segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Conselhos de uma criança

Há algumas semanas participei de uma entrevista na TV Século 21. O programa esteve voltado para uma homenagem ao dia dos pais. Chegaram ­e-mails de muitos lugares. Um deles, porém, merece uma análise mais profunda. Transcrevo a mensagem:
“Ser pai é saber educar, é não ter medo de errar, é achar que a sua esposa e seus filhos são o seu maior presente. Que até daria a vida pelo filho. Sabe o que faz e faz porque ama. Ele é exemplo. Um pai de verdade é isso: ama e não desiste da sua mulher e filho para sempre. O pai tem um papel tão importante quando o da mãe” (Maria Clara, Campinas-SP, 10 anos).
Apesar de ter apenas com dez anos, a autora da mensagem já sabe que o fundamental na paternidade, como na maternidade, é saber educar. E educar não é só contratar bons colégios, ainda que esses possam prestar uma ajuda inestimável. Também não é delegar para outras pessoas (babás, empregadas etc.) a atribuição de formar os filhos. É uma missão que cabe primordialmente aos pais, ainda que possam contar com bons colaboradores.
Ser pai “é não ter medo de errar”. De fato, pai e mãe querem acertar, porém, nem sempre conseguem. Apesar disso, devem saber ousar. A paternidade e a maternidade, hoje como sempre, é uma enorme ousadia. Com efeito, trazemos homens e mulheres livres ao mundo. Bem por isso a felicidade a quem tanto anseiam somente poderá ser encontrada por eles próprios, trilhando livremente os caminhos que lhes estão reservados.
Ser pai “é achar que a sua esposa e seus filhos são o seu maior presente”. Soube, há certo tempo, que um pai bem sucedido mandou imprimir cartões de visita com a fotografia da sua família, recheada de filhos e netos. E, quando lhe perguntavam o porquê disso, respondia todo satisfeito: “É que esse é o único negócio que deu certo para mim”. Aquele bom homem passou por inúmeros reveses econômicos, mas soube formar uma família feliz, que agora lhe dá muito consolo, ainda que não poucas tenham sido, também, as dificuldades por que passou para educa-los.
Um pai “até daria a vida pelo filho”. O amor do pai traz em si a disposição ao sacrifício. Mas será que estamos dispostos a sacrificar, também, ao menos de vez em quando, o futebol, a cervejinha com os amigos, as horas e horas diante do computador ou mesmo o excesso de trabalho que rouba o tempo do convívio familiar? Com efeito, para dar a vida é necessário estar disposto a, antes disso, dar o nosso tempo. Além disso, somente é capaz de grandes façanhas quem sabe se doar nas pequenas coisas de cada dia, por amor.
“Sabe o que faz e faz porque ama”. O pai não pode improvisar. Para educar é preciso conhecer, é preciso estudar para saber o que faz. O ambiente em que os nossos filhos estão inseridos no mundo de hoje exige grandes desafios que o simples bom senso, muitas vezes, não é suficiente. E a razão mais importante para se dedicar a fazer cursos e a buscar orientação sobre como educar os filhos, como bem disse a Maria Clara, é o amor.
“Ele é exemplo”. Mais que dar sermões ou broncas, que são de pouco valor e de nenhuma eficácia pedagógica, pai e mãe deveriam cuidar muito especialmente do exemplo de integridade, respeito e coerência de vida.
“Um pai de verdade é isso: ama e não desiste da sua mulher e filho para sempre”. O êxito nunca é certo na educação. Quantos exemplos encontramos de pais dedicados, com famílias bem constituídas e que, apesar disso, um filho ou uma filha se enveredam por caminhos tortuosos (drogas, alcoolismo etc.). Nesses casos, penso que a maior virtude dos pais é a perseverança que os leva a não desistir jamais.
“O pai tem um papel tão importante quando o da mãe”. Fantástico! De fato, onde está dito que é apenas a mãe que deve se ocupar de educar, de cuidar da lição de casa, de que tenham bons hábitos etc.? Assim como ambos atuam na sublime missão de dar a vida, ambos hão de se engajar, com sintonia e dedicação, nessa fantástica aventura.

