segunda-feira, 17 de março de 2014

Resolvendo os conflitos na escola e em casa

Um dia desses, um garoto de 9 anos me contou um incidente, aparentemente sem importância, que lhe ocorreu no colégio. Um amigo dele o havia insultado com palavras ofensivas. Perguntei-lhe como reagiu, ao que respondeu: “Contei tudo à coordenadora”. “Mas não seria melhor resolver isso diretamente com o seu colega? Poderia, por exemplo, ter dito com firmeza a ele que não gostou do que ele fez”, disse-lhe eu. “Se eu dissesse isso ele iria rir de mim. E também poderia acabar numa briga. A professora me ensinou que não podemos resolver nossos problemas com violência”.

Esse incidente me fez recordar algo que aprendi no curso de direito sobre os meios de solução dos conflitos. Há basicamente modalidades, que os doutrinadores classificam em autotutela, autocomposição e heterocomposição.

Na autotutela, que simplificadamente podemos definir como a prevalência da “lei do mais forte”, um dos envolvidos simplesmente impõe ao outro o seu critério ou a sua decisão. Na autocomposição os próprios envolvidos no litígio encontram uma solução, por exemplo, através da negociação. Na heterocomposição a solução é dada por um terceiro, não envolvido com o problema, que pode ser um mediador, um conciliador, um árbitro (arbitragem) ou o próprio Estado que, por meio do Poder Judiciário, exerce a jurisdição como forma de solução dos conflitos.

Mas, deixando de lado as lições de direito, o fato é que desde cedo somos treinados de uma maneira ou de outra a resolver os conflitos que nascem do relacionamento com os demais. E a escola desempenha um papel relevantíssimo nisso. Assim, se o colégio chama para si a solução de todos os problemas que surjam entre os alunos, o resultado será que não serão treinados na autocomposição e, no futuro, terão dificuldades para resolver os próprios conflitos.
E o mesmo ocorre na família. Também em casa é comum que as crianças tragam aos pais os conflitos entre os irmãos, fugindo de uma solução negociada entre eles.

Em minha experiência profissional pude constatar inúmeras demandas em que o réu comparece indignado não tanto com o pedido em si do autor, mas porque não se tentou sequer conversar previamente para resolver a pendência.

É necessário agir com prudência. A intervenção dos pais ou dos professores é sempre melhor do que os filhos e os alunos resolvam com violência. No entanto, é preciso formar e não apenas resolver. Assim, diante de um caso que nos trazem, há que se indagar se tentaram resolver diretamente com o outro. Se não, informar-se dos motivos que o impedem. E, depois, não convém dar uma “sentença”. Melhor é fazê-los pensar e colocar-se no lugar do outro, considerando como o colega ou o irmão se sentem diante da situação.

Conta-se que na China do século VII, o imperador Hang Hsi expediu o seguinte decreto: “Ordeno que todos aqueles que se dirigirem aos tribunais sejam tratados sem nenhuma piedade, sem nenhuma consideração, de tal forma que se desgostem tanto da ideia do Direito quanto se apavorem com a perspectiva de comparecerem perante um magistrado. Assim o desejo para evitar que os processos se multipliquem assombrosamente, o que ocorreria se inexistisse o temor de se ir aos tribunais; o que ocorreria se os homens concebessem a falsa ideia de que teriam à sua disposição uma justiça acessível e ágil; o que ocorreria se pensassem que os juízes são sérios e competentes. Se essa falsa ideia se formar, os litígios ocorrerão em número infinito e a metade da população será insuficiente para julgar os litígios da outra metade da população”.
Não se trata, evidentemente, de afugentar as pessoas do Poder Judiciário. Também os pais, professores e educadores em geral não devem deixar de resolver os conflitos no âmbito das suas responsabilidades. No entanto, mais importante e urgente é formar pessoas suficientemente justas e prudentes, que sejam capazes de dar a cada um o que lhe é devido e de atuar, em cada situação das suas vidas, de modo a promover o verdadeiro bem para si e para os demais.

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