três ou quatro interrupções, disse a mãe já quase sem paciência:
- Filha, não “bugou” nada. Foi você que pausou o vídeo.
- Não fui eu não, foi o vento! – respondeu a filha imediatamente.
A resposta foi motivo de uma grande gargalhada: a culpa é do vento! Mas, afora o aspecto engraçado da fala de uma criança de tão tenra idade, é impressionante notar a dificuldade que temos de assumir os nossos erros. E, por outro lado, como é fácil atribuir aos outros a responsabilidade pelas nossas ações: “A culpa é minha, então eu a coloco em quem eu quiser”, costuma-se dizer em tom jocoso.

Parece que essa tendência de não reconhecer o erro, colocando-o nos outros, nas circunstâncias ou na sociedade é algo universal e um tanto arraigado no ser humano. Daí não se pode concluir, porém, que nada pode ser feito exceto reconhecer essa fraqueza. Bem ao contrário, a luta para se crescer nas virtudes deve ser uma finalidade primordial a ser buscada por todo educador sério e consciente da sua missão.
É, portanto, um grande desafio formar os nossos filhos e alunos para assumir a responsabilidade pelos seus atos. Isso implica uma análise reflexiva constante sobre as próprias ações, escolhas e decisões, de modo a aferir o acerto delas, sabendo reconhecer, quando necessário, que se agiu mal. Esse esforço constante é que aprimora o ser humano para crescer cada vez mais, construindo um projeto de vida sobre bases sólidas e seguras.
Saber reconhecer o erro e assumir a responsabilidade pelas próprias ações e omissões não significa, porém, que devamos propagar aos quatro ventos a nossa culpa. Apenas a título de exemplo, uma pessoa que tenha praticado alguma conduta ilícita não está obrigada – nem jurídica, nem moralmente – a comparecer a uma Delegacia de Polícia e lavrar um boletim de ocorrência contra si própria. Mas será necessário, sempre, assumir interiormente a responsabilidade por tais condutas e, na medida do possível, reparar as consequências que elas possam ter causado.
Mas se essa dificuldade em assumir a responsabilidade é de certo modo universal, na cultura materialista e hedonista em que vivemos esse fenômeno assume contornos ainda mais dramáticos. Com muita frequência se atribui ao médico a culpa por uma doença ou uma dor que não conseguimos superar. Não raras vezes pensamos que são o vizinho, a esposa ou os filhos os culpados pela nossa infelicidade. Também é comum dizermos que o motorista do outro veículo é o responsável pelo nosso atraso ou pelo nosso mau humor.
Nesse contexto, é ainda mais desafiador ensinar e aprender a reconhecer o que cabe a nós mesmos nesses acontecimentos indesejados. É necessário saber aceitar a doença, a dor ou o sofrimento quando os nossos esforços para obter a cura ou para atenuar os seus efeitos não surtem os efeitos que gostaríamos.
Há poucos dias recebi um e-mail de uma pessoa a quem havia encomendado um serviço. Preservada a identidade do remetente, merece ser transcrito: “Bom dia! Gostaria de me desculpar, pois ontem entrei em contato com (...) para obter informações sobre o seu pedido, mas, para minha surpresa, ela não havia recebido a documentação, pois enviei para um e-mail errado. Já corrigi isso e enviei para o e-mail correto”. Penso que se trata de uma pessoa muito responsável. Com essa atitude simples e educada soube assumir o erro e tomou todas as providências que lhe cabiam para atenuar as suas consequências. Que não falte aos nossos educadores essa simplicidade e essa responsabilidade.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Ensinando a Solucionar os Conflitos

No nosso último artigo falamos sobre as brigas dos filhos. O tema comporta diversos aspectos a serem considerados. Dentre eles, há um especialmente relevante, com sérios reflexos na vida familiar e social. Trata-se da capacidade de resolverem por si mesmos os conflitos que surgem nos relacionamentos humanos.