domingo, 31 de março de 2019

Intrigas digitais

Dentre as inúmeras transformações que o WhatsApp – e outros aplicativos das chamadas redes sociais – trouxe às nossas vidas, está a possibilidade de se criarem grupos de pessoas, segundo os mais variados critérios e centros de interesses, onde se compartilham fatos, experiências, opiniões, curiosidades etc.
Essa novidade, sem o risco de incorrermos em exagero, pode ser qualificada com uma verdadeira revolução, dado o impacto que trouxe para a vida das pessoas, da sociedade e do próprio Estado. Prova disso está, por exemplo, na mudança significativa nas campanhas eleitorais. Com efeito, quem viveu no tempo em que a divulgação dos candidatos se dava com a afixação de panfletos nos postes de iluminação, ao observar o que ocorre nas últimas eleições, aqui e no mundo, verá que a mudança foi radical.
Como quase toda mudança, há aspectos positivos e negativos. A velocidade com que se difunde a informação pode ser muito interessante e trazer inúmeros benefícios. Porém, com a mesma rapidez também se difunde a mentira, agora intitulada como Fake News, a calúnia, a maledicência e, também – e que nos interessa mais diretamente agora – a discórdia.
Quando pessoas se unem segundo certos critérios, por exemplo, moradores de um condomínio, colegas de trabalho, torcedores de um time de futebol, adeptos de certa ideologia etc., em geral, buscam coisas que edifiquem a todos, tais como compartilhar conhecimentos, interesses, ou mesmo a luta por certas questões. Porém, com grande frequência, aquilo que reuniu pessoas movidas por interesses comuns, resvala para a crítica aos que pensam ou agem diferentemente, ou possuem crenças, posições ou opiniões divergentes. Em suma, um grupo que era para algo se transforma em um grupo contra algo, contra pessoas ou contra outros grupos.
Esse fenômeno, em sua essência, não é uma exclusividade dos tempos atuais. A natureza social do ser humano sempre fez com que pessoas se reunissem para as mais diversas finalidades. Por consequência, as associações existem há séculos. E nelas, com grande frequência, uma reunião que seria para buscar algo se deturpa para atacar pessoas por motivos de raça, religião etc. Aliás, muitas entidades secretas já nasciam com um propósito de lutar contra outros grupos pelos mais diversos motivos.
Mas o que há de novidade na situação atual é a velocidade com que as coisas acontecem. Assim, aquilo que no passado exigia reflexão, tenacidade e perseverança para se concretizar, hoje acontece em segundos. Com isso, atitudes impensadas têm consequências desastrosas e, muitas vezes, irreversíveis. Uma informação distorcida ou falsa se alastra rapidamente, de modo que é quase impossível contê-la ou mesmo atenuar as suas consequências nefastas.
Nesse contexto, uma qualidade fundamental da mulher e do homem do nosso tempo é – ou deveria ser – a prudência. Essa, ao contrário do que muitos pensam, não é a marca da pessoa indecisa, quase sempre inativa, que deixa de agir por medo de errar. Prudente é a pessoa que sabe em cada situação procurar o verdadeiro bem e escolher os meios adequados para alcançá-lo. Diz-se dela que é “auriga virtutum” a condutora das virtudes, pois orienta a tudo o mais, dando a cada situação o seu peso e a sua medida.
Convém, portanto, refletir acerca das consequências que pode trazer um simples toque numa tecla “enviar”, ou “send” (ou o seu símbolo equivalente). Com efeito, tal como o gatilho de uma arma que se trazia na cintura décadas ou séculos atrás, o seu acionamento pode ter efeitos terríveis na vida das pessoas ou das instituições. De igual modo, é obrigação grave de todo educador, em especial os pais e professores, formar o sentido de responsabilidade nos jovens, que cada vez mais andam armados por todos os lados, portando esse equipamento de elevado poder lesivo chamado smartphone.

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