segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Ano novo, luta nova!

Na semana passada tive a grata satisfação de visitar a sede da associação Esperança e Vida. Como se sabe, trata-se de uma instituição que, inspirada pelos valores cristãos, tem por missão acolher, recuperar e proporcionar um estilo de vida saudável às pessoas com HIV/Aids e dependentes químicos de drogas e álcool. Enquanto o trabalho ali desenvolvido me era apresentado, o Robertinho, presidente da entidade, perguntou a um de seus filhos o que significou para ele a assistência que recebeu, ao que ele respondeu sem hesitar: “é um retorno para a verdadeira vida”.
Como é bom, como é reconfortante contemplar a felicidade estampada na face das pessoas que trilharam caminhos ruins, mas que resolveram mudar o rumo de suas vidas! Porém, não podemos nos esquecer que a alegria que essas pessoas espalham não é conseqüência exclusiva de uma decisão tomada num determinado instante. Ao contrário, é fruto de uma luta constante, que se renova dia após dia. A felicidade é algo a ser construído a todo instante em nossas vidas. E, como toda obra grande e valiosa, custa esforço e sacrifício. Mas vale a pena. Na verdade, lutar pela verdadeira felicidade é a única coisa que realmente vale a pena em nossas vidas.
Nos próximos dias receberemos muitas saudações de “feliz ano novo!”. Muitos dirão, como se canta na velha cantiga da virada do ano: “adeus ano velho (...), que os sonhos se realizem (...), muito dinheiro no bolso e saúde prá dar e vender”. Dinheiro, saúde, realização dos sonhos são coisas importantes. O grande erro, mais que isso, a causa de grande fracasso em nossa vida, porém, está em colocar exclusivamente nisso a nossa esperança de felicidade. É que a felicidade, assim como a tristeza, está em nosso interior e não nas coisas e acontecimentos exteriores.
A verdadeira alegria não está nisso que as pessoas, com muito boa intenção, nos desejam nos cartões de Natal: dinheiro, realizações, sucesso etc. Uma das cenas mais comoventes que já presenciei ocorreu-me por ocasião da Ceia de Natal do ano passado. Um de meus filhos havia acabado de receber um presente que há muito esperava. Tratava-se de um aviãozinho. Porém, mal o retirou da caixa, a priminha inadvertidamente pisou sobre a asa e o danificou por completo. O filho mais velho, sem hesitar, cedeu o seu presente para o irmão. Com isso, o que havia perdido o presente ficou feliz, mas o que deu o seu para o irmão ficou muitíssimo mais contente ainda. Trata-se de um exemplo muito palpável de que “há mais alegria em dar do que em receber”.
Mas sabemos que essa atitude, da qual brota a verdadeira felicidade, nem sempre é fácil de ser assumida. A nossa tendência é de nos fecharmos em nós mesmos, buscando os nossos desejos, as nossas satisfação, os nossos prazeres. Porém, não podemos esquecer que o nosso coração tem uma porta que abre para fora. Se a quisermos abrir para dentro, quanto mais a forçarmos, tanto mais a manteremos fechada. E dessa atitude egoísta somente brota o rancor, a desconfiança e o ressentimento que nos aprisionam numa triste solidão interior.
Talvez a melhor saudação que possamos fazer aos nossos amigos e familiares nesses dias é que renovem os propósitos de lutar por ser felizes. E, principalmente, que passem a procurar a verdadeira felicidade onde a podem encontrar. E a encontramos em nós mesmos, na luta que travamos, dia após dia, por sermos melhores para servir aos demais.
A felicidade é uma luz que brilha em nossa alma. Ela, por si, não muda as coisas, mas faz com que as enxerguemos com outros olhos. Algo de semelhante ocorre com o sol. Ao nascer, não muda o mundo. Tudo permanece mais ou menos como era durante a escuridão da noite. Porém, a sua luz ilumina todas as coisas, e, ao refletiram a luz do sol, tornam-se mais belas. Assim podemos ser nós: luzes que fazem refletir no mundo a sua beleza e esplendor.

A todos, um feliz ano novo! Ou, se preferirem, um ano novo repleto de felicidade! Para isso, porém, não nos esqueçamos: ano novo, luta nova!

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Gentileza e honestidade

Na edição do penúltimo domingo, dia 14 de dezembro, o Correio Popular trouxe uma matéria verdadeiramente digna de muitos elogios. Com a criatividade e perspicácia que não podem faltar no bom repórter, avaliou-se como reagem as pessoas em situações aparentemente corriqueiras, como devolver um objeto achado, um dinheiro perdido, ou ainda a cortesia que é dispensada aos semelhantes. Acredito que, com essas iniciativas, muito mais que as duras críticas políticas, que também são necessárias, a imprensa contribui para um sólido progresso social, pois com elas se enaltecem os bons exemplos, ao mesmo tempo em que deixam patentes os maus, estimulando as pessoas a serem melhores. E só há efetiva mudança na sociedade se houver antes uma transformação no interior dos indivíduos que a compõem.
Não podemos ignorar que nossos atos nunca estão isolados. Nenhuma de nossas ações é absolutamente indiferente aos nossos semelhantes. Ao contrário, mesmo nas atividades mais normais e corriqueiras podemos tornar pior ou melhor o mundo que nos cerca.
Por exemplo, o cobrador de ônibus que fica cochilando o tempo todo e, nos breves despertar de seu trabalho mal feito, responde com aspereza às pessoas, de certo modo, atinge negativamente aos que estão ao seu redor e precisam de seu serviço. O professor que não prepara com esmero sua aula ou o trabalhador que não se dedica com afinco ao seu trabalho não prejudicam apenas a si próprios, mas a todos que necessitam de seus serviços e também a todos os que os cercam.
Mas os atos bons também são difusivos. A cozinheira que, além de dar o melhor de si na preparação dos alimentos, ainda se excede em fazê-lo mais bonito e atraente, de certa forma, está recheando de alegria a todos os que serão servidos. E, mais ainda, um trabalho bem feito, realizado com dedicação e alegria estimula aos demais a imitar. Um ato bom é como uma pedra atirada num lago. Provoca ao ser redor uma onda, e depois outra, e mais outra, até que todo o lago esteja tomado. O mesmo efeito produz os atos bons que, com esforço e por amor, realizamos em nossas vidas.
Estamos há poucos dias do Natal. Nesse tempo é natural que reflitamos um pouco mais profundamente sobre nossas vidas. Reflitamos, pois, sobre como e em que temos dedicado o nosso tempo, que é, depois da própria vida, um dos maiores tesouros que possuímos. Será que somos verdadeiramente felizes?
E, ao nos depararmos com essa pergunta, por demais comprometedora, talvez nos aventuremos a responder que não, ou que não somos tão felizes como gostaríamos. E, em seguida, vêm as razões (sem razão) que inventamos para a ausência de felicidade: é que ainda não consegui a minha casa; é que a crise ameaça o meu emprego; é que o meu vizinho, o meu chefe, a minha esposa, o meu marido... É que... E, com essas desculpas, queremos abafar um vazio interior. No fundo são as nossas opções e, por conseqüência, as nossas ações que nos realizam, e, portanto, nos fazem felizes ou infelizes.
O Natal, mais que uma simples recordação é um reviver, um reavivar em nossas vidas e mentes um acontecimento, ao mesmo tempo, simples e profundo. É, sem dúvida, um fato que ocorreu num determinado momento da história. Porém, mais que isso, no Natal se celebra a vinda de um perfeito exemplo a ser imitado e, nessa imitação, encontrarmos as respostas aos nossos anseios mais profundos.

Com efeito, há um modelo a ser seguido. Em cada situação de nossas vidas, poderíamos nos perguntar: como teria agido aquele Menino nessa situação? E de uma resposta e ação coerente com isso é que se constrói a felicidade pessoal e, mais ainda, se contribui para um verdadeiro progresso social.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Competência, otimismo e alegria

