Tem-se
verificado uma grande disseminação da chamada união estável. Essa, por
definição, dispensa um compromisso escrito e solene para que se instaure. Bem
ao contrário, trata-se de uma situação de fato à qual a Lei confere consequências
jurídicas: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem
e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e
estabelecida com o objetivo de constituição de família” (artigo 1.723 do Código
Civil).
Por isso, uma
dificuldade que se apresenta é delimitar o momento em que a convivência passa a
ser pública, contínua e duradoura, ou mesmo que se tenha subjetivamente a
intenção de constituir uma família. E, outro problema, por consequência, é
deixar claro quando um relacionamento ainda não pode ser qualificado como tal.
Nesse contexto,
surge o contrato de namoro. Trata-se de uma manifestação da vontade, por
escrito, na qual os namorados qualificam a natureza e alcance da relação. No
mais das vezes, porém, faz-se esse acordo com o propósito de afastar a
configuração da união estável. É discutível a validade desse negócio jurídico,
pois, se a qualquer momento vierem a surgir os elementos que qualificam a união
estável, com ou sem esse documento, a Lei imporá a esse relacionamento os seus
efeitos.
Penso que o
contrato de namoro pode até conter um elemento positivo no relacionamento, que
é o fato de ficar bem claras as expectativas que cada qual mantém quanto ao
outro. E em toda a existência da união conjugal é fundamental que tais
expectativas sejam comunicadas e bem alinhadas. Isso se dá, porém, com um
diálogo aberto e sincero e não simplesmente com a subscrição de um documento.
Mas há um fator
no mínimo preocupante por detrás disso. É que uma união autenticamente conjugal
está fundada numa doação sem reservas que visa precipuamente o bem e a
felicidade do outro. E o namoro é, na essência, um tempo de maturação do
sentimento recíproco destinado a aferir se a outra pessoa merece que se doe a
ela de maneira total e por toda uma vida.
O problema é que
muitas relacionamentos intitulados como namoro, união estável ou mesmo muitos
casamentos estão fundados numa postura egoísta de buscar no outro apenas a
satisfação de uma necessidade sexual, afetiva, econômica, social etc. E, como
dito, na essência não é isso uma relação conjugal. Nesse cenário, o contrato de
namoro pode surgir como uma institucionalização do uso do outro, sem
compromisso, apenas enquanto apetecer a um deles esse uso (ou abuso)
consentido.
Há nessa postura
não apenas muitos tons de cinza. Bem pior, trata-se de um sombrio ofuscamento
do amor autenticamente conjugal. O namoro tem uma espontaneidade, mas também um
risco de rompimento, que implica esmero e tenacidade na conquista e que culmina
com um compromisso, esse sim comprometedor de toda a dimensão conjugal da
pessoa. Com o devido respeito, é uma terrível contradição selar um compromisso
que tem por objeto não se comprometer. Algo semelhante a alguns avisos – sem
efeito jurídico – existentes em estabelecimentos, que bem poderíamos adaptar
para o caso: “não nos responsabilizamos pelas consequências de dormir juntos
sob o mesmo teto”.
Talvez o maior
desejo e a maior necessidade de toda mulher e de todo homem do nosso tempo é o
resgate do verdadeiro sentido do amor, ainda que ignorem. Esse não comporta
reservas, restrições nem muito menos temor de assumir as suas consequências com
toda a sua radicalidade. É verdade que tanto mais se ama tanto mais suscetível
se está a sofrer por esse amor. Mas alguém tem a ilusão de passar por essa
existência sem sofrimento? Mais ainda, o sofrimento vivido por amor é a maior
fonte de uma autêntica e perene felicidade, tal como o vemos na Cruz, por
exemplo.
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