Contemplando essa mensagem, confesso ao leitor que fiz um propósito: ouvir mais atentamente às crianças. É que na simplicidade das suas palavras podemos encontrar grandes verdades, muitas vezes já esquecidas por nós, adultos.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Educar para a liberdade

Um episódio que presenciei quando cursava a Universidade ficou muito bem gravado na memória. A cena se passou no chamado “bandejão” da faculdade. Uma aluna e um aluno conversavam descontraidamente. Apesar da discrição que tentavam manter, pude notar que falavam sobre o consumo de maconha nas festas do Centro Acadêmico. Num dado momento, a moça indagou ao rapaz: “Mas, por quê?”. Ele, com um ar de malandro e pouco afeto a questionamentos dessa natureza, respondeu: “Liberdade! Não liberdade vigiada, mas liberdade sem adjetivos!”.
Eis um conceito muito difundido de liberdade: ausência de freios ou, simplesmente, a possibilidade de fazer o que quiser, quando quiser e como quiser. Mas será esse o verdadeiro conceito de liberdade? Por outro lado, o que podem os pais fazer quando os filhos formam – talvez influenciados pela cultura e pelo ambiente – um falso conceito de liberdade?
Penso que é necessário que os pais tenham, primeiro, uma convicção sólida sobre o assunto. Se ainda não a tem, convém estudar, meditar e pedir conselho a quem o possa dar com critério e retidão de intenção. É que, na educação, como em quase tudo na vida, ninguém dá o que não tem. Logo, se queremos formar nossos filhos para o bom uso da liberdade, convém que saibamos o que é e que apliquemos em nossas vidas o que queremos transmitir-lhes.
Estou convencido de que a liberdade não é fazer o que bem entende. É, antes disso, a faculdade que temos de escolher em cada momento e circunstância das nossas vidas o que é melhor, o que contribui para alcançar o verdadeiro bem para nós e para aqueles com quem convivemos. Isso nos remete para outro aspecto, indissociável da liberdade, que é a responsabilidade. Ou seja, precisamente porque somos livres é que somos igualmente responsáveis pelos nossos atos e pelas nossas decisões.
Mas ainda que tenhamos uma noção muito clara, não é fácil transmiti-la aos filhos. Com efeito, não é simples formá-los para o bom uso da liberdade. Apesar disso, essa é uma grave obrigação dos pais.
Talvez nos ajude a compreender essa missão se compararmos o papel dos pais com o de um guia de alpinismo. Ninguém ousará dizer que os conselhos desse, ou mesmo a corda que os ata à rocha lhes tolhe a liberdade. São eles que os mantêm vivos. Algo semelhante acontece com os pais na educação dos filhos: guiam, orientam, inspiram, mas esses devem estar decididos a caminhar livremente com as próprias pernas.
Para que pai e mãe sejam autênticos guias devem cuidar de alguns detalhes que farão a diferença. Um deles é o ambiente familiar. Quanto ao aspecto material da casa, deve ser acolhedor, limpo e agradável, ainda que, por vezes, seja muito simples e modesto, como por certo seria o lar de Jesus em Nazaré. Mas mais importante ainda é saber construir um ambiente de paz e serenidade. A casa deve ser um lugar em que nos sentimos seguros e acolhidos. E cabe principalmente aos pais edificar, com sacrifício e abnegação, esse reduto onde os filhos possam crescer e trazer os amigos para desfrutar desse remanso.
Além disso, é fundamental a sintonia entre os genitores. Imaginemos como seria se dois guias que nos orientam na escalada se pusessem a discutir e a brigar diante de nós sobre o melhor caminho e a maneira mais adequada de segui-los. Os guiados ficariam atônitos e inseguros, quiçá duvidando da própria existência de uma via que os levasse ao cume, ou se vale a pena buscá-lo.

De igual modo, pode haver divergência de critérios entre o pai e a mãe. Mas eles devem buscar resolvê-los a sós, de modo que aos filhos transmitam a orientação segura e serena de quem ponderou muito sobre que caminhos trilhar nestas sendas fantásticas, ainda que por vezes penosas, que nos conduzem à Vida.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Para ser pai...