Em recente pronunciamento o Presidente Lula afirmou que a crise se vence com competência, otimismo e alegria. Confesso que não ouvi toda a mensagem, mas penso que esses ingredientes sugeridos são imprescindíveis não apenas para se enfrentar os momentos difíceis como para tudo em nossas vidas.
Competência. Como é importante que cada um dê o máximo de si em seu trabalho! Mais que isso, competência não é apenas questão boa vontade. Cada um em sua profissão deve se esmerar por aprimorar cada vez mais. Trata-se de estudar, formar-se, aprender as novas técnicas e novos conceitos que são necessários, seja qual for o ofício de cada um.
Talvez um grande equívoco que nós, brasileiros, caímos com muita freqüência seja pensar que os dias melhores por que tanto esperamos depende apenas da competência dos governantes. De fato, há muito que eles podem fazer para obtermos melhores condições de vida. Mas há muito mais que depende de cada um de nós. A pintura de uma casa ficará bem feita se o pintor se empenhar em cumprir com esmero o seu trabalho. A sentença será justa se o Juiz se esforçar por colher bem as provas, estudar o caso e ponderar na solução mais justa. O paciente será bem cuidado se o médico for bem formado e prudente. A empresa andará bem se o empresário for competente, mas também o sucesso do empreendimento depende muito do trabalhador em cumprir o seu papel. E, desses trabalhadores todos, qual é o mais importante? Penso que todos, cada um no seu lugar.
Todos deveríamos nos questionar, antes de nos lançarmos a fazer qualquer tarefa de nosso dia-a-dia com a seguinte pergunta: por que estou fazendo isso? É que a resposta a isso irá nortear quais serão nossas atitudes. Se faço apenas para ganhar dinheiro, a atenção a quem depende de nossos serviços, o esmero por fazê-lo bem feito, enfim, a qualidade de nosso trabalho somente será importante na medida em nos possa fazer ganhar mais dinheiro. Se, ao contrário, o principal objetivo for servir aos demais, o reconhecimento profissional e, com ele, o sucesso econômico virão como conseqüência natural. E não nos faltará o otimismo quando passarmos por momentos difíceis, pois trabalhamos por objetivos mais transcendentes.
E, nesse ponto, chegamos ao segundo ingrediente: otimismo. Não se trata de fechar os olhos para a realidade, ou mesmo sonhar com um “mar de rosas”. Mas mesmo diante de cenários sombrios, é possível acreditar que, aconteça o que acontecer, seremos felizes desempenhando com valentia e determinação o trabalho que nos cabe, ou que nos é possível.
Alegria. Que ingrediente fantástico para se colocar nessa receita! Como fazem falta pessoas alegres ao nosso lado! Ao contrário, como é pesado o ambiente que se forma ao redor de um carrancudo e mal-humorado. E é curioso notar que, ao contrário do que muitos de nós pensamos, a alegria não depende de fatores externos, como o tempo, o trânsito, e mesmo o humor da esposa ou do marido. No fundo, a alegria depende da paz de consciência, depende de que tenhamos muito claro para nós mesmos o motivo pelo qual acordamos, trabalhamos, descansamos e voltamos a trabalhar, qual seja, que o fazemos para servir aos demais. E quanta alegria há em servir!
Agora que o Natal se aproxima, a contemplação do Presépio é como que um exemplo vivo de tudo isso. O cenário não era muito animador para José, que fazia as vezes de pai do Menino. Teve de deixar a sua cidade, Nazaré, e partir para Belém, para cumprir uma ordem do imperador romano. Como cidadão honrado que era, cumpriu o seu dever. A viagem era penosa e, sobre um jumentinho, trazia a esposa grávida, com o parto iminente. Ao chegar ao destino, ninguém os recebeu em sua casa, por mais que ele se esforçasse.

Mas eles não se abatem. No estábulo tudo é ajeitado com muita competência, ainda que lhes faltasse quase tudo. O Menino nasce entre animais, mas desde o primeiro momento é fonte de um otimismo fantástico que faz os pastores e os magos se rejubilarem de alegria. E, por falar em alegria, essa é a palavra que melhor define aquele cenário absolutamente simples. Eles não temiam a crise do império romano, nem a sorte de seu País, nem mesmo o tirano Herodes. Havia quem os guiasse com muita competência. E essa segurança é fonte de um forte otimismo e de uma perene alegria.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Lições de solidariedade

A recente tragédia das enchentes em Santa Catarina sensibilizou o País. Ao contemplar aquele cenário desolador cada um reage de uma forma diferente. É que a nossa casa, de uma forma ou de outra, é o abrigo onde nos sentimos protegidos. E  quando vemos aquilo que foi o lar de alguém, inundado até o telhado, leva-nos a pensar como se sentem aquelas pessoas que, da noite para o dia, viram tudo o que possuíam indo literalmente por água abaixo.
Mas embora as reações das pessoas diante da catástrofe sejam muito pessoais, e cada um a enxergue sob seu ponto de vista, as pessoas pendem, ora mais ora menos, em dois sentidos opostos: uns arregaçam as mangas e lançam-se em campanhas humanitárias de ajuda aos desabrigados; outros, com ares de “senhor da verdade” e sem a disposição de mover uma palha para aliviar o sofrimento dos semelhantes, se limitam a proferir duras críticas aos “governantes irresponsáveis” que nada fizeram para evitar a tragédia.
Na verdade essa segunda postura é tão antiga quanto a própria humanidade. Em sua raiz está o egoísmo que se manifesta em pensar que não temos nada que ver com o sofrimento dos demais. E para aliviar, ou melhor, para fugir da própria consciência, empenha-se em atribuir a culpa aos outros. Mas embora essa postura não seja uma exclusividade dos tempos modernos, atualmente ela tem assumido uma característica muito peculiar. É que a ciência evoluiu muito. A medicina, a engenharia, a informática alcançaram níveis de desenvolvimento fantásticos. Com isso, as pessoas passam a buscar a sua segurança exclusivamente na tecnologia e espera-se que ela venha a afastar por completo de nossas vidas a dor e o sofrimento.
De fato, o avanço tecnológico é muito bom. Seria um terrível engano considerar a tecnologia como algo intrinsecamente ruim. E esses conhecimentos podem e devem ser utilizados para melhorar a qualidade de vida das pessoas. As novas técnicas de engenharia devem ser utilizadas para evitar as enchentes. Nesse sentido, não há nada de errado em se taxar de irresponsáveis os governantes que, sabendo do problema, nada fizeram para o evitar.
Mas, por mais que a ciência avance, ela não conseguirá jamais afastar por completo da humanidade a dor e o sofrimento. Assim, quando as tragédias surgem, é bom que serenamente se pense em suas causas e o que se pode fazer para evitar que  repita. Porém, mais importante ainda, é levar alento (e muito alimento) àqueles que sofrem hoje e agora as suas conseqüências.
Além disso, mesmo quando se vive na “plena segurança” que a tecnologia proporciona, ainda assim, muitos estarão sedentos de algo que os equipamentos não podem proporcionar. Por exemplo, um doente poderá estar num hospital com o seu quadro estável e sem risco graças aos equipamentos e técnicas que a medicina lhe proporciona. Porém, nada disso substitui o carinho e o afeto dos parentes e amigos.
Penso que devemos cada vez mais nos empenhar para que a ciência evolua a serviço da vida. Que as construções sejam seguras. Que se façam as obras para evitar as enchentes. Que não haja favelas e que não falte alimento a todos. Mas, além disso, muitos homens e mulheres de nosso tempo vivem com a aparente segurança de alguns bens, mas inseguros sobre assuntos mais transcendentes e, exatamente por isso, infelizes. Muitos vivem em locais que jamais será inundado pelas águas do verão, mas também vivem sedentos de um pouco de atenção. Enfim, muitos vivem em casas bem edificadas e abastecidas, porém, com a alma vazia daquilo que verdadeiramente importa para serem felizes.

É maravilhoso contemplar quantas pessoas se engajaram em arrecadar e transportar alimentos aos nossos irmãos de Santa Catarina. Nesse momento em que também nós, brasileiros, podemos nos orgulhar de desfrutarmos dos avanços da tecnologia, com essa atitude valente, mostramos ao mundo e a nós mesmos que o fantástico progresso da ciência que vivenciamos tem por fundamento e está a serviço da vida. Dessa vida que hoje se vive permeada de celulares, laptops, TV digital, mas que não pode prescindir jamais de um colo aconchegante para chorar uma dor ou de braços bem abertos para festejar um amor.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Trabalhar: até quando?

O Correio Popular do penúltimo domingo, dia 23 de novembro, trouxe uma matéria, que trazia como título “Ânimo leva idoso a adiar aposentadoria”. A abordagem foi muito feliz e nos coloca diante de uma questão crucial em nossas vidas: até quando devemos trabalhar?
Penso que todas as questões existenciais que podemos nos propor não ficam bem resolvidas se não consideramos que cada homem e cada mulher, que receberam o imenso dom da vida, foram também chamados a uma missão. Ninguém existe por acaso, assim como ninguém é absolutamente dono da própria existência.
E essa missão é extremamente importante não apenas para nós próprios, como para as demais pessoas e para a humanidade inteira. Quando um ser é concebido e ainda não passa de uma célula no ventre materno, é como que se a sociedade inteira já estivesse na expectativa da vinda de um novo ser que é destinado a fazer este mundo melhor. É bem verdade que esse futuro homem, ou futura mulher, poderá cumprir bem ou não o seu papel, e aqui entra a questão da liberdade. Porém, todos aguardam que ele lute pela missão a que foi chamado, pois a felicidade depende disso, assim como disso depende, em certa medida, o próprio desenvolvimento da humanidade.
E quando termina essa missão? Penso que apenas com último suspiro. Enquanto viver poderá, livremente, ser-lhe fiel a esse chamado, ou, ao contrário, desgraçadamente ser infiel. Mas embora a missão termine com a morte, os efeitos de uma vida se prolongam no tempo. Quem duvida disso basta ler os escritos ou a biografia de pessoas que viveram há séculos ou mesmo milênios, e ver como essas vidas ainda hoje nos estimulam a ser melhores.
A reportagem que mencionei no início fala do caso da aposentada, Elza Vitorino Ferreira, que fará 65 anos no dia 27 de dezembro, mas que não pensa em se render ao ócio e irá protelar, ao máximo, sua saída do mercado de trabalho. A frase dela é tão singela quanto sábia: “Tenho horror à solidão e me sinto bem trabalhando (...). Deus me dando saúde, vou trabalhar enquanto eles me quiserem”. Que exemplo fantástico de vida: trabalhar até quando me quiserem! Não é frase lançada ao acaso, são palavras ditas por quem sabe que está de passagem, mas enquanto lhe forem dados os dias, os ocupará em construir algo de bom. E quanto bem se pode fazer vendendo produtos num supermercado! Quantos ares carrancudos não terá ela desfeito com um simples sorriso!
Acredito sinceramente que o homem e a mulher existem para trabalhar, assim como o pássaro para voar. Para se entender essa afirmação é necessário entender bem o que seja trabalho. Nesse contexto, o pai que troca uma fralda do filho à noite está trabalhando, e exercendo um trabalho de extrema importância. A pessoa que visita um amigo doente também faz um belo trabalho. O voluntário que diverte uma criança do Boldrini também exerce um maravilhoso trabalho.
Não estamos questionando o legítimo direito à aposentadoria. Trata-se de um direito social fantástico que precisa ser mantido e aprimorado. Nada mais justo que se desfrute de uma remuneração mensal após anos de dedicação a um trabalho profissional. Porém, penso que faz um grande mal a si próprio e à sociedade o aposentado que se dedica apenas a desvendar palavras-cruzadas e gasta os dias com pijama a matar o tempo, esperando a morte, que, paradoxalmente, não deseja que chegue nunca. Não há idade, não há condição de saúde, não há situação alguma que justifique não sonhar e fazer algo de bom pelos demais.
De novo é a Dona Elza quem nos dá a sua lição. Segundo a reportagem: os afazeres domésticos são realizados pelo marido, José Ferreira Filho, que se aposentou aos 45 anos e permaneceu dez anos desocupado, o que segundo Elza, afetou seu humor e envelheceu a aparência. A situação foi revertida quando Ferreira voltou à ativa como churrasqueiro aos finais de semana. “Ele remoçou muito e agora está feliz com o trabalho”, diz Elza. De fato, o trabalho feito com amor “remoça” e nos faz felizes, pois essa é a nossa missão.

