segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Crimes verdadeiramente hediondos

 

                 

                Causou perplexidade o aborto em uma menina de 10 anos, que engravidou em decorrência de abusos sexuais. Ressalto que estou impedido de me manifestar sobre decisões judiciais. Mas temos o direito de discorrer sobre a questão em si. E confesso ao leitor que a primeira coisa que me veio à cabeça ao refletir sobre o tema foi o seguinte: “o que faria se a vítima desse crime hediondo fosse minha filha?”.

As ações a serem tomadas seriam muitas e impossíveis de serem enumeradas agora, até porque dependeria das circunstâncias concretas. Mas há uma postura de fundo que é universal: afogar o mal em abundância de bem.

Assim, penso que a atitude que tomaríamos seria cuidado, carinho, acolhida, compreensão, em uma palavra: AMOR. Isso implicaria uma gama de ações, tais como acompanhamento psicológico, atendimento médico adequado e humanizado. Mas dentre as inúmeras possibilidades para cuidar dessa mulher – no caso, dessa menina – que foi vítima de uma violência sexual horrorosa, não estaria em absoluto, a possibilidade de tirar a vida do bebê que ela traz no ventre.

Lembro-me do pós-parto do nosso sétimo filho. Ele teve uma complicação respiratória poucas horas após o nascimento e, por isso, foi encaminhado à UTI neonatal. Foram dias muito difíceis. Os pais que já passaram por isso sabem a angústia e sofrimento que permeia essa situação. Passado o susto inicial, fiquei simplesmente encantado com o serviço prestado pela Maternidade de Campinais. Ao contemplar o carinho que dedicavam aos pacientes, aquelas enfermeiras me pareciam uns anjos com a forma humana. E isso não se deve ao fato de ser paciente de plano de saúde, pois ali todos tinham exatamente o mesmo atendimento.

Ali na UTI neonatal, bem ao lado do nosso filho, Rafa, estava outro bebê, que elas apelidaram carinhosamente de Pedrão. Era um bebê que nasceu de 21 ou 22 semanas, pesava cerca de 600g e que lutava a duras penas para sobreviver. Nunca fiquei sabendo por que aquela criatura estava ali. Mas as circunstâncias indicavam que a mãe fez uma tentativa de aborto “mal” sucedida. Sim, porque o bebê nasceu com vida.

Com isso, sempre que se fala em aborto, principalmente quando a gestação está mais avançada, vem-me à memória o Pedrão. Não sei se ele resistiu e sobreviveu, mas sou testemunha de que lutou para viver. E era de encher os olhos – de alegria e de dor – ver o carinho com que aquelas moças, verdadeiras profissionais da saúde a serviço da vida, cuidavam dele, dia e noite...

Creio que já disse o que penso e que posso dizer sobre o caso que nos propõem. Mas ouso acrescentar algo mais. Muitos de nós, cristãos, fazemos muita gritaria em defesa da vida, principalmente em casos dessa natureza. E devemos mesmo lutar mesmo para que o respeito à vida, desde o nascimento até o seu fim natural, seja assegurado nas Leis, nas políticas públicas, nas ações dos governantes, na sociedade, na nossa família e em cada um de nós.

Não nos esqueçamos, porém, que é preciso acolher essas mulheres, que por motivos que não nos cabe julgar tenham cometido esse erro terrível. Com efeito, se elas um dia forem atrás desses algozes que trabalham para tirar a vida de um ser inocente, e se disserem arrependidas, talvez ouçam algo do tipo: “que nos importa, é lá convosco”. Mas um cristão autêntico não pode agir assim! É preciso acolher, é preciso compreender, é preciso perdoar. É preciso, enfim, um amor que seja cautério que cicatrize as feridas, muitas vezes profundas, deixadas pelos inimigos da vida.


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