quarta-feira, 29 de abril de 2020

Um homem que não vendeu a sua alma


Thomas More, o célebre humanista inglês, foi eternizado pela história como o “mártir da consciência”. Ele foi advogado, membro do Parlamento, Diplomata e chegou a ser Chanceler do Reino, o que equivalia ao de Juiz supremo, embora o cargo abrangesse também funções administrativas. E isso sem contar seu invejável dote literário, autor de inúmeros escritos, dentre os quais nos legou sua obra mais famosa: Utopia.
Apesar de todo esse sucesso, como sabemos, More teve um fim trágico. Instado por Henrique VIII a prestar um juramento que contrariava a sua consciência, negou-se veementemente a fazê-lo. Por isso, foi julgado e condenado à morte.
Um detalhe muito significativo da vida deste grande santo ocorreu nos seus últimos instantes de vida. Quando caminhava para ser decapitado, uma mulher “recriminou-o por ter dado uma sentença contra ela quando Chanceler; More respondeu-lhe sem a menor amargura: ‘Lembro-me bem do teu caso. Se tivesse que dar a sentença de novo, seria exatamente a mesma’” (A sós, com Deus. Escritos da Prisão).
Confesso ao leitor que, como juiz, sempre que leio essa passagem, um calafrio sobe pela espinha. Com efeito, no entardecer da nossa passagem por vida terrena, poderemos ter uma consciência tão tranquila como demonstrou More tê-la nesses momentos derradeiros?
O exemplo de Thomas More brilha na história como um homem que não se curvou às injustas exigências de um tirano!
A sua vida é um testemunho que nos alerta sobre a radical importância de todo ser humano seguir os ditames da sua consciência, ainda que isso implique perder a honra, cargos, a possibilidade de êxito profissional e até a própria vida por uma causa justa.
A história de Thomas More se repete, também aqui no nosso País e, de certo modo, na vida de cada um de nós. Muito provavelmente não correremos o risco de perder a vida ao tomar uma decisão que nos parece correta. No entanto, muitas vezes iremos nos deparar com situações em que agir de acordo com a ética implicará perder dinheiro, oportunidade de negócios, emprego ou até mesmo termos a nossa honra vilipendiada em campanhas difamatórias, tão comuns nesses tempos em que a notícia – e, com ela, a mentira, os chamados “fake News “ – corre numa velocidade frenética.
É muito triste notar como não se age de acordo com a consciência, mas segundo interesses. Já os Evangelhos nos trazem um relato muito claro disso: “27. Jesus e seus discípulos voltaram outra vez a Jerusalém. E andando Jesus pelo templo, acercaram-se dele os príncipes dos sacerdotes, os escribas e os anciãos, 28.e perguntaram-lhe: “Com que direito fazes isto? Quem te deu autoridade para fazer essas coisas?”. 29.Jesus respondeu-lhes: “Também eu vos farei uma pergunta; respondei-ma, e vos direi com que direito faço essas coisas. 30.O batismo de João vinha do céu ou dos homens? Respondei-me”. 31.E discorriam lá consigo: “Se dissermos: Do céu, ele dirá: Por que razão, pois, não crestes nele? 32.Se, ao contrário, dissermos: Dos homens, tememos o povo”. Com efeito, tinham medo do povo, porque todos julgavam ser João deveras um profeta. 33.Responde­ram a Jesus: “Não o sabemos” –. “E eu tampouco vos direi” – disse Jesus – “com que direito faço essas coisas” (Mc, 11, 27-33).
Esses personagens não agiram de acordo com a sua consciência. Provavelmente teriam uma resposta, mas agem com astúcia, medindo as consequências, sem compromisso com a verdade. Será que muitas das nossas escolhas e decisões não são tomadas com critérios semelhantes?
Aproveitemos esses duros momentos que vivemos para meditar se somos coerentes, em todas as situações, com os ditames da nossa consciência, aconteça o que acontecer. Afinal, de que vale a um homem ganhar um mundo inteiro se vier a perder a sua alma?

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