Não sabemos como e nem quando terminará essa nossa passagem pela vida. Mas que alegria se esse misterioso dia nos surpreender trabalhando, por amor, naquilo a que fomos chamados a fazer naquele momento.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

O amor e o não

Recebi recentemente uma mensagem eletrônica. Gostaria de citar o seu autor, porém, ele próprio se identifica apenas como um Autor Desconhecido. E, como a sua fantástica mensagem tem circulado livremente na Internet, penso que pode ser reproduzida, até para que mais pessoas sejam tocadas pela sabedoria de suas palavras:
CRIANDO MONSTROS
O que pode criar um monstro? O que leva um rapaz de 22 anos a estragar a própria vida e a vida de outras duas jovens por... NADA? Será que é índole? Talvez, a mídia? A influência da televisão? A situação social da violência? Traumas? Raiva contida? Deficiência social ou mental? Permissividade da sociedade? O que faz alguém achar que pode comprar armas de fogo, entrar na casa de uma família, fazer reféns, assustar e desalojar vizinhos, ocupar a polícia por mais de 100 horas e atirar em duas pessoas inocentes?
O rapaz deu a resposta: ‘ela não quis falar comigo'. A garota disse Não, não quero mais falar com você. E o garoto, dizendo que ama, não aceitou um não. Seu desejo era mais importante. (...). O não da menina Eloá foi o único. Faltaram muitos outros nãos nessa história toda.
Faltou um pai e uma mãe dizerem que a filha de 12 anos NÃO podia namorar um rapaz de 19. Faltou uma outra mãe dizer que NÃO iria sucumbir ao medo e ir lá tirar o filho do tal apartamento a puxões de orelha. Faltou outros pais dizerem que NÃO iriam atender ao pedido de um policial maluco de deixar a filha voltar para o cativeiro de onde, com sorte, já tinha escapado com vida. Faltou à polícia dizer NÃO ao próprio planejamento errôneo de mandar a garota de volta pra lá. Faltou o governo dizer NÃO ao sensacionalismo da imprensa em torno do caso, que permitiu que o tal seqüestrador conversasse e chorasse compulsivamente em todos os programas de TV que o procuraram.  Simples assim: NÃO.
Pelo jeito, a única que disse não nessa história foi punida com uma bala na cabeça.  O mundo está carente de nãos. Vejo que cada vez mais os pais e professores morrem de medo de dizer não às crianças. Mulheres ainda têm medo de dizer não aos maridos (e alguns maridos, temem dizer não às esposas). Pessoas têm medo de dizer não aos amigos. Noras que não conseguem dizer não às sogras, chefes que não dizem não aos subordinados, gente que não consegue dizer não aos próprios desejos. E assim são criados alguns monstros.
Talvez alguns não cheguem a seqüestrar pessoas. Mas têm pequenos surtos quando escutam um não, seja do guarda de trânsito, do chefe, do professor, da namorada, do gerente do banco. Essas pessoas acabam crendo que abusar é normal. E é legal.
Os pais dizem: 'não posso traumatizar meu filho'. E não é raro eu ver alguns tomando tapas de bebês com 1 ou 2 anos. Outros gastam o que não têm em brinquedos todos os dias e festas de aniversário faraônicas para suas crias.
Sem falar nos adolescentes. Hoje em dia, é difícil ouvir alguém dizer: ‘não, você não vai passar a madrugada na rua’; ‘Não, você não vai dirigir sem carteira de habilitação’; ‘Não, você não vai beber uma cervejinha enquanto não fizer 18 anos’.
Crianças e adolescentes que crescem sem ouvir bons, justos e firmes NÃOS, crescem sem saber que o mundo não é só deles. E aí, no primeiro não que a vida dá (e a vida dá muitos) surtam, usam drogas, compram armas, batem em professores, furam o pneu do carro do chefe, chutam mendigos e prostitutas na rua etc.
Não estou defendendo a volta da educação rígida e sem diálogo. Pelo contrário, acredito piamente que crianças e adolescentes tratados com um amor real, sem culpa, tranqüilo e livre, conseguem perfeitamente entender uma sanção do pai ou da mãe, um tapa, um castigo, um não. Intuem que o amor dos adultos pelas crianças não é só prazer - é também responsabilidade.
E quem ouve uns nãos de vez em quando também aprende a dizê-los quando é preciso. Acaba aprendendo que é importante dizer não a algumas pessoas que tentam abusar de nós de diversas maneiras, com respeito e firmeza, mesmo que sejam pessoas que nos amem. O não protege, ensina e prepara. De um AUTOR DESCONHECIDO

Não ouso, caro leitor, acrescentar nada. Apenas relato uma experiência que sucedeu comigo há poucos dias. Um de meus filhos pediu-me para fazer um passeio. Eu e minha esposa, após pensarmos bem no assunto, decidimos que isso não seria bom para ele naquele momento. Após fazê-lo esperar por dois dias pela resposta, na véspera do passeio, disse-lhe com carinho e muita firmeza: “Filho, eu e sua mãe pensamos muito nesse assunto e estamos convencidos de que esse passeio não é bom para você. E porque nós te amamos muito, você não vai”. Ele chorou, atirou-se na cama, emburrou etc. Porém, no final daquele dia, em que ele passou com a família unida, voltei a ver em seus olhos a mesma alegria, paz e serenidade que já há alguns dias não via nele.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Greve na Polícia

Agora que terminou o longo período de greve dos policiais civis de São Paulo, penso que devemos fazer duas ponderações sobre o assunto. A primeira com relação às reivindicações dos policiais. E a segunda quanto à postura que se espera agora ser assumida pelos membros da instituição em relação ao cidadão.
Quanto ao primeiro aspecto, não pretendo (e nem poderia) questionar o conteúdo da decisão do Supremo Tribunal Federal quanto à existência ou não de direito de greve. Deve-se reconhecer que as reivindicações dos policiais são justas. De fato, os salários recebidos estão extremamente defasados, não condizentes com a importância da função desempenhada em benefício da sociedade.
E, independentemente de haver ou não o direito de greve desses servidores, penso que a luta por melhoras condições de trabalho e salários é legítima. Aliás, confesso que vejo com extrema preocupação e desconfiança quando noto que servidores públicos, em especial aqueles que detêm algum tipo de poder (governantes, parlamentares, juízes, promotores, fiscais de renda, policiais etc.), que não se interessam por seus vencimentos e, por conseqüência, não lutam por melhores condições. É que, se não se interessam pelos salários é porque têm outras fontes de renda, lícitas ou ilícitas. Sendo assim, se queremos ter policiais honestos e engajados em cumprir a sua missão, o primeiro que se há de fazer é pagar salários justos e dar condições de trabalho.
Mas há um segundo aspecto da questão a ser ponderado. Se por um lado as reivindicações dos policiais são justas, por outro, deve-se considerar que somente terá êxito qualquer mobilização dessa natureza se ganhar o apoio da sociedade.
Assim, é natural que, diante dessa situação, o cidadão comece a se questionar acerca da qualidade dos serviços que lhes foram prestados pelos policiais quando deles precisaram. Muitos se perguntarão: “como fui atendido quando tive de fazer um boletim de ocorrência por furto de veículo?”; “como foi o atendimento ao se levar a uma delegacia de polícia a notícia de um roubo?; “como foi o atendimento no DETRAN para tratar do licenciamento de veículo?”. E penso que, com relação ao cidadão, não vale como desculpa algo do tipo “atendo mal porque ganho pouco”. É que o cidadão responderia a isso, e com toda a razão, que, se o policial ganha mal isso não lhe diz respeito, pois ele paga, e muito bem, muitos impostos.
Assim, é inegável que há o direito dos servidores em relação ao Estado a uma digna remuneração, mas a obrigação correspondente a isso não está disposta em favor do próprio Estado, mas sobretudo da coletividade, em especial, das pessoas que dependem da atividade policial. E somente se obterá o apoio indispensável do cidadão se houver uma preocupação constante (e não há preocupação verdadeira sem ação concreta) pela melhora da qualidade dos serviços prestados.
E nessa luta pela qualidade do serviço público, de nada aproveitará as vazias reclamações: “se tivéssemos mais computadores...”, “se tivéssemos mais espaço físico...”, “se tivéssemos menos inquéritos...”. De fato, todas essas reclamações são legítimas e se referem a uma realidade caótica. Mas ainda que seja essa a realidade, não é hora para murmuração. É momento, por que não, de sonhar e realizar. Deve-se indagar, pois: nessa situação caótica, o que se pode fazer para melhorar a qualidade do serviço prestado?