Uma menina, de seis anos, assistia TV com a mãe e o irmão mais novo. O programa suscitou-lhe uma preocupação que a moveu a dizer à mãe: “Você me promete que nunca vai se separar do papai?”.
Um amigo meu, já casado e com filhos, vivenciou um risco sério de separação dos pais. Apesar de não mais residir com eles e já ter a própria família constituída, aquela experiência lhe foi tão dolorosa que fez o seguinte comentário: “Senti-me como se estivessem me rasgando ao meio. Creio que se me fizessem isso não doeria tanto quanto me dói pensar que o casamento deles pode fracassar nesse momento das suas vidas!”.
Por mais que se pregue e diga o contrário, um dos nossos maiores anseios é que nosso pai e nossa mãe se amem. O que verdadeiramente dá sentido às nossas vidas é o amor. Por isso, queremos encontrar em nossa origem um ato de amor que, por ser verdadeiro, é duradouro e capaz de sobreviver às diversas intempéries da vida. Esse é o motivo pelo qual a simples ameaça de separação dos pais nos é tão dolorosa.
Mas se é assim, por que será que há tanto divórcio e separação em nosso tempo?
Afirma a ciência que o ser humano não é capaz de se manter íntegro sem proteção fora da atmosfera. A massa de ar exerce uma pressão que nos é essencial para a sobrevivência. De certo modo, um papel semelhante desempenha a sociedade em relação à família. Ao mesmo tempo que a estabilidade da família é fundamental para a subsistência da sociedade e do próprio Estado, também ela depende do auxílio e proteção desses organismos sociais maiores.
Apesar disso, muito pouco ou quase nada se tem feito para manter a família saudável. Bem ao contrário, muitas vezes se tem proposto a banalização do divórcio, as uniões passageiras e inconsequentes como um sinal de avanço e “liberação de antigos tabus”. Sem querermos nos perdem num saudosismo vazio, temos de reconhecer que esse fenômeno é relativamente recente. Há décadas atrás havia uma proteção da sociedade pela estabilidade da família. Tomemos como exemplo o que aconteceu com o memorável jogador da seleção brasileira de futebol, Mané Garrincha:
“Volta para casa! Acredito que muitos ainda se recordam dessa frase, dita aos gritos no Maracanã, dirigida ao mais famoso ponta-direita da seleção brasileira:
“– Volta para casa, Mané! Mané, volta para casa!
“Os torcedores queriam que Mané Garrincha voltasse para a sua família, para os seus filhos, a quem tinha largado para se juntar a uma conhecida cantora” (texto extraído do livro AS CRISES CONJUGAIS, de Rafael Llano Cifuentes).
Nesse contexto, social era mais fácil promover a unidade e a estabilidade do casamento e da família. Ao contrário, quando os meios de comunicação social, em especial as nossas telenovelas, e por vezes até programas promovidos ou subvencionados pelo Estado, facilitam a desagregação da família, essa fica extremamente vulnerável.
Mas o sucesso do casamento e, por consequência, a unidade da família, depende muito especialmente dos cônjuges. Talvez já tenhamos ouvido o seguinte questionamento: “o que é melhor: a separação ou que pai e mãe fiquem brigando a todo tempo diante dos filhos?”. Ora, o melhor é que fiquem juntos e não briguem diante dos filhos.
Não pretendemos fomentar uma visão preconceituosa em relação aos inúmeros pais e mães cujas uniões não deram certo. Mesmo nessa situação podem desempenhar magnificamente a maternidade e a paternidade. No entanto, é inegável que os filhos têm a necessidade do pai e da mãe juntos. Quando isso falta, é possível suprir por outros meios, mas essa situação está longe de ser a melhor para a sua formação.

Mais interessante que a pergunta feita pela garotinha, foi a resposta que obteve da mãe: “Filhinha, há alguns anos eu prometi ao sei pai que aquele compromisso que assumi com ele era para sempre. E veja que você ainda nem existia... Assim, não tenho o menor receio de renovar aquela promessa: meu amor, eu me casei com o seu pai para sempre”. O pai, que fingia ler o jornal na sala ao lado, sorriu satisfeito: “esse foi verdadeiramente o melhor presente de dia dos pais!”. 

