Na edição de 17 de dezembro último, o Correio Popular trouxe uma reportagem
intitulada “Separações judiciais disparam na RMC”. A matéria vem embasada em
dados estatísticos fornecidos pelo IBGE, onde se constata que, em 2004, treze
casais por dia puseram fim ao casamento na Região Metropolitana da Campinas.
Os números, ainda que alarmantes, não me
surpreenderam. Por quase cinco anos trabalhei em uma vara judicial que possuía
competência para questões de família, e raros eram os dias em que não se fazia
nenhuma separação ou divórcio. O que não aparece nas estatísticas, porém, são a
dor e a mágoa que esses casais traziam consigno naquele momento extremamente difícil
para eles.
Com a experiência desses anos, posso afirmar
que se contam nos dedos de uma mão os casais que se apresentavam alegres no
momento em que afirmavam o propósito de se separarem. E, mesmo dentre esses que
se diziam “felizes”, o que se notava era mais um alívio por romper uma situação
indesejável que propriamente felicidade.
Quando indagava aos casais sobre os motivos da
separação, ou mesmo se estavam convictos disso, não raro um deles se
desmanchava em lágrimas, permeadas da frustração por não se ter conseguido
levar adiante o que, no dizer deles mesmos, se propunha ser para sempre. Isso
sem contar o que se passa com os filhos. “Se me rasgassem ao meio teria doído
menos” – confidenciou um deles durante a instrução de um processo.
Se as separações têm causado tanto mal aos
casais, aos filhos, às famílias, e, por conseqüência, à sociedade, não seria
hora de se fazer algo por isso? Seria correto ver nesses números uma tendência
natural dos tempos modernos, com relação ao que nada se pode fazer para conter?
Haveria um remédio capaz de curar essa doença social ou os casais devem
continuar contando exclusivamente com a sorte?
Certa vez, na saída de uma celebração de suas
bodas de ouro, o marido foi indagado sobre o segredo de um casamento longo e
feliz. O interlocutor e os demais esperavam respostas do tipo “o segredo é o
amor” ou “é achar o par ideal”. Contudo, muito seguro de si, respondeu ele: “o
segredo é a educação”. E depois explicou que com isso queria dizer que cada um
há de tratar o outro com respeito.
E mais que com palavras, eles eram um exemplo
vivo de que o trato respeitoso e afável é imprescindível para se viver juntos
com harmonia, tanto que, passados os anos, eles ainda mantinham o hábito de
andar de mãos dadas, ele de cuidar em que ela entrasse em sua frente, ela, por
seu sua vez, cuidava de que os trajes dele estivessem sempre em ordem, que
tomasse os remédios na hora certa, em suma, em seus dias, os exemplos de
dedicação um ao outro faziam viva a receita que davam para o sucesso no
matrimônio.
Participei há uns anos de um curso feito para
casais, intitulado Expectativas e Realizações
no Casamento. O tema da felicidade no matrimônio foi tratado com grande
competência pelos palestrantes. Um deles, após uma brilhante abordagem sobre o
assunto, concluiu que o que sustenta o matrimônio é a qualidade do tempo que se
passa juntos. Marido e esposa são bem sucedidos quando olham para trás e
contemplam que os momentos alegres e tristes que passaram juntos serviram para
construir a solidez da família.
O diálogo é de importância fundamental. Julian
Marías, filósofo espanhol, falecido na semana passada, em sua obra “La mujer y su sombra” afirma que o amor
consiste muito principalmente em falar e a decadência da conversação afeta-o profundamente.
Casamento não é, como dizem, uma loteria, em
que, por pura sorte, se acerta ou não. Muito mais se assemelha a um
empreendimento no qual o sucesso depende da dedicação dos empreendedores. Há
que se cuidar muito bem de cada momento, com atenção nas pequenas coisas. Tal
como as grandes construções se fazem de pequenos tijolos, um de cada vez, a
felicidade no matrimônio se constrói no dia a dia, um sorriso aqui, umas rosas
de presente ali, uma mesa bem posta para esperar o outro, um abraço forte nas
tribulações, de tal sorte que, quase que sem se notar, o edifício crescerá tão
forte e belo que tempestade nenhuma o poderá derrubar.