Penso que após grandes crises e embates institucionais, como ocorreu nessa greve, o momento é propício para se tirar bons propósitos. Delegados, investigadores, escrivães de polícia não trabalham para o Delegado Geral de Polícia, nem para o Governador do Estado. Ainda que se deva tributar o respeito aos superiores, o policial civil é um servidor do cidadão, a quem assiste todo o direito de exigir um serviço público de qualidade. Afinal, só assim a sociedade será a grande aliada da polícia em quaisquer reivindicações que possa fazer.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Paternidade Responsável

O Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio de sua Corregedoria Geral da Justiça, se engajou numa iniciativa destinada a estimular os pais a reconhecerem formalmente a paternidade de seus filhos. A campanha foi intitulada de em nome do pai, paternidade responsável.
Felizmente a nossa cidade de Campinas se lançou muito fortemente nesse trabalho. A partir de dados fornecidos pela Diretoria Regional de Ensino, foram localizadas mães cujos filhos não tiveram sua paternidade reconhecida. Foram elas, por carta, convidadas a buscar esse reconhecimento por parte do pai. Além disso, todas as demais que desejarem, poderão comparecer, até o dia 17 de novembro, a alguns locais definidos para tentar resolver a situação. Isso pode ser feito no Fórum Central, Cidade Judiciária, Cartório de Registro Civil de Barão Geraldo e Cartório de Registro Civil de Sousas. A partir do comparecimento das mães a esses locais, os pais serão convidados, também por carta, a comparecerem na Cidade Judiciária, no dia 28 de novembro, onde ocorrerão audiências reservadas com o suposto pai. Havendo o reconhecimento, isso será averbado no Registro Civil, passando o nome do pai a constar da certidão do filho. Tudo isso não depende de advogado e não tem qualquer custo.
A iniciativa é extremamente louvável, de modo que toda a sociedade deveria nela se engajar de verdade.
No entanto, penso que a expressão “paternidade responsável” aparece um pouco empobrecida. É que ora se tem dito que “paternidade responsável” é sinônimo de reconhecimento formal do filho, ora aparece ligado à campanhas anti-natalidade, querendo dizer que os pais, para serem responsáveis, devem ter poucos filhos.
De fato, os pais devem ser responsáveis ao pensar no número de filhos. É que é uma irresponsabilidade tê-los em número superior ao que permite a saúde da mãe, as condições econômicas etc. Contudo, tanto mais o será se tiver filhos sem a eles dedicar tempo e atenção. Nesse sentido, penso que pode ser muito irresponsável o pai (ou a mãe) que, mesmo tendo apenas um filho ou dois, pense que educar se limita a escolher um bom colégio, não dedicando tempo nem esforço para estar com os filhos, brincar com eles, fazer coisas juntos. Ao contrário, conheço vários pais que possuem muitos filhos, porém, espremem o tempo e os recursos econômicos para estarem com eles, empenhando-se de verdade em sua formação. Nesse sentido, quem seriam os “irresponsáveis”?
Mas para que o pai possa ser tido como responsável ou irresponsável, antes de qualquer coisa, é necessário que seja pai. Certa vez soube da triste situação de um jovem, fortemente traumatizado pelo apelido que lhe puseram: “três pontinhos”. E o mais triste é saber o motivo. É que, sendo filho de mãe solteira, o Oficial de Registro, ao preencher a sua certidão de nascimento, lançou o pontilhado no campo destinado ao nome do pai. Os colegas de escola daquela cidadezinha, imbuídos de uma forte visão preconceituosa, o apelidaram assim, zombando da sua triste situação.
Penso que é inaceitável a postura de discriminar pessoas que, sem culpa alguma, não conhecem os pais. Porém, tanto mais inaceitável é o pai, que tal como a mãe contribuiu para que esse ser humano viesse ao mundo, sequer se digna a dizer ao filho e à sociedade que é o pai.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 19, assegura que toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família. A nossa Constituição Federal, por sua vez, no artigo 226 assegura que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. Assim, todos deveríamos nos engajar para que fosse assegurado às nossas crianças esse direito, qual seja, que tenham no seu convívio o pai e a mãe. Porém, se tal direito não lhes é garantido, penso que ao menos os pais deveriam tem um mínimo de decência suficiente para apagar os “três pontinhos” do registro civil de seus filhos.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

A crise e o trabalho

Temos observado o noticiário acerca crise financeira mundial. Entendo muito pouco de economia, de modo que qualquer consideração que eu fizesse estaria repleta de “achismos” e em nada contribuiria para compreender o problema. Porém, penso que a partir dessa crise devemos fazer um questionamento: para que serve, ou melhor, o que dignifica o trabalho? E essa indagação talvez nos remeta a algumas outras: a especulação com ações, o comprar e vender freneticamente no afã de lucrar muito, sem nada produzir, contribuem, de alguma forma, para o progresso da sociedade?
Penso que todo homem e toda mulher devem se esforçar por tornar digno o trabalho que exercem. Isso implica dar o melhor de si em tudo o que se faz com a reta intenção de, com isso, construir um mundo melhor. E isso há de se traduzir em atitudes bem concretas de nosso dia-a-dia.
Lembro-me de que, há alguns anos, toda noite dois de meus filhos ficavam na janela do apartamento à espera do caminhão do lixo passar. Quando o lixeiro chegava, podia se contemplar toda a energia e bom humor com que trabalhava. Rapidamente recolhia o lixo do edifício, que não era pouco, e, antes de subir no caminhão, já em movimento, acenava para as crianças e gritava: “tchau nenê!”, ao que eles respondiam com um efusivo aceno de mãos e uma gargalhada de satisfação. Tão importante era para eles cumprimentar o lixeiro que não dormiam enquanto não passava. Penso que esse lixeiro sabe o que significa dignificar o seu trabalho. Não se limitava a recolher o lixo, o que fazia muito bem. Eu mesmo o vi algumas vezes pacientemente recolhendo os resíduos no chão quando o saco se rompia. Mas, mais que isso, enchia de alegria a vida de duas crianças. Tanto assim que, por um bom tempo, um desses meus filhos dizia que quando fosse grande, seria lixeiro!
Além de dignificar o nosso trabalho, nós próprios construímos a nossa dignidade por meio do trabalho. Todo trabalho exige esforços, sacrifícios e renúncias. Ao fazê-lo com valentia, ganhamos a luta contra os nossos defeitos. Muitas vezes custa para o funcionário público atender bem ao cidadão. Porém, se ele vence a preguiça, o mau humor e a apatia, atendendo com cordialidade e atenção, quem ganha com isso é próprio servidor, que cresce enquanto ser humano. Com o tempo, esse esforço por sorrir, por ouvir, por ser solícito, vai forjando no interior do homem e da mulher uma qualidade que torna mais fácil repetir esses atos bons. A porta que se abre com freqüência é bem mais leve ao toque da mão que aquela que se mantém sempre fechada. Assim também é o coração do homem. Quando se mantém fechado em si mesmo endurece e só exala amargura. Ao contrário, quando se abre num serviço desinteressado aos demais, torna-se leve e jovial.
O trabalho bem feito, além de contribuir para a dignidade do próprio trabalho e fazer com que nós próprios alcancemos a plena dignidade por meio do trabalho, com ele podemos ajudar os demais e reconhecer o imenso valor que tem cada ser humano. Vale dizer, podemos contribuir para a dignidade dos demais com o nosso trabalho. Uma pessoa sisuda e carrancuda pode contaminar negativamente um ambiente. Ao contrário, uma pessoa alegre e prestativa eleva o nível do relacionamento. E o bem que ela faz também contagia, até que todos estejam sadiamente contaminados.

Certa vez me contaram a história de um homem, já de idade avançada, que soube estar com uma doença grave. Caminhando por uma praia, dispôs-se ele a meditar sobre a sua existência. Naquele momento, toda a sua vida passou a desfilar diante de si como se fosse um filme. Se isso ocorresse conosco, como seria esse filme? Seria uma sucessão de gargalhadas efusivas com a alta das ações, seguida dos choros da baixa? Seria uma infinidade de “amanhã eu faço isso” para os filhos, para os amigos, para a esposa ou para o marido? Ou, ao contrário, teria muitos gestos de amor, como o do lixeiro, que, com o seu trabalho, vai recheando de alegria e paz esse mundo sedento de um sentido para a vida.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O trabalho da mulher

