As atenções estão voltadas ao
Supremo Tribunal Federal, todos ansiosos por conhecer o resultado do “caso do
Mensalão”. E, conforme vão sendo conhecidos os resultados, com alguns réus já
condenados, tem-se visto efusivos elogios na mídia, o que até pouco tempo era
incomum em relação ao nosso Poder Judiciário. Nesse contexto, penso que seria
oportuna a seguinte indagação: a magistrada ou o magistrado, no ato de julgar,
deve estar atento à opinião pública?
Um primeiro aspecto importante da
questão é considerar que o juiz não é um ser neutro. A imparcialidade, que é um
requisito fundamental para bem julgar, é muito diferente de neutralidade. Antes
de ser uma magistrada ou um magistrado, são mulheres e homens, que nasceram num
certo momento histórico, que foram educados num determinado contexto familiar e
social, que tiveram uma específica formação humana e acadêmica, que têm uma
concepção filosófica e cultural, que professam (ou não) uma fé religiosa, enfim,
que possuem uma concepção de vida etc.
Além disso, há alguns caracteres
inatos que também influem na formação da sua personalidade. E tudo isso reflete
no ato de julgar. Não é possível que se faça uma abstração no momento de
proferir uma decisão. É evidente que no ato de decidir, a juíza ou o juiz deve
analisar os fatos com o máximo de imparcialidade que lhe for possível,
considerando os argumentos de ambas as partes, e aplicar a Lei do País que ela
ou ele jurou cumprir ao ser empossado no cargo. Mas são olhos humanos que se
debruçam sobre os fatos e analisam a norma a ser aplicada. E é inevitável que
ambos (Lei e fatos) passem pelo intelecto (e por que não dizer também pelo
coração) de um ser humano incumbido de proferir a decisão.
Nesse sentido, a juíza e o juiz,
como cidadãos que vivem em sociedade, também são sensíveis ao clamor popular
que brada contra a impunidade. Com profundo respeito aos juristas que pensam
diferente, acredito que os gritos de um povo que pede justiça está a exigir das
magistradas e dos magistrados do nosso País uma postura mais ativa na busca das
provas. Também, quando a situação assim o exigir, um maior rigor da aplicação
da pena. Qual o fundamento da cultura da pena mínima nas sentenças criminais?
Não seria certa desídia na fundamentação de uma reprimenda mais severa?
Mas há um ponto em que não se
haveria de ceder jamais, ainda que diante de clamores contra a impunidade.
Refiro-me a uma criteriosa e serena análise da prova. Nada justifica o risco de
se condenar um inocente. Nesse ponto, lembro-me sempre do exemplo dado em aula pelo
saudoso professor de Direito Processual Penal, Sérgio Pitombo: “Num recipiente
há cem biscoitos, mas apenas um deles contém um veneno mortal. Alguém em sã
consciência se atreveria provar?”.
Mas ainda não tocamos no cerne da
questão a que nos propomos. A indagação que formulamos foi no sentido de se a
magistrada ou o magistrado deve ouvir a opinião pública no ato de julgar um
caso específico. Ou seja, deve deixar que o clamor popular influa na condenação
ou na absolvição? Sempre que me faço essa indagação, vem-me à mente um dos
julgamentos mais famosos da história da humanidade. Refiro-me àquele em que um
juiz fraco, cuja consciência apontava para absolver o acusado, temendo a reação
de uma multidão que bradava “crucifica-O, crucifica-O”, colocou o desejo de se
manter no cargo ou de ser popular acima dos ditames da sua consciência. Com
isso, acabou por cometer uma terrível injustiça.
Num momento em que a TV Justiça
passa a transmitir ao vivo as decisões do nosso Supremo Tribunal Federal, bem
como que os julgamentos estão cada vez mais sob os holofotes da imprensa, penso
que as nossas juízas e os nossos juízes deveriam meditar mais profundamente
sobre o assunto. Com efeito, ainda que milhões de olhares aguardem pelo que
sairá da pena da nossa caneta, ou das teclas do nosso computador, naquele
sublime momento deveríamos ter em mente (e no coração) apenas a Lei e a nossa
consciência.
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