A cena é muito conhecida, ao
menos dos homens. O jogo de futebol havia terminado há pouco, a roda de amigos
se formou diante de uma mesa com cervejas “estupidamente geladas”. A conversa
foi se amimando até que um deles mostra ao amigo uma fotografia no celular. Os
comentários denunciam de que se trata:
- Lindíssima!
Logo se armou uma roda ao
redor do smartphone. Todos se derretem em elogios... Um dos “atletas”, porém,
se mantém um pouco distante do grupo, degustando a sua cerveja, mas nada “à
vontade” com os rumos que tomou a conversa. Mas eis que um deles nota a o
distanciamento do amigo e resolve buscar a sua aproximação:
- Cara, dê uma olhada!
Um tanto a contragosto,
resolve observar o que tanto chamava a atenção dos amigos. E então lhe perguntam:
- O que acha?
Após um incômodo silêncio,
resolve dar o seu parecer:
- É muito bonita. Mas a mim
mais se parece uma torta de limão...
- Como assim? – Indaga o
dono do celular.
Todos olhares se voltam para
ele, ansiosos para que desvende o significado da expressão.
Diante do prolongado
silêncio, um dos amigos, tomado pela curiosidade, resolve perguntar:
- O que você quer dizer com
isso? Por que ela se parece com uma ... torta de limão?
- É simples – respondeu ele
agora um tanto confortável por ter deixado o papel de terceiro coadjuvante para
assumir o de ator principal. E prosseguiu: – A torta de limão é muito apetitosa
quando a experimentamos, porém, após brevíssimos momentos de prazer, deixa um
gosto amargo na boca e, se não a desfrutamos na companhia de pessoas que
verdadeiramente gostamos, fica apenas um vazio na alma...
Verdadeiramente não era
aquele um ambiente adequado para grandes reflexões. Por isso, as suas palavras,
por irem “contra a corrente”, deixou todos desconcertados. Mas o desassombro
dos amigos serviu de estímulo para prosseguir com suas ideias:
- E vou dizer mais. Quando
estamos com o gosto amargo na boca, temos a possibilidade de experimentar mais
um bocado. No entanto, dessa vez o amargor fica ainda pior e o prazer do segundo
prato é muito menor...
Um dos amigos, um tanto
desconcertado, resolve prosseguir nessas divagações:
- Mas se é assim, você que
se diz tão apaixonado por sua esposa, não acontece com ela o mesmo? Como você a
suporta há tanto tempo?
- Acontece que ela não é nem
nunca será uma torta de limão...
O zagueiro, empolgado com
aquela discussão nada futebolística, não conteve a curiosidade, e gritou do
canto da mesa:
- O que ela é, então?
- Não sei com que compará-la
– respondeu o nosso protagonista, sem perder a compostura.
Mas, após um breve silêncio,
prosseguiu:
- Um bom vinho. Acho que
isso é o que melhor a define em comparação com a torta de limão. O vinho, se é
bom, fica cada vez melhor com o passar dos anos. E, mesmo após aberto, a última
taça é sempre melhor que a primeira...
Os amigos estavam
verdadeiramente surpresos, como que descobrindo algo novo, de modo que a
novidade os agradava. Percebendo isso em seus olhos o nosso amigo prosseguiu
com suas considerações:
- Sabe, os anos de
casamento, se levados com interesse sincero em fazer o outro feliz, faz com que
se cresça no conhecimento mútuo. E isso faz com que fique cada vez mais
agradável o relacionamento, ainda que não faltem dificuldades e frustrações. Essas,
quando superadas por amor, fazem crescer a união entre o casal. E o mesmo
ocorre com as relações íntimas. Quanto mais nos conhecemos, mais é possível
fazer esse ato mais prazeroso para o outro.
A conversa terminou e foram
embora. O nosso protagonista precisou de carona com um dos amigos. Ao chegar à
casa, a esposa o convidou a entrar. Ao dizer que não jantariam, pois haviam
petiscado no bar ao lado do campo, a amável esposa propôs-lhes ao menos
experimentar a sobremesa:
- Preparei uma torta de
limão, com bastante raspas de cobertura, tal como você gosta, meu amor...
O amigo não escondeu uma
grande gargalhada.
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