Recebi um e-mail de uma amiga muito interessante, que merece ser lido e meditado. Passo a transcrevê-lo:
O VALOR DE UMA DONA DE CASA
Um homem chegou a casa após o trabalho e encontrou seus três filhos brincando do lado de fora, ainda vestindo pijamas. Estavam sujos de terra, cercados por embalagens vazias de comida entregue em casa. A porta do carro da sua esposa estava aberta. A porta da frente da casa também. O cachorro estava sumido, não veio recebê-lo.
Enquanto ele entrava em casa, achava mais e mais bagunça. A lâmpada da sala estava queimada, o tapete estava enrolado e encostado na parede. Na sala de estar, a televisão ligada aos berros num desenho animado qualquer, e o chão estava atulhado de brinquedos e roupas espalhadas. Na cozinha, a pia estava transbordando de pratos; ainda havia café da manhã na mesa, a geladeira estava aberta, tinha comida de cachorro no chão e até um copo quebrado em cima do balcão. Tudo isso sem contar que tinha um montinho de areia perto da porta...
Assustado, ele subiu correndo as escadas, desviando de brinquedos espalhados e de peças de roupa suja. “Será que a minha mulher passou mal?” Pensou ele. “Será que alguma coisa grave aconteceu?”.
Nesse momento ele viu um fio de água correndo pelo chão, vindo do banheiro. Lá ele encontrou mais brinquedos no chão, toalhas ensopadas, sabonete líquido espalhado por toda parte e muito papel higiênico na pia. A pasta de dente tinha sido usada e deixada aberta e a banheira transbordando água e espuma.
Finalmente, ao entrar no quarto de casal, ele encontrou sua mulher ainda de pijama, na cama, deitada e lendo uma revista. Ele olhou para ela completamente confuso, e perguntou: “Que diabos aconteceu aqui em casa?  Por que toda essa bagunça?”. Ela sorriu e disse:
- Todo dia você chega do trabalho e me pergunta: “Afinal de contas, o que você fez o dia inteiro dentro de casa?”. Bem... Hoje eu de verdade não fiz nada...
Tenho de admitir que o texto tem um certo tom que não favorece o bom relacionamento conjugal. É que, valendo-se do estilo de um feminismo distorcido, pensa que a “libertação” da mulher depende de um conflito com o homem, numa espécie de “luta de classes” doméstica, ao final do que ela alcançaria sua “autonomia”. Deixando de lado esse aspecto, o relato nos chama a atenção para outra realidade muito importante a ser considerada: como é pouco valorizado o trabalho da mulher no lar!
É indiscutível que a mulher exerce hoje um papel importantíssimo em nossa sociedade por meio de seu trabalho fora do lar. Muitas delas são empresárias, políticas, magistradas... E o fazem muito bem, superando muitos homens em capacidade de iniciativa, perspicácia, criatividade etc. E mesmo nos trabalhos aparentemente menos importantes (ressalto, aparentemente, pois todo trabalho honesto é digno de respeito) a mulher deve ser reconhecida e valorizada.
Porém, há um local em que ela é simplesmente insubstituível: no lar. Por mais que o marido se esforce, e é questão de justiça que ele a ajude nas tarefas da casa, é a ela que os filhos procurarão quando tiverem dor ou ficarem doentes. É ela que consegue dar um ar de família a qualquer casa, por mais modesta que seja. Somente em seu colo as crianças encontrarão a ternura imprescindível para que desenvolvam e cresçam verdadeiramente fortes.
Se é assim, por que a nossa sociedade é tão cruel em não reconhecer a dignidade do trabalho da mulher no lar? Pior ainda. Muitas mulheres têm de conciliá-lo com o trabalho fora. Aquele, o do lar, na minha opinião, é o mais nobre de todos. Nele ninguém a substituirá.

Nós, homens, como pouco observadores que somos, não damos conta de como elas são importantes. Talvez seja o caso de imaginarmos como seria o lar em que vivemos sem elas. Ou como teria sido sem elas a nossa infância. Sei que ao fazer essas considerações posso aguçar sentimentos no leitor que de fato não teve esse privilégio. Mesmo assim o faço, pois é necessário despertar em nossos corações uma verdade inegável: elas são insubstituíveis.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

TV e educação

Na edição do penúltimo domingo, dia 12 de outubro, o Correio Popular trouxe uma interessante matéria que trata dos riscos que a INTERNET proporciona aos nossos filhos. E de fato é importantíssimo que os pais estejam atentos e vigilantes para evitar os grandes males que o mau uso do computador pode acarretar. Mas e a TV, também não pode ter os seus efeitos ruins? Parece que os pais aos poucos estão se dando conta da necessidade de controlar o uso da INTERNET. Nesse cenário moderno, contudo, a TV costuma ser encarada como um equipamento antigo e, por ser de há muito conhecido pelos pais, pensam que é totalmente inofensivo. Mas será mesmo assim?
Assim como a INTERNET, a TV é um meio de comunicação fantástico que, se for bem utilizado, pode ajudar muito os pais na educação dos filhos. Porém, é necessário que haja critério e vigilância por parte dos pais para que o mau uso da TV não acabe por minar todos os valores que se tentam transmitir aos filhos.
Para que a TV possa de verdade auxiliar os pais na educação dos filhos é necessário que se limite o tempo em que ficarão diante da tela, que os programas sejam bem escolhidos e, sempre que possível, que os pais assistam a alguns programas juntos com os filhos.
É necessário que cada família estabeleça um horário para assistir TV. Quando chegamos a casa, por questão de segurança, é muito comum que tranquemos bem a porta e, se alguém toca a campainha, não abrimos o portão sem antes nos certificarmos muito bem quem é. Do contrário, poderíamos colocar a nossa família em risco de assalto etc. Pois bem, mas será que ao deixarmos nossos filhos sozinhos diante da TV, com o controle seletor de canais na mão, para assistirem ao que bem entenderem, não estaremos escancarando nossa casa para que exibam aos nossos filhos coisas piores ainda?
Além disso, estabelecer um horário é necessário para que os jovens e as crianças possam se dedicar a outras atividades saudáveis, como a leitura, o esporte e a música.
Mas além de limitar o tempo, é necessário muito critério ao escolher os programas que irão assistir. Poderia alguém dizer: “mas isso é censura!”. De fato, a censura tem entre nós uma forte conotação negativa porque foi utilizada em um passado não muito longínquo como forma de manter um regime totalitário. E, nesse sentido, a censura utilizada como forma de opressão é um grande mal mesmo. Porém, será que a própria emissora de TV não faz uma escolha das matérias que irão ao ar em detrimento de outras que não irão? Isso também é censura? Ora, se a emissora pode escolher o que a ela convém transmitir e o que não lhe convém, tanto mais os pais terão o direito de escolher o que é bom e o que não o é para os seus filhos.
Aliás, a manipulação existe e não podemos ignorá-la. E a TV é um fantástico meio para isso. Uma pesquisa feita na Austrália demonstrou que mais da metade das crianças pesquisadas entre nove e dez anos acreditava que Ronald Mcdonald sabia o que era uma boa alimentação para elas! Ora, como se conseguiu incutir essa idéia falsa na cabeça de tantas crianças?
Mas não basta que os pais limitem o horário destinado a assistir TV e selecionem bem os programas. É que mesmo programas em si ruins, como a maioria das telenovelas, podem ser bem aproveitados na educação se os pais os assistirem diante dos filhos. Por exemplo, diante de uma atitude de vingança ou de infidelidade, os pais podem questionar os filhos o que pensam do assunto, sem manifestarem suas opiniões. E, a partir de uma série de perguntas oportunas e feitas de forma serena, fazer com que eles vejam o que há de ruim nisso e, dessa forma, adquiram boa formação.

Há um ditado popular que diz que “é o olho do dono é que engorda o gado”. Com isso se quer dizer que todo empreendedor deve estar atento ao seu negócio, pois do contrário esse irá à ruína. Isso, com muito maior razão se aplica aos pais na educação dos filhos. É necessário que se façam presentes e que estejam atentos. Afinal, há negócio mais importante, e que, por conseqüência, que mereça mais atenção que a educação dos filhos?

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Retrato do coração

Um dia desses um dos meus filhos, de quatro anos, com um brilho de felicidade nos olhos capaz de espantar qualquer tristeza, um sorriso no rosto capaz de enternecer o homem mais duro e passos ansiosos e apressados, veio até mim trazendo um desenho que havia feito. Tratava-se de um coração pintado a lápis com várias cores. E ao se aproximar estendeu a mão e disse: “Papai, fiz pra você”.
O desenho, em si, não tinha nada de extraordinário, continha todas as imperfeições de uma pintura de uma criança de sua idade. Na verdade, extraordinária era a satisfação que ele sentia ao poder me presentear com algo que havia feito. Dava a impressão de que havia colocado o próprio coração no papel para me entregar.
Como que de relance veio-me à mente toda a história da vida daquela criaturinha que agora me fazia transbordar o coração de alegria e ternura. As longas horas que ele passou na UTI neonatal, para além da porta por sobre a qual se advertia: “alto risco”. As angústias e incertezas daquele momento. E depois os momentos em que me deliciava em contemplá-lo na barriga da mãe, os primeiros movimentos, a primeira consulta, quando ainda com poucas semanas de vida já se ouvia o seu coraçãozinho pulsando fortes alentos de vida. Que emoção!
E o coração com que me presenteava tinha um motivo muito especial: a comemoração da semana da vida. Num instante, a imensa alegria que ele me causava pareceu anuviar-se. É que quando se pensa em defesa da vida, é inevitável que venha à mente os ataques que se fazem contra ela. E sem esforço, absorto naquelas considerações, ocorre-me uma indagação cuja resposta não consigo encontrar: como podem querer matar no ventre materno uma criaturinha que, dentro em pouco, muito pouco, quase que num piscar de olhos, se transformará nessa criança que parece não ter outro objetivo que não agradar-me. Ele não pensa nisso, mas em seus olhos pode se ver, para quem os olha com pureza de coração, um agradecimento: “obrigado, papai, obrigado mamãe por me terem deixado nascer!”.
Quando vêm à tona discussões sobre temas polêmicos, como o aborto, as pessoas parecem assumir três posições. Os favoráveis à prática do aborto não são muitos, mas muito bem articulados, sabem agir na surdina, nos bastidores, sempre a espreita de um cochilo e... aprovar. Em outro lado bem oposto, há os que defendem a vida. Também não são muitos, freqüentemente taxados de fundamentalistas, de fanáticos religiosos, mas coerentes com suas posições. E, entre uns e outros, há uma imensa maioria, como que indiferentes. Muitos em tese contrários ao aborto, porém, quando surge o tema, pensam que possuem coisas muito mais importantes com que se preocupar, que essa discussão é sem importância e não os levará a lugar algum.
Depois de muito pensar sobre essa aparente apatia da maioria das pessoas, a única resposta que me parece razoável formular é a que já foi sintetizada num ditado da sabedoria popular: “o que os olhos não vêem o coração não sente”. Talvez por ser um assassinato que ocorre no ventre materno, cuja vítima ainda ninguém havia visto o rosto, que não tem nome, não se dá muita importância. Essa postura, porém, não consegue esconder uma forte dose de hipocrisia. Com efeito, a dor, o sofrimento e a injustiça não deixam de existir somente porque não lhes damos atenção.

