Num dia desses, assisti a uma quadrilha numa festa
junina. Não sei o que se passa com o leitor, mas a mim muito me impressiona a
extrema simplicidade da dança, tanto que qualquer um pode dançar. Mas, ao mesmo
tempo, como é alegre! Aquele que comanda diz: “olha chuva!” e as pessoas, com
um “uh!”, mudam o rumo e seguem o caminho contrário... “É mentira!”, “ah!” e
tornam a mudar o rumo. É tão simples e alegre, que dá para nos perguntarmos
como que pode se manter tal tradição nos dias de hoje.
A dança da quadrilha é muito simples. Exatamente por
isso contrasta com o estilo de vida de muitas pessoas de nosso tempo, em que há
uma excessiva e desnecessária complicação. E esse complicar-se pode ocorrer de
vários modos. O mais freqüente deles é querer parecer ser o que não se é, ou
ainda ter um afã desordenado de que os outros façam de si próprio um conceito
favorável. Não há nada de errado em desejar ter uma boa reputação e de ser
estimado pelos demais. No entanto, algumas pessoas fazem disso uma obsessão e
se perdem em infindáveis considerações: “o que é que vão pensar de mim?”, “como
me devo portar naquela ocasião para que não pensem que...”. Enfim, vivem
preocupadas com o que os outros irão pensar e, ao contrário, não se ocupam de
verdade em ser melhores, mas apenas em parecer que o são.
O outro ingrediente da dança é a alegria. E como
contrasta com o azedume de muitas pessoas de nosso tempo! Se quisermos ter um
retrato disso, contemplemos como se comportam, por exemplo, muitos
profissionais dos meios de comunicação. Com freqüência encontrarmos artigos ou
comentários com um tom de críticas tão azedas que, ao final, ficamos com uma
sensação mais ou menos do tipo: “Puxa, acho que está tudo perdido mesmo!”. Porém,
há que se perguntar: o que se ganha com isso? Ou, antes ainda, por quê?
As causas são muito variadas e não permitem uma
análise superficial. Mas penso que tem uma forte influência a formação que está
sendo dada às nossas crianças. É necessário que os educadores, em especial os
pais e os professores, estejam aptos a dar uma formação completa aos filhos e
alunos. E quando se diz em completa, devemos nos atentar para os grandes
questionamentos que precisam ser respondidos: por que estou aqui? O que devo
fazer para encontrar a felicidade? Quem irá me ensinar esse caminho?
É que a tristeza e as complicações somente entram nas
pessoas se encontrarem um espaço livre para elas, espaço esse que poderia ser
preenchido por bons momentos em suas vidas, tal como a quadrilha é antecedida
por saborosos pés-de-moleque.
É preciso que se fomente na escola um ambiente sadio,
propenso a que cada um seja recebido e estimado como é, sem a necessidade de
parecer ser algo para ser recebido. Ao mesmo tempo, evidentemente, os
profissionais da educação (professores, coordenadores, diretores etc.) devem
estar aptos a fomentar nos alunos o crescimento nos valores humanos.
E algo semelhante, e talvez com maior intensidade, há
de ser feito em casa.
Conheço algumas famílias em que o programa noturno não se
limita à televisão. Reúnem-se após o jantar para contar coisas divertidas,
relatar fatos interessantes e agradáveis do dia de cada um, por vezes esboçam
um pequeno teatro. Enfim, vivem-se bons momentos juntos. Assim, formam-se
pessoas simples e alegres, ainda que também extremamente fortes para enfrentar
as agruras da vida.
A quem observa a quadrilha de fora parece algo inútil
e sem sentido: ora vão para um lado, ora para o outro, e gritam e riem feito
uns bobos... Mas quem a olha de dentro, não a vê como algo sem sentido. Ao contrário,
os atores entram por um lado, seguem, voltam, avançam, retrocedem, acertam,
erram e, ao final, saem por outro local. Trata-se de uma passagem rápida, é
verdade, não dura mais que uns instantes. Mas souberam entrar sorrindo e se
despedir felizes. E quem não gostaria que fosse assim a sua passagem por esta
vida: simples e alegre?
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