Muito se tem defendido e reverenciado
atualmente o que se convencionou chamar de humanização da medicina. Trata-se de
um conceito vago, mas que se tem entendido como uma postura mais acolhedora,
diligente e aberta ao diálogo a ser assumida pelos profissionais da saúde.
Com a descoberta de novas tecnologias,
lamentavelmente se instaurou uma tendência para se centrar a atenção no uso
desses recursos, de eficácia inquestionável, porém, com uma sensível perda na
qualidade da relação mantida entre o profissional e o paciente. A causa do
empobrecimento desse relacionamento não está, evidentemente, no avanço
tecnológico em si, mas na postura que assumiram alguns profissionais da saúde a
partir da sua disseminação.
Recentemente tive a grata surpresa e a enorme
satisfação de conhecer o Hospital do Câncer de Barretos. Dizíamos acima que não
é fácil estabelecer um conceito preciso do que se entente por humanização da
medicina. Ali, porém, podemos aprender na prática, com inúmeros exemplos
concretos, o que significa um atendimento humano e integral.
Algo de diferente já se nota no profissional
que controla a entrada no estacionamento. A solicitude com que ouve, a clareza
com que expõe as regras de uso do local, sempre com um sorriso a esbanjar
respeito e compreensão já advertem que verdadeiramente estamos a entrar num
local diferente.
Os profissionais da recepção, por sua vez,
sabem harmonizar a competência na coleta de dados e nas informações transmitidas
com um tom carregado de afeto e compreensão para com aquelas e aqueles a quem
atendem.
Quando observamos a postura dos médicos então a
surpresa positiva cede lugar a uma feliz perplexidade. Com efeito, como é
possível manter um ar sereno e alegre em meio a tanta dor e sofrimento
estampados nos rostos dos seus pacientes?
O serviço de enfermagem, ao menos no caso que
pude testemunhar, é verdadeiramente um “show à parte”! A jovem encarregada de
atender pacientes na UTI, com um carinho indescritível chamava de “meu Anjo” a
uma paciente recém chegada. Penso que talvez nem uma filha esbanjaria tanto
carinho.
Historicamente muitas instituições de saúde
foram fundadas e mantidas por entidades religiosas. Daí o nome “Santa Casa de
Misericórdia” ou outros semelhantes. As mulheres e os homens que se lançavam
nesses empreendimentos o faziam por uma forte convicção de fazer o bem ao
semelhante. Buscava-se curar a doença, na medida do possível, mas almejava-se
algo mais, que era precisamente o exercício da caridade com os necessitados e
sofredores.
Com o crescimento do papel do Estado, esse
chamou para si a responsabilidade pela assistência integral à saúde. Isso tem
um dado positivo. É que os cidadãos, especialmente os mais pobres, passam a
contar com a assistência à saúde como um direito social, não dependendo
exclusivamente da filantropia de algumas entidades. Porém, nessas instituições
públicas, que não tem o “algo mais” a motivar a sua atuação, não raras vezes se
olha para a doença e não para o doente.
Nesse tema, porém, convém não cairmos em
excessiva generalização, sob pena de incorrermos em graves injustiças. Isso
porque há estabelecimentos de saúde públicos em que se conta sim com essa
atenção especial e diferenciada ao paciente. Porém, em grande parte, isso é
fruto de iniciativas isoladas de determinadas pessoas, e não necessariamente consequência
de uma missão assumida pela instituição e que vem a contagiar e a orientar a
ação de todos os seus funcionários.
Esse fenômeno da “desumanização” das relações
não é exclusivo da medicina. Em inúmeros outros segmentos se fazem notar os
seus sinais. Aqui, porém, os seus resultados são mais perniciosos. É que já se
disse que o nível de desenvolvimento de uma sociedade se pode medir pela
maneira com que se tratam os mais frágeis: crianças, idosos e doentes. Nesse
cenário, o magnífico exemplo do Hospital do Câncer de Barretos soa como um
ponto luminoso, dentre inúmeros outros que se acendem aqui e ali, cujo
resultado, esperamos, seja a consolidação de uma medicina mais humana e uma
sociedade mais solidária.
Nenhum comentário:
Postar um comentário