Outro dia presenciei
uma conversa de uma mãe com a filha, de apenas 2 anos, que merece ser contada.
A criança assistia a um filme num smartphone e, num dado momento, disse:
- Mãe, bugô!
“Onde ela já aprendeu
essa gíria?” pensou a mãe. Não conteve o riso e logo colocou o filme novamente.
A criança, porém, segurava o equipamento toda desajeitada e, de quando em
quando, tocava na tela, o que fazia o vídeo parar. Depois de três ou quatro
interrupções, disse a mãe já quase sem paciência:
- Filha, não “bugou”
nada. Foi você que pausou o vídeo.
- Não fui eu não, foi o
vento! – respondeu a filha imediatamente.
A resposta foi motivo
de uma grande gargalhada: a culpa é do vento! Mas, afora o aspecto engraçado da
fala de uma criança de tão tenra idade, é impressionante notar a dificuldade
que temos de assumir os nossos erros. E, por outro lado, como é fácil atribuir
aos outros a responsabilidade pelas nossas ações: “A culpa é minha, então eu a coloco
em quem eu quiser”, costuma-se dizer em tom jocoso.
Parece que essa
tendência de não reconhecer o erro, colocando-o nos outros, nas circunstâncias
ou na sociedade é algo universal e um tanto arraigado no ser humano. Daí não se
pode concluir, porém, que nada pode ser feito exceto reconhecer essa fraqueza. Bem ao contrário, a
luta para se crescer nas virtudes deve ser uma finalidade primordial a ser
buscada por todo educador sério e consciente da sua missão.
É, portanto, um grande
desafio formar os nossos filhos e alunos para assumir a responsabilidade pelos
seus atos. Isso implica uma análise reflexiva constante sobre as próprias
ações, escolhas e decisões, de modo a aferir o acerto delas, sabendo
reconhecer, quando necessário, que se agiu mal. Esse esforço constante é que
aprimora o ser humano para crescer cada vez mais, construindo um projeto de
vida sobre bases sólidas e seguras.
Saber reconhecer o erro
e assumir a responsabilidade pelas próprias ações e omissões não significa,
porém, que devamos propagar aos quatro ventos a nossa culpa. Apenas a título de
exemplo, uma pessoa que tenha praticado alguma conduta ilícita não está
obrigada – nem jurídica, nem moralmente – a comparecer a uma Delegacia de
Polícia e lavrar um boletim de ocorrência contra si própria. Mas será
necessário, sempre, assumir interiormente a responsabilidade por tais condutas
e, na medida do possível, reparar as consequências que elas possam ter causado.
Mas se essa dificuldade
em assumir a responsabilidade é de certo modo universal, na cultura
materialista e hedonista em que vivemos esse fenômeno assume contornos ainda
mais dramáticos. Com muita frequência se atribui ao médico a culpa por uma
doença ou uma dor que não conseguimos superar. Não raras vezes pensamos que são
o vizinho, a esposa ou os filhos os culpados pela nossa infelicidade. Também é
comum dizermos que o motorista do outro veículo é o responsável pelo nosso
atraso ou pelo nosso mau humor.
Nesse contexto, é ainda
mais desafiador ensinar e aprender a reconhecer o que cabe a nós mesmos nesses
acontecimentos indesejados. É necessário saber aceitar a doença, a dor ou o
sofrimento quando os nossos esforços para obter a cura ou para atenuar os seus
efeitos não surtem os efeitos que gostaríamos.
Há poucos dias recebi
um e-mail de uma pessoa a quem havia encomendado um serviço. Preservada a
identidade do remetente, merece ser transcrito: “Bom dia! Gostaria de me
desculpar, pois ontem entrei em contato com (...) para obter informações sobre o
seu pedido, mas, para minha surpresa, ela não havia recebido a documentação,
pois enviei para um e-mail errado. Já corrigi isso e enviei para o e-mail correto”.
Penso que se trata de uma pessoa muito responsável. Com essa atitude simples e
educada soube assumir o erro e tomou todas as providências que lhe cabiam para
atenuar as suas consequências. Que não falte aos nossos educadores essa
simplicidade e essa responsabilidade.
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