Estamos na semana de defesa da vida. Que seja para todos nós ocasião de reflexão e de compromisso. Talvez um jeito muito simples e eficaz de fomentarmos em nós a convicção de que toda vida deve ser vivida e respeitada, pela imensa dignidade que contém, seja olhar para as crianças, ou olharmos para nós mesmos, e pensarmos que já fomos uma única célula, ou um ser muito pequenino no ventre de nossas mães. Porém, não existiríamos, não teríamos essa irrepetível oportunidade de sermos felizes não fosse a generosidade de nossos pais em manter aberta, em seus corações, as portas da vida.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Os três erres

Na semana passada tive a grata satisfação de participar na comemoração do aniversário de um jovem adorável, que fazia seus oitenta anos. E tive a oportunidade de conversar com a esposa dele. Também ela mantinha o semblante jovial, aquele que somente as pessoas que encontraram a paz interior conseguem manter. E me contou ela muito satisfeita que em breve completariam sessenta anos de casado. “O casamento é uma coisa boa”, dizia ela, “não sei por que hoje em dia não é mais valorizado”. E depois aconselhou com a autoridade de quem já quase perfaz as bodas de diamante: “O segredo do casamento são os três erres: respeito, responsabilidade e renúncia”. Quanta sabedoria contém esse conselho!
Respeito. Todo ser humano é dotado de uma imensa dignidade, de modo que deve ser tratado com um profundo respeito. Mas tanto mais respeitoso deve ser o nosso relacionamento com aquele ou aquela com quem se decidiu livremente formar uma comunhão plena de vida. Há alguns anos ouvi de um homem, que também tivera a fortuna de manter uma longa e feliz vida matrimonial, contar o segredo desse sucesso: “o segredo do casamento é a educação”. Com essa expressão queria dizer que marido e mulher devem se esmerar por manter cada vez mais a delicadeza no trato. É que as brusquidões, grosserias e frases irônicas vão pouco a pouco apagando a chama do amor conjugal, assim como as cinzas atiradas sobre a brasa ardente destroem o seu brilho e calor.
Responsabilidade. A liberdade é um dos maiores dons que possuímos. Contudo, a liberdade somente é legítima se for exercida com responsabilidade. Somos livres, mas exatamente por isso é que somos responsáveis pelos atos e decisões que livremente tomamos.
Há quem sustente que o casamento é um contrato. Penso que não é exatamente assim. Na verdade, no ato em que é contraído, o casamento é um contrato, pois depende da livre manifestação da vontade dos noivos. Após isso, porém, vínculo matrimonial não tem natureza contratual. Mas, conceitos a parte, podemos estabelecer semelhanças entre o matrimônio e os demais contratos. Em todo contrato há sempre um intercâmbio de bens (ou serviços) entre os contratantes. Por exemplo, na compra e venda, um entrega um bem a outro, e esse retribui com certa soma de dinheiro. Na locação, o proprietário cede o uso de um bem seu e, em troca, recebe um aluguel mensal. Mas e no casamento, que bens (ou serviços) um dos contraentes entrega ao outro? Na verdade não assumem apenas obrigação de entregarem bens ou serviços, mas dão-se mutuamente a si próprios. Com isso, as pessoas que livremente decidiram por se casar assumem essa grave responsabilidade de se doarem a si próprios sem reservas, sem condições.
Renúncia. Eis aqui outra palavra que, ao lado da entrega, parece ensejar forte resistência. Quando a pronunciamos com relação ao casamento, talvez a primeira idéia que vem à mente é a resignação diante dos dissabores e insucessos de um relacionamento difícil. Devemos ponderar que a renúncia não é algo em si bom nem ruim. Ao contrário, depende do que se renuncia e em função do que se exerce essa renúncia. Por exemplo, o atleta não considera como perdido ou como uma bobagem as suas horas de treino por dia, ainda que com isso renuncie a muitas outras coisas prazerosas de que poderia desfrutar. Também a pessoa ambiciosa não mede esforços para conseguir atingir o posto a que se propôs, ainda que isso signifique passar por grandes sacrifícios.
Não há dúvida de que a condição de casado impõe a ambos muitas renúncias. Contudo, essas valem a pena, pois aquilo a que se renuncia são bens muito pequenos e insignificantes, se comparados com as alegrias e felicidades que proporcionam o relacionamento conjugal.

Respeito, responsabilidade e renúncia. Com quais e quanto desses ingredientes temos temperado o nosso relacionamento conjugal?

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

A auto-estima na educação

“Eu sei que sou um caso perdido, mas mesmo assim vou tentar ser uma pessoa melhor”. Essa frase foi extraída de uma redação de uma menina de onze anos. Ocorreu que a mãe, sempre muito dedicada e zelosa, num dia em que não estava bem, com excesso de trabalho e preocupações, vendo que a filha ia mal dos estudos, não conseguiu conter o desabafo, e disse à criança: “Eu desisto, você é um caso perdido!”. Quando a mãe leu posteriormente a redação, não conseguiu conter a emoção. No fundo, não queria rotular negativamente a filha, porém, sem saber como agir corretamente, acabou por fazer esse grande estrago.
Essa mãe teve a sorte de ver, ainda que por essa via amarga, que essas frases negativas não são jamais a melhor forma de educar. Mas será que nós, sem nos darmos conta do grande mal que causamos aos nossos filhos (ou aos nossos alunos), também não fazemos algo semelhante? Talvez muitos de nós já tenhamos proferido frases do tipo: “você não tem jeito mesmo”, ou “já te falei mil vezes, mas não adianta nada, parece que entra por um ouvido e sai por outro!”. E, por vezes, o desabafo é mais destrutivo ainda: “você parece o seu pai, deixa tudo jogado pela casa!”, ou “você é igualzinha a sua mãe, não consegue terminar nada que começa!”.
Todos sabemos que não conseguiremos nenhuma melhora nos filhos com frases dessa natureza. Porém, o que muitos ignoram, é que essas frases causam um mal muito difícil de reparar. É que se as crianças ouvem isso do pai ou da mãe, no fundo, pensam elas que têm mesmo os defeitos de que são acusadas e que lhes é impossível mudar. E a crítica ainda é mais grave quando se diz que têm o mesmo defeito do pai ou da mãe. Nesse caso, tanto menos possível será lutar por vencê-lo, afinal, pensarão “se meu pai (ou minha mãe) também é assim!”.
Todo ser humano tem uma necessidade irreprimível de ser e de se sentir amado sendo exatamente quem é. O educador (pai, mãe, professor ...) que ignora isso ou que não o leva em consideração não será eficaz em seu trabalho. As crianças, em especial na primeira infância, necessitam muito de se sentirem queridas. E para isso, não se há de poupar os beijos e os abraços, e que sejam olhadas com atenção e ternura. Sem isso, não conseguem alcançar um desenvolvimento adequado e saudável.
Mas essa necessidade de ser e se sentir amado não é exclusivo das crianças pequenas. Todos nos a temos numa medida muito maior do que pensamos. E os jovens, a quem nos aventuramos educar, também a tem. Evidentemente, a forma com que se manifesta isso será diferente da que manifestamos em relação à criança de dois anos. Mas na essência, há de ser a mesma. Trata-se de interessar-se de verdade por ele ou por ela. Lembro-me de um professor que se aproximou de um aluno, enquanto ele tentava resolver um problema de física, e perguntou-lhe como estava a saúde do pai, que há algum tempo sofrera um acidente. O gesto é pequeno, mas denota uma grandiosidade interior.
Não se trata de ser mole, de “passar a mão na cabeça” diante de qualquer situação. Aliás, não exigir dos filhos (ou dos alunos) é um terrível sinal de que não os queremos bem de verdade. A pessoa omissa em corrigir e em exigir, no fundo, pode ser um egoísta, ou, quando menos, tem uma forte dose de covardia e age assim apenas para não “ter problemas”, para evitar confrontos. No entanto, esses são necessários, pois, do contrário, os nossos filhos (ou alunos) não serão melhores.
Quando tivermos de corrigir nos nossos filhos ou os nossos alunos, o melhor que podemos fazer é iniciar por reconhecer algo que eles fazem bem, começar por um elogio. Porém, devemos estimulá-los a serem melhores em outro aspecto em que ainda não estão bem, mas sempre com um sentido positivo, mostrando-lhes que, se se esforçam, podem ser melhores.

