As declarações do Papa Bento XVI ao jornalista Peter
Seewald, publicadas no livro Luz do Mundo,
têm causado um verdadeiro rebuliço na mídia. Chega-se a “profetizar”, a partir
das palavras do Pontífice, ou das distorções que se fazem delas, que seria um
primeiro passo rumo a uma nova visão da Igreja sobre a sexualidade. Será esse
pronunciamento o início de uma mudança da moral católica acerca desse tema?
Não é possível entender a posição da Igreja Católica
sobre o preservativo sem compreender a sua mensagem sobre o amor conjugal. Em
sua primeira encíclica, “Deus é amor”, o Papa Bento XVI, buscando esclarecer a
natureza do amor de Deus pelo ser humano, vai buscar como fonte para que
possamos entender como Deus nos ama exatamente o amor conjugal entre o homem e
a mulher.
Os laços que se estabelecem entre o homem e a mulher
que se uniram em matrimônio são da mesma natureza daquele que nos unem a Deus.
E é nesse contexto que se insere a sexualidade. Não é ela algo vergonhoso. São
Josermaria Escrivá chegou à ousadia de comparar o leito conjugal com um altar.
Portanto, uma realidade em que Deus se faz presente e abençoa.
No entanto, sendo expressão do amor do homem e da
mulher, não há como dissociar a relação sexual dos fins do matrimônio, que são bem
dos cônjuges, traduzido na ajuda mútua, e a criação e educação dos filhos.
Desse segundo fim natural do matrimônio é que advém
todo o ensinamento da Igreja em relação à contracepção. Ou seja, esse amor
entre o homem e a mulher, expressão do amor de Deus pelo ser humano, há de
estar aberto à vida. Isso não quer dizer que somente se deva buscar o ato
sexual com a intenção de gerar filhos. O prazer sexual em si é algo bom para os
cônjuges. Também a gravidez, havendo justas razões, pode ser evitada pelos
métodos naturais de contracepção. Contudo, um casal cristão que se dispõe a
seguir os ensinamentos da Igreja em todos os aspectos, menos nesse, seja usando
preservativo, seja se valendo da esterilização, no fundo está como que dizendo
a Deus: “o Senhor pode estar presente em todos os aspectos da minha vida, no
trabalho, na família etc., menos nesse. Aqui queremos que o Senhor não se
intrometa”. Com isso, porém, perde-se o aspecto mais sublime do amor humano,
que é exatamente a sua natureza divina.
Mas como explicar o pronunciamento do Papa no sentido
de que “em alguns casos, quando a intenção é reduzir o risco de contaminação,
(o uso do preservativo) pode ser um primeiro passo para abrir o caminho a uma
sexualidade mais humana, vivida de outro modo”.
O contexto em que o Papa propõe que seja vivida a
sexualidade de modo a promover a dignidade humana é no matrimônio. Quando,
porém, se rompem as regras da moral, surge a questão do mal menor. Por exemplo,
trata-se de norma de direito natural o respeito ao patrimônio alheio. No
entanto, são possíveis vários níveis de violação a essa norma, de modo que o
furto, que é cometido sem violência ou grave ameaça é menos grave que o roubo,
e esse é menos grave que o latrocínio, em que o ladrão mata para roubar.
O mesmo se diga com relação ao relacionamento sexual.
Em que pese todo o ensinamento da Igreja acima mencionado, há os que não
aceitam essa visão e defendem o “sexo livre”, totalmente dissociado da abertura
aos filhos e como um mero ato de satisfação de uma necessidade fisiológica.
Nesse contexto, o uso do preservativo com propósito de respeitar a vida do
parceiro é um mal menor que o risco de contaminação por doenças sexualmente
transmissíveis.
Penso que o Papa nos dá um exemplo de carinho e
compreensão que devemos ter para com todos, em especial com os que não têm a
mesma fé ou as mesmas convicções que as nossas. Se perguntarem a nós cristãos o
que pensamos a respeito do assunto, diremos com toda a sinceridade que
relacionamento sexual é um ato de amor entre um homem e uma mulher unidos em
matrimônio. Mas isso não nos autoriza qualquer atitude de menosprezo ou falta
de respeito com quem pensa ou aja de forma diferente. Tanto nos interessa a
vida e a saúde deles que se aconselha o uso de preservativo como forma de proteger
a vida alheia. Mas nós, cristãos, temos também o direito de dizer a quem queira
ouvir que isso não é amor humano verdadeiro, nem relacionamento sexual
saudável, nem tampouco que serão felizes os que perambulam por esses caminhos.