Faleceu na última terça-feira, dia 1º de setembro, o
ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Alberto Menezes Direito.
Penso que na vida desse grande homem podemos tirar bons exemplos a serem
seguidos pelos juízes e também por todos os cidadãos que buscam sinceramente o
bem e a verdade em suas vidas.
Nas notícias que permearam a sua morte, Menezes
Direito foi tido como austero, pois “fazia questão que o interlocutor seguisse
à risca etiquetas e costumes da toga, paletó corretamente abotoado, inclusive”.
Mas será que há algo de incorreto em trajar-se de forma adequada para cada
circunstância? Alguém gostaria de participar de uma audiência em que o juiz
estivesse de bermudão de praia, camiseta e chinelo de dedo?
Penso que a vestimenta característica de cada
profissão não pode implicar uma espécie de estratificação que leva alguém a se
considerar superior ao outro. Com efeito, debaixo da toga de um magistrado, da
batina de um sacerdote ou do capacete de um operário, há pessoas absolutamente
iguais quanto à dignidade que emana da condição de pessoa humana. Tanto menos
pode isso servir de argumento a eternizar a impiedosa concentração de renda e a
injusta diferença de remuneração entre as várias profissões, o que muito
envergonha a nossa sociedade. Mas o fato de todos serem iguais em dignidade e
merecedores de uma justa remuneração pelo seu trabalho não impede que cada qual
se porte e aja de forma coerente com a missão que lhe cabe na sociedade.
Quando foi sabatinado no Senado Federal, a quem cabe
aprovar a indicação do Presidente da República para o cargo de Ministro do
Supremo Tribunal Federal, Menezes Direito já nos deixou uma importante lição
que merece ser meditada. Indagada a sua posição em relação a tópicos em que
direito e religião poderiam entrar em confronto, como, por exemplo, o aborto e
o uso de células-tronco embrionárias em pesquisas, ele respondeu: “Um juiz não
discute sua fé no cumprimento da lei. Quero reafirmar que sou
intransigentemente um defensor da vida, acompanhando a minha fé católica, mas,
como juiz, jamais deixarei de cumprir uma lei que o Parlamento do meu país
editar”.
Por certo, como grande homem que era, sabia que sua
atuação na Suprema Corte não colocaria em confronto a sua consciência com o
cumprimento da Constituição Federal. Afinal, ele jurava cumprir uma norma em
cujos princípios fundamentais está em posição de destaque o direito à vida
(artigo 5º). Deixa claro também em sua manifestação que não há
incompatibilidade entre a fé e o exercício de um cargo público num Estado
laico. Tampouco é necessário que o magistrado, o parlamentar ou outro
profissional qualquer deixe suas convicções de lado ao exercer sua profissão,
numa espécie de vida dupla, que os leva a abandonar a sua fé do lado de fora da
repartição onde trabalha, tal como antigamente se dependuravam junto à porta de
entrada os chapéus.
Bem ao contrário, um juiz que é católico, ou
protestante, ou adepto de outra religião, o será vinte e quatro horas por dia.
O que não o autoriza a substituir a Constituição e as leis pela Bíblia no ato
de decidir. Mas é evidente que suas convicções influem na forma com que
interpretam a lei e julgam os casos, assim como o ateu e o agnóstico são
fortemente influenciados pelas suas. Aliás, penso que também esses não estão
autorizados a substituir a Constituição ou as leis por teorias de Karl Marx ou Richard
Dawkins no ato de julgar.
Uma frase do Ministro se tornou célebre por ocasião
da votação do caso das pesquisas com as células-tronco embrionárias: “Se pelo
bem praticamos o mal, se para salvar uma vida tiramos outra, sem salvação
ficará o homem”. Penso que esse é o maior legado que o Ministro da nossa Corte
Suprema nos deixou. Que o Presidente Lula, que o indicou para o cargo, saiba
escolher outro jurista que esteja à altura da grande perda que a sua morte
representa para a nossa Justiça.
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