Mas tenhamos todos nós a firme convicção de que, como já disse um grande sábio, “as pessoas, como o vinho, melhoram com o tempo”. De fato, o vinho melhora com o tempo se for armazenado, do contrário, avinagra. Nossos filhos e alunos também serão melhores como pessoas, conquanto bem guardados, ou melhor, bem educados por pessoas que lhes querem bem de verdade.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

A condução da família

Diz-se que o casamento estabelece uma comunhão plena de vida. Mas se as vidas do homem e da mulher que se unem em matrimônio se entrelaçam tão radicalmente, é necessário que saibam decidir e sonhar juntos.
Como solução para as crises conjugais, há quem proponha que cada um dos “cônjuges” tenha vida completamente independente, por exemplo, que more cada um no seu apartamento, mantendo-se a “liberdade” para evitar conflitos e para que o casamento “não sufoque a individualidade” de cada um. Ocorre que essa opção, muitas vezes justificada pelo propósito de respeitar a liberdade, na verdade, tem uma acentuada dose de egoísmo, posto que cada qual busca no outro apenas a satisfação de anseios pessoais (sexuais, afetivos etc.) mas sem que haja a mínima disposição de se doar.
Talvez muitos casais não optem por ter cada um o seu próprio apartamento mas é igualmente ruim para o casamento que marido e mulher passem a levar, ainda que inconscientemente, vidas paralelas. É o que acontece quando deixam de ter coisas em comum. Ele tem o seu trabalho, os seus amigos, as suas horas de lazer. E ela, por seu turno, também as suas coisas, das quais ele está totalmente excluído. Isso pode gerar uma indiferença mútua e, com ela, o veneno que mata o amor conjugal.
Mas se as vidas paralelas são um mal para o casamento, também o é aquela situação de total absorção de um pelo outro, sufocante e que impede que cada qual desenvolva a sua personalidade. É que, por mais que as vidas se interpenetrem no casamento, marido e mulher, em alguns aspectos, continuam com suas individualidades. Algumas pessoas, muitas vezes movidas pelo ciúme, tendem a buscar um controle total do que faz e pensa o marido ou a esposa, o que também é extremamente prejudicial para o casamento.
Se pudéssemos descrever graficamente a situação de um casamento ideal, talvez devêssemos imaginá-lo como dois círculos que se interpenetram, mas sem que se reduzam a um círculo apenas e, principalmente, sem que um círculo passe a conter totalmente o outro. Ou seja, em alguns aspectos da vida do homem não podem ter qualquer ingerência da mulher e vice versa. Dentre esses está, por exemplo, o relacionamento da pessoa com Deus, a sua fé, a sua consciência.
Há vários outros aspectos, porém, da vida de ambos, que se inter-relacionam, de modo que as decisões precisam ser compartilhadas. Por exemplo, a escolha do trabalho profissional, a educação dos filhos, a moradia da família. Dentre esses aspectos da vida de do casal que precisam ser compartilhados, no processo de tomada de decisões, também há algumas considerações, conforme as conseqüências que essa decisão acarreta à família.
Assim, se a escolha do trabalho, ou qualquer outra decisão que precise ser tomada, implique mudança de cidade, penso que a decisão deve ser tomada em conjunto. Se os reflexos na família forem menores, por exemplo, a esposa assumir um trabalho que lhe exigirá estar fora de casa algumas noites na semana, talvez a escolha seja exclusiva dela, mas deve consultar antes o marido. Enfim, não há regras fixas, mas o importante é que o casal aprenda a decidir corretamente. É que grande parte dos desentendimentos são decorrência de uma imaturidade na tomada das decisões.
Porém, mais que decidir juntos, é fundamental que marido e mulher aprendam a sonhar juntos. No filme Um Homem de Família, o personagem Jack Campbell (Nicolas Cage) de repente se vê inserido numa família, casado com a antiga namorada, Kate (Tea Leoni). É interessante notar como os desentendimentos surgem, dentre outros motivos, porque não têm sonhos em comum.

O grande desafio que temos para manter sempre jovem o amor conjugal é aprender a sonhar juntos. Talvez um exercício interessante que nos estimule a melhorarmos nisso é cada qual pedir ao outro que descreva como gostaria que fossem as suas vidas daqui a alguns anos. E penso que tanto mais feliz será esse relacionamento quanto maior o destaque que cada qual der ao outro nesse cenário.

Alegrias e desafios da adolescência

Faz já algum tempo que falamos nesta coluna sobre as dificuldades que muitos pais encontram na educação de filhos adolescentes. Naquela oportunidade fizemos como que um breve resumo de um curso muito interessante de que havia participado. Agora que soube, com muita alegria, que o evento se repetirá, penso que seja oportuno retomarmos o tema.
Muitos pais de adolescentes se queixam dizendo: “Meu filho se tornou um preguiçoso, vive agora ‘esparramado’ no sofá a ouvir música”. Alguns lamentam: “Ele está tão rebelde, contesta tudo e a tudo exige explicações”. Os mais ciumentos, cheios de saudades reclamam: “minha filha agora que está se tornando moça nem liga mais para nós, só pensa em ficar com as amigas e de ‘namoricos’”.
Será que são preguiçosos? Não é verdade que o adolescente seja em regra um  preguiçoso. Nessa fase, devido às mudanças hormonais e outros fatores biológicos, é natural que lhes custe mais desempenhar tarefas que exigem esforços. Aliás, aquela vitalidade incansável da criança, que corre de um lado para o outro, sempre solícita a fazer o que lhe pedem, não poderia durar para sempre.
É conveniente, então, sabendo que essa “moleza” surgirá nessa fase da vida, que os pais os estimulem com carinho e compreensão. Não se trata de deixar as coisas correrem, pensando que “logo isso passa”. Se não se fizer nada, não passa não, e terão esse vício para o resto da vida. Mas há que se estimular com um sentido positivo, sem ares de ameaça ou de reclamação, a fazer algum esporte, a estudar, a envolver-se em atividades de serviço aos demais (voluntariado), enfim, a vencer e, sobretudo, vencer-se.
Talvez a crítica mais injusta que se faz contra o adolescente seja a de que é rebelde. A rebeldia em si não é ruim, mas deve ser bem orientada. E se o for é capaz de mudar o mundo. As crianças trazem gravadas na alma um sentido muito forte de justiça. Quando crescem e compreendem um pouco melhor as coisas, passam a notar, com grande decepção, as injustiças, hipocrisias e traições que há nas pessoas. Com isso, seus corações puros tendem a se rebelar. Mas isso se trata de uma reação saudável, conquanto que os estimulemos a transformar essa rebeldia em ações concretas para o bem do próximo, pois somente assim que se constrói uma sociedade mais humana.
Por que incomoda ou intriga que estejam de “paqueras”? Salvo para umas poucas pessoas, que por escolha ou um desígnio qualquer optam pelo celibato, as demais sonham em se casar, em constituir uma família. E para essas, o desejo de dar-se a outra pessoa começa já nessa fase da vida. Dar-se, não no sentido de relação sexual, mas de entrega a alguém com quem um dia se vai formar uma comunhão plena de vida, parafraseando o nosso Código Civil. Assim, está-se a procura desse alguém com quem mereça compartilhar uma vida.
É bem verdade que alguns jovens vivem isso de forma inconseqüente. É momento, então, de orientá-los, fazendo-os enxergar a imensa dignidade que encerra a condição do ser humano, de modo que essa doação a outra pessoa há de ser ponderada, refletida, ainda que tenha como impulso uma forte carga emotiva.
Os conflitos da adolescência são devidos mais aos pais que aos filhos. Afinal, os pais já passaram por essa fase. Portanto, seria muito mais lógico exigir deles a compreensão, o carinho e a atenção de que os filhos tanto necessitam nessa idade.
Mas a solução não é encontrar culpados e sim empreender esforços por harmonizar essa relação. Para isso, muitas vezes os pais de nosso tempo não conseguem empreender essa luta sozinhos. Têm de buscar conselhos em bons profissionais. Têm de estudar e colocar os estudos em prática sobre a educação dos filhos. E convém lembrar que na educação, como em quase tudo, é melhor chegar antes que o problema. Assim, o momento ideal para pensar em como educar adolescentes é quando os filhos estão ainda na infância.

Para os pais que se interessam pelo assunto, ocorrerá em Campinas, no próximo dia 18 de outubro, na UNICAMP, um seminário que terá como tema Alegrias e Desafios na Educação de Adolescentes. As informações podem ser obtidas no site: www.alegriasedesafios.net. Vale a pena conferir.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Exercendo a cidadania

Há um aspecto da democracia que é sempre objeto de questionamentos e debates: o voto obrigatório. E, nos países que, como o nosso, instituem a obrigatoriedade do comparecimento do cidadão às eleições, surge outra questão a essa relacionada, que são os votos brancos e nulos. Afinal, não votar é um direito do eleitor, ou, ao contrário, é uma lamentável renúncia a um direito?
Muitas vezes já ouvi frases azedas do tipo: “não me meto em política, pois não suporto essa sujeira”, ou ainda: “vou votar nulo em sinal de protesto!”. Mas seria legítima essa postura de não participar da vida pública do país com a desculpa de que “todo mundo é corrupto”? Penso que não. Afinal, se vivemos numa democracia, os representantes serão eleitos pelo voto e, se alguns renunciam ao direito de votar, na verdade estão apenas delegando aos demais eleitores seu direito de escolher quem serão os governantes.
O voto nulo jamais poderá ser interpretado com um sinal de protesto. É que, sendo o voto secreto, nunca saberemos se esse voto foi decorrente de um protesto, se derivou da ignorância do eleitor, que não soube digitá-lo corretamente, ou ainda se foi fruto de uma atitude desleixada, em que se optou por anular o voto por não se preocupar em buscar uma escolha certa.
E mesmo que, em alguma eleição em concreto, não se encontrasse alguém que fosse digno de confiança, ainda assim haveria de se atribuir a culpa disso aos próprios cidadãos. Isso porque, se não houver ninguém honesto concorrendo, no que não acredito, por que os homens de bem que têm vocação profissional para isso não se lançaram nessa iniciativa?
Quando um terreno é deixado abandonado, nele somente cresce mato e erva daninha, e o seu aspecto será feio e inóspito. Ao contrário, quando é cuidado por um diligente agricultor, nele crescem e frutificam árvores frondosas e frutíferas. Quando uma praça fica abandonada e escura, é freqüente que seja ocupada por malvados, que vão ali se instalando até que, pouco a pouco, a fazem palco de suas empreitadas criminosas. Ao contrário, quando é bem iluminada e cuidada, e nela se instalam as famílias com as crianças a brincar e conviver, constrói-se ali um ambiente saudável e prazeroso de se estar.
E isso acontece nas várias entidades que existem numa sociedade. Quando os homens de bem descuidam de suas obrigações e covardemente se isolam em seus redutos, pessoas incompetentes, insensatas e inescrupulosas acabam por galgar cargos que jamais poderiam lhes ser confiados.
É, portanto, obrigação grave das pessoas de bem, e que têm vocação profissional para isso, participarem da vida pública. Do contrário, os partidos acabarão por ficar inchados de inescrupulosos e aproveitadores e, por conseqüência, ficaremos mesmo sem escolha.
E essa responsabilidade não se aplica exclusivamente à atividade político-partidária. Na verdade, é necessário que se participe ativamente de todas as entidades que compõem a sociedade: sindicatos, assembléias de condomínio, associações de classe, sociedades de amigos de bairro, conselhos escolares etc.
Tornou-se célebre o caso de um jovem que se perdeu no submundo das drogas. Em uma carta enviada a seus pais, observava ele que entre os “amigos” que o forjaram no vício havia união e cumplicidade, ao passo que entre os pais, desunião e desconfiança. E então concluía ele: “Porque vocês foram fracos no bem, eu agora sou forte no mal”.
Mas não! Não há de ser assim! Ainda não inventaram um melhor regime político que a democracia. Com efeito, nela somente não haverá bons governantes se não houver bons eleitores, ou, pior ainda, se os cidadãos forem omissos e descuidarem da grave responsabilidade que têm de participar ativamente na construção de uma sociedade melhor. E é com esse espírito e propósito que se há de conclamar a todos e a todas a votar, afinal, como ouvíamos com gosto em nossa infância:
Depende de nós
Quem já foi ou ainda é criança
Que acredita ou tem esperança
Quem faz tudo pra um mundo melhor

