Um episódio que presenciei quando
cursava a Universidade ficou muito bem gravado na memória. A cena se passou no
chamado “bandejão” da faculdade. Uma aluna e um aluno conversavam
descontraidamente. Apesar da discrição que tentavam manter, pude notar que
falavam sobre o consumo de maconha nas festas do Centro Acadêmico. Num dado
momento, a moça indagou ao rapaz: “Mas, por quê?”. Ele, com um ar de malandro e
pouco afeto a questionamentos dessa natureza, respondeu: “Liberdade! Não liberdade
vigiada, mas liberdade sem adjetivos!”.
Eis um conceito muito difundido
de liberdade: ausência de freios ou, simplesmente, a possibilidade de fazer o
que quiser, quando quiser e como quiser. Mas será esse o verdadeiro conceito de
liberdade? Por outro lado, o que podem os pais fazer quando os filhos formam –
talvez influenciados pela cultura e pelo ambiente – um falso conceito de
liberdade?
Penso que é necessário que os
pais tenham, primeiro, uma convicção sólida sobre o assunto. Se ainda não a
tem, convém estudar, meditar e pedir conselho a quem o possa dar com critério e
retidão de intenção. É que, na educação, como em quase tudo na vida, ninguém dá
o que não tem. Logo, se queremos formar nossos filhos para o bom uso da
liberdade, convém que saibamos o que é e que apliquemos em nossas vidas o que
queremos transmitir-lhes.
Estou convencido de que a
liberdade não é fazer o que bem entende. É, antes disso, a faculdade que temos
de escolher em cada momento e circunstância das nossas vidas o que é melhor, o
que contribui para alcançar o verdadeiro bem para nós e para aqueles com quem
convivemos. Isso nos remete para outro aspecto, indissociável da liberdade, que
é a responsabilidade. Ou seja, precisamente porque somos livres é que somos
igualmente responsáveis pelos nossos atos e pelas nossas decisões.
Mas ainda que tenhamos uma noção
muito clara, não é fácil transmiti-la aos filhos. Com efeito, não é simples
formá-los para o bom uso da liberdade. Apesar disso, essa é uma grave obrigação
dos pais.
Talvez nos ajude a compreender
essa missão se compararmos o papel dos pais com o de um guia de alpinismo.
Ninguém ousará dizer que os conselhos desse, ou mesmo a corda que os ata à
rocha lhes tolhe a liberdade. São eles que os mantêm vivos. Algo semelhante
acontece com os pais na educação dos filhos: guiam, orientam, inspiram, mas
esses devem estar decididos a caminhar livremente com as próprias pernas.
Para que pai e mãe sejam
autênticos guias devem cuidar de alguns detalhes que farão a diferença. Um
deles é o ambiente familiar. Quanto ao aspecto material da casa, deve ser
acolhedor, limpo e agradável, ainda que, por vezes, seja muito simples e
modesto, como por certo seria o lar de Jesus em Nazaré. Mas mais importante
ainda é saber construir um ambiente de paz e serenidade. A casa deve ser um
lugar em que nos sentimos seguros e acolhidos. E cabe principalmente aos pais
edificar, com sacrifício e abnegação, esse reduto onde os filhos possam crescer
e trazer os amigos para desfrutar desse remanso.
Além disso, é fundamental a
sintonia entre os genitores. Imaginemos como seria se dois guias que nos
orientam na escalada se pusessem a discutir e a brigar diante de nós sobre o
melhor caminho e a maneira mais adequada de segui-los. Os guiados
ficariam atônitos e inseguros, quiçá duvidando da própria existência de uma via
que os levasse ao cume, ou se vale a pena buscá-lo.
De igual modo, pode haver
divergência de critérios entre o pai e a mãe. Mas eles devem buscar resolvê-los
a sós, de modo que aos filhos transmitam a orientação segura e serena de quem
ponderou muito sobre que caminhos trilhar nestas sendas fantásticas, ainda que
por vezes penosas, que nos conduzem à Vida.
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