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Uso e abuso do celular nas escolas

Muitos dos pais talvez já tenham se descabelado com os filhos, deslizando com uma habilidade impressionante os dedos sobre o teclado de um smartphone, enquanto se tenta manter uma refeição em família... Ou mesmo muitos de nós nos surpreendemos desviando a atenção para o celular em ocasião em que deveríamos estar mais atentos às nossas companhias, como num jantar de casal ou de amigos num restaurante. E a imersão que muitas pessoas fazem nesses equipamentos eletrônicos não se restringe às refeições. Muitas vezes emperram o trânsito quando já está aberto o semáforo, participam “de corpo presente” de uma reunião de trabalho etc.
Mas talvez um ambiente mais crítico em que a indevida utilização pode atrapalhar o estudo e a própria convivência saudável é na escola. Manter a concentração dos alunos sempre foi um desafio enorme para o professor. Contudo, tem agora a “concorrência desleal” dos celulares e smartphones. E quase sempre é bem mais gostoso e aprazível manter conversas virtuais com amigos e navegar na INTERNET do que prestar atenção no mestre, por mais habilidoso que ele ou ela seja na arte de ensinar.
Muitas instituições adotam a prática de proibir o uso durante as aulas, ou mesmo o ingresso com esses aparelhos nas escolas. Essas medidas são úteis e muitas vezes necessárias para manter a atenção dos alunos, ou ao menos para evitar que se distraiam. No entanto, não podemos nos esquecer que um grande desafio do educador é formar para o bom uso da liberdade.
Quando as escolas proíbem o uso dos celulares, total ou parcialmente, também fomentam o bom uso da liberdade. Com efeito, respeitar as regras justas e legítimas não nos faz menos livres. Ao contrário, a escolha do que é bom e correto em cada situação é o que verdadeiramente nos liberta. Ao contrário, a infração e descumprimento das regras, ainda que tenham uma aparência de liberdade, no fundo nos faz escravos de nossos caprichos e egoísmo, que a pior mais cruel escravidão.
No entanto, é preciso formar os nossos filhos e alunos para exercer bem a liberdade também naquelas ocasiões em que não se está diante de uma norma específica de conduta, ou mesmo quando não há o menor risco de punição.
Nessa linha, os pais e professores precisam ter a sabedoria para lhes ensinar que, apesar de um mundo virtual e fascinante que o avanço da tecnologia lhes proporciona, há também um mundo real e concreto em que os relacionamentos também necessitam ser formados e cultivados.
Além disso, o mundo virtual tem um chamativo muito especial para fomentar atitudes egoístas. Embora possamos fazer um excelente uso dele, como por exemplo, para postar boas matérias em sites, redes sociais, ou mesmo enviar mensagens de estímulo e alento a nossos familiares, amigos e conhecidos, é também muito frequente adentrarmos no mundo virtual quando queremos, para fazer o que desejamos, buscando muitas vezes uma satisfação pessoal ou o simples entretenimento, esquecendo-nos por completo dos outros.
Também não convém esquecer o quanto os equipamentos eletrônicos nos desviam a atenção. Enquanto escrevia esse artigo fiz ao menos três interrupções para responder a sms da minha esposa, filha e amigo. E quantas vezes não farão o mesmo nossos filhos e alunos durante uma tarde de estudos ou em meio a uma aula?

No mundo cada vez mais virtual em que vivemos, talvez um bom conselho que podemos dar aos nossos filhos e alunos seja o seguinte: “faça o que deve fazer em cada momento e esteja real e concretamente no que se faz”. Isso talvez exija a valentia de desligar ou manter no silencioso os celulares durante as atividades que exijam maior concentração, mesmo que o uso não seja proibido. Porém, além de lhes propormos isso, devemos dar bons exemplos. Afinal, não são poucos os jovens da segunda ou terceira idade que também perdem longas horas do dia bem distantes deste mundo real...