Depende de nós...

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Transparência na Administração da Justiça

Há algumas semanas a prisão e soltura de empresários e políticos pela Polícia Federal fizeram com que o Judiciário fosse alvo de duras críticas da opinião pública. E a indignação não está tanto no conteúdo das decisões, seja daquela decretou a prisão, seja da que os colocou em liberdade, mas na rapidez com que os presos conseguiram que a questão chegasse ao STF. Com efeito, revelou-se um terrível paradoxo: a instituição que sempre é criticada pela insuportável morosidade, cai agora em descrédito exatamente pela inusitada agilidade.
A Constituição Federal consagra em seu artigo 5º que todos são iguais perante a lei. Em nosso País há inúmeros mandados de prisões expedidos. Muitos desses podem ser considerados injustos, ao menos no entendimento do Supremo Tribunal Federal. Sendo assim, esses presos poderiam estar seguros de que em 24 horas teriam essas ordens de prisão apreciadas pelo Presidente da mais alta Corte do Judiciário?
É evidente que isso não é possível. Então penso que a sociedade tem o direito de exigir dos que administram a justiça uma resposta clara e convincente a uma dúvida de muitos cidadãos: quais são os critérios que norteiam a atividade do juiz no sentido de dar prioridade a determinados casos em detrimento de outros?
Acredito que todo juiz se vê constantemente diante desse dilema: não sendo capaz de dar prontas decisões a todos os casos, deve escolher quais serão apreciados dentro das horas de trabalho que tem em um dia. Mas quais são os fatores que norteariam essa escolha?
Se há uma virtude que não pode faltar no magistrado é o bom senso. De fato, não dá para se definir com regras rígidas a quais casos deve ser dado prioridade. Apesar disso, a população tem o direito de saber quais são os critérios, até para aferir se são ou não legítimos.
E a busca por tratar com isonomia a todos que procuram pelo Judiciário não pode limitar-se a propósitos genéricos, desses que ficam muito bonitos em obras literárias. Ao contrário, penso que o juiz deve se examinar com freqüência sobre os serviços que presta. Será que se dá mais atenção ao caso que vai sair na imprensa do que àquele entre dois vizinhos sem qualquer expressão? Será que se trata com urbanidade e respeito a todos em audiência e fora dela? Penso que o juiz deve se fazer constantemente esses questionamentos, sob pena de ser engolido pelo volume de processos que todos sabem que está acima de suas forças.
A atuação do juiz não deve estar limitada a “dar a cada um o que é seu”, como se diz na definição clássica de justiça. Deve ele próprio se exigir mais. Há alguns anos, um técnico de futebol, falando ao seu modo aos jogadores de um time amador, tentava estimulá-los a vencer o jogo numa situação difícil: “temos de colocar o coração na ponta da chuteira e vamos lá!”. Talvez seja um pouco disso que as pessoas esperam do juiz, que coloque o coração na ponta da caneta. Que saiba chorar com os que choram, que saiba sorrir com os que sorriem.
Evidentemente, não se espera do juiz uma atitude “sentimental”. Se há um terreno em que não cabe muita emotividade é no ato de decidir um litígio. Mas a racionalidade que deve nortear as decisões não tem nada de incompatível com a postura de se colocar no lugar daqueles que diante dele clamam por justiça.
Esse tratamento digno e isonômico que se espera do juiz não pode depender apenas de sua própria consciência. Penso que o Judiciário, enquanto instituição, deve exigir isso de seus membros. E a população tem o direito de exigir que o Judiciário seja um eficiente prestador de serviço público. É certo que as decisões do juiz não estão sujeitas a esse controle. E, se estiverem erradas, há os recursos que as corrigem. Agora, ao contrário, na administração da justiça devem ser tomadas as medidas que avaliem a sua eficiência.

Neste momento em que a opinião pública questiona, e com razão, a rapidez de umas decisões em detrimento da insuportável morosidade de outras, deveríamos considerar que não é justo que a agilidade das decisões dependa da categoria das pessoas que são julgadas. E essa atitude é tanto menos aceitável na instituição que, por vocação, deve dar a cada um o que lhe é devido.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

A vida num instante

Muitos de nós assistimos indignados ao fracasso da atleta brasileira no salto com vara nas olimpíadas de Pequim. Quantas horas de treino, quantos sonhos, quantos esforços, quanta luta e quanta esperança depositados naquele momento único! E eis que, com um detalhe pequeno, uma vara perdida, se joga tudo fora... Penso que o exemplo dessa dura desilusão pode nos colocar diante de um questionamento fundamental: onde e em que estamos pondo nossos sonhos e depositando nossas esperanças? É que disso depende, e muito, a nossa felicidade e o nosso fracasso em nossas vidas.
Numa análise superficial parece que a vida foi muito cruel com Fabiana Murer. As olimpíadas somente acontecem a cada quatro anos. Talvez na próxima, a idade, implacável, e, com ela, a redução do vigor físico, a mantenham de fora. Enfim, talvez fosse uma oportunidade única...
Porém, como uma verdadeira vencedora, não é assim que ela reagiu: “Eu me tranqüilizei. Vou lá me divertir, brincar um pouco. Mas em competições na Europa. Eu posso melhorar meu salto e conquistar grandes resultados para o Brasil”. Depois da derrota injusta, segue ela com o firme propósito de seguir lutando. Para si própria? Não, como diz a atleta, pelo seu País.
E nós, será que estamos vivemos a espera de oportunidades únicas que se esvaem tão fugazes quanto aparecem? Muitos parecem não viver, mas aguardar que se realizem projetos para, então sim, serem felizes. Com efeito, pensamos: “quanto eu fou desembargador (ou desembargadora)”, “quando comprar a minha casa”, “quando tiver menos processos em atraso” então sim serei feliz. Nenhum desses anseios é ruim, o problema é a importância que damos a eles em nossas vidas.
Temos de colocar a nossa esperança e o nosso coração em coisas que permanecem. Passar um dia todo “paparicando” um pai ou uma mãe idosos, talvez os levando a um passeio que os agrada muito, ou visitar um amigo ou parente doente, esforçando-se por levá-los consolo e alegria, são ações que também se realizam em pouco tempo, mas selam a alma com uma alegria que perdura. É que nessas iniciativas o foco de nossas ações não está em nós mesmos, mas nos outros.
Dedicar tempo aos filhos. Sentar com eles e ajudá-los na lição de casa, ainda que estejamos arrebentados de cansaço. Fazer passeios juntos, pescar, jogar futebol, observando-os, corrigindo-os oportunamente e estando de verdade com eles. É inegável que isso rouba o tempo que poderia ser gasto em bebericar com amigos ou, pior ainda, lançar-se em ruinosas aventuras extraconjugais. Porém, essas ações, egoístas e ilícitas, fecham a alma num vazio sem fim, ao passo que aquelas a abrem para um universo fantástico onde reina a alegria e a paz.
Há de se esmerar no trato com a esposa e com o marido. Que cada um não faça do outro um simples objeto que se usa para alcançar algo e que logo se esquece quando não mais representa uma utilidade. Note-se, pois, que todo relacionamento exige esforço e luta constantes, mais heróicas e mais perseverantes que o esforço e a luta dos atletas olímpicos. Mas quão saborosos são os frutos que se experimentam a cada prova que se vence juntos! A cada obstáculo que se transpõe de mãos dadas!
Penso que a nossa vida é sim uma grande olimpíada. Há uma largada, inicialmente lenta, como uma maratona. Por vezes (quase sempre) temos de saltar obstáculos, que vão ficando cada vez maiores... E nadamos, afundamos e voltamos à superfície, remamos contra a corrente, velejamos contra o vento. Lutamos, batemos e apanhamos. Mas tudo isso passa, tudo se supera.

Mas eis que um dia nos lançaremos num salto à distância, duplo, triplo..., que nos remete não para um banco de areia, mas para uma imensidão sem volta. E o que fica de todas as nossas ações em favor dos pais, filhos, amigos, esposa, marido? Ficam os minutos, os segundos que, por amor, soubemos dedicar a eles nesta vida. Esses ficam gravados para sempre na alma daqueles a quem servimos, ao mesmo tempo que nos impulsionam fortemente, mais ainda, nos arremessam mesmo para uma feliz eternidade, ou, se preferirem, para uma